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Dezembro de 2013 - Vol.18 - Nº 12
Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello

 

Dezembro de 2013 - Vol.18 - Nº 12

História da Psiquiatria

CENTRO DE ESTUDOS JOSÉ DE BARROS FALCÃO (PORTO ALEGRE-RS)

Walmor J. Piccinini

    A História pode ser examinada de muitas formas, documentos, depoimentos, notícias, arquivos e um sem número de fontes. Neste artigo, motivado pela publicação do Psiquiatra Rogério Rocha sobre o Centro de Estudos José de Barros Falcão (CEJBF), vamos tecer algumas considerações. A maioria dos personagens está viva e em plena atividade.

    Os primeiros psiquiatras do Rio Grande do sul, reconhecidos por um concurso público foram os Drs. Luis Pinto Ciula, Mário Martins, Cyro Martins e Victor de Brito Velho. O ano era 1938, mesmo ano em que foi fundada a Sociedade de Neurologia e Psiquiatria do Rio Grande do Sul.

    O Dr. Jacintho Godoy (http://www.polbr.med.br/ano04/wal0404.php) foi o primeiro presidente e sobre sua trajetória publicamos vários artigos na Psiquiatria Online Brasil. O mesmo foi feito sobre Mário Martins (http://www.polbr.med.br/ano12/wal0712.php) e Cyro Martins (http://www.polbr.med.br/ano08/wal0708.php).

    Formei-me em Medicina pela Faculdade de Medicina da UFRGS em 1965. Durante os anos de faculdade convivíamos com a Faculdade Católica de Medicina. Esta faculdade era particular e ligada à Santa Casa de Porto Alegre. Como a Famed-UFRGS iria se transferir para o Hospital de Clínicas, a Santa Casa que sempre contara com os alunos e o ensino nas suas funções, se organizou para ter a sua própria faculdade. Lembro que, ainda em 1960, o então reitor da UFRGS, o Professor Eliseu Paglioli nos levou numa visita em que ele era o cicerone, para conhecer o Hospital de Clínicas. No seu discurso dizia, os estágios de clínica de vocês serão aqui neste novo hospital. Quatorze anos depois o hospital foi inaugurado e nesta altura já éramos médicos e com residência completada há vários anos. Na convivência das duas faculdades ocorria uma saudável disputa e os embates futebolísticos eram famosos e muito disputados. Do time da católica alguns se tornaram psiquiatras, O Dr. Joacy Casagrande Paulo, o Paulo Marocco são os que lembro. O Marocco tinha sido atendente da Pinel junto comigo e foi com certa surpresa que o vi seguindo outros caminhos, ficou muito ligado ao seu professor de psiquiatria o Dr. José de Barros Falcão. Numa época em que a psicanálise predominava no meio acadêmico, o Dr. Falcão tinha uma linha independente. Era considerado um homem culto e muito católico.

Afável, aparecia nas atividades com seus filhos. Discretamente foi reunindo em torno da sua liderança uma série de desgarrados da psicanálise. Sob o estímulo de seus alunos fundou um centro de estudos psiquiátricos que hoje leva seu nome. O primeiro grupo de estudos começou em 1968. Não custa lembrar que o “Curso do David” iniciou em 1954 e teve sua primeira turma de psiquiatras em 1957. O outro curso foi o da Pinel que iniciou em 1961 sob a direção de Marcelo Blaya.

    Segundo Rogério Rocha: “No momento histórico brasileiro de ditadura militar, obscuro e repressor, e de encontro à psicanálise hegemônica local, o professor Falcão inaugura um curso com formação teórico e prática não dogmática, permitindo a influência de diferentes correntes, abordando teóricos fundadores das diversas abordagens psicodinâmicas e, estimulando o estudo de escolas filosóficas e humanistas ampliando a visão dos novos psiquiatras em formação”.

    Conforme relato do Dr. Carlos Alberto Crespo de Souza, o CEBF já está na 34ª. turma de formação em psiquiatria. Seus alunos se espalharam pelo Brasil. Muitos, talvez, nem tenham ideia das dificuldades dos primeiros tempos.  Havia a ditadura política e de certa forma uma ditadura intelectual do grupo psicanalítico. Uma das explicações possíveis era de que se tratava de um grupo pequeno, lutando pela própria afirmação e com dificuldades de enfrentar críticas. Do grupo inicial de quatro didata, Celestino Prunes, Cyro Martins, José Lemmertz e Mário Martins se estruturou o novo Centro de Estudos Psicanalíticos que hoje é a Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre. No final de 1965, um dos quatro fundadores resolveu se afastar do grupo psicanalítico e saiu atirando. Em 1966 o Dr. José Lemmertz editou um livro com recursos próprios, “Psicanálise e Psicoterapia”. O livro em si é passível de críticas e parece um tipo de “revelação” tardia do autor. Na época, entretanto, para alguns seria um golpe mortal na psicanálise como era praticada no meio porto-alegrense. A edição era pequena, logo se esgotou. Passou a ser copiada e distribuída como se fosse um daqueles “samizdat” livros proibidos da antiga união soviética. Passados 50 anos as relações da psicanálise e a psiquiatria se modificaram muito e as críticas do livro, hoje em dia, parecem muito palatáveis considerando as críticas muito mais extremadas que surgiram ao longo destes 50 anos.

    No prefácio o autor começa assim: “A insatisfação a respeito dos aspectos teóricos, técnicos e resultados terapêuticos da psicanálise e um sentimento de responsabilidade intelectual para com as novas gerações médicas, especialmente para com os psiquiatras e psicologistas- eis as causas que me levaram a publicar este trabalho. Explico-me. Quanto ao primeiro motivo: Vários anos de estudos e observações conduziam-me à investigação de novos rumos que abrissem melhores perspectivas. Quanto ao segundo: Acontece que fui um dos fundadores de uma /associação Psicanalítica, e, que, através da minha atuação, muito contribuí para que se estabelecesse o “dogma” de que a formação psiquiátrica deveria ser fundamentalmente psicanalítica. Criou-se o mito de que as perturbações mentais somente poderiam ser adequadamente tratadas pela psicanálise, e essa falsa crença tem se difundido em nosso meio quase sem nenhuma oposição. Repetem-se constantemente as mesmas discutíveis hipóteses teóricas, que são apresentadas como verdades científicas irrefutáveis e que terminam sendo aceitas como fatos indiscutíveis, mesmo contradizendo as normas mais elementares do bom senso. Isto se verifica não somente com as teorias freudianas como ainda mais especificamente, com a chamada Escola de Melanie Klein”.

    Hoje em dia proliferam livros, artigos e reportagens contra a psicanálise, mas em 1966, um dos quatro didata fundadores da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre traduzir em livro sua decepção com a psicanálise causou um comoção. O Dr. José Lemmertz afastou-se da Sociedade Psicanalítica e foi recebido pelo Dr. José de Barros Falcão. Consta que ele teria sido o primeiro presidente do incipiente Centro de Estudos Psiquiátricos nas palavras de Crespo de Souza.

As afirmações de Lemmertz causaram alguns tremores, alguns dos seus analisandos o acompanharam, outros entraram em reanálise e a sociedade psicanalítica seguiu seu curso.

Para o novo Centro de Estudos a vida não foi fácil, rejeitados pelo grupo dominante de psicanalistas tiveram ainda que enfrentar a rejeição e hostilidade do professor titular da Faculdade de Medicina e finalmente, a rejeição e afastamento determinado pela Reitora da Universidade sucessora da antiga Faculdade Católica. Com o convenio com o Sanatório São José, mais tradicional hospital psiquiátrico particular de Porto Alegre, há grandes esperanças de consolidação definitiva do CBJF. Abrem-se editais para a 35ª. Turma de Alunos de psiquiatria. Segue uma presença forte como Federada da ABP, um grupo afinado de professores abnegados, tem tudo para continuar uma grande entidade formadora de especialistas em psiquiatria,

   Sobre a vida do Dr. José de Barros Falcão os dados são esparsos, sabe-se que nasceu em Porto Alegre em 15 de março de 1914. Formou-se em medicina em 1936 com 22 anos de idade. Trabalhou como clínico em várias cidades do interior e no período de 1938 a 1941 foi funcionário publico em Pelotas-RS. Autodidata, tornou-se alienista do Hospital São Pedro em Porto Alegre a partir de 1949. Muito estimado pelos seus alunos, foi estimulado a iniciar um grupo de estudos, depois Centro de Estudos e, finalmente o CEBF.

Do site do Centro de Estudos José de Barros Falcão (CEJBF) coletamos estas informações institucionais.

Description: http://www.clinicasaojose.com.br/img/jbf.jpg

 

"Centro de Estudos José de Barros Falcão, entidade sem fins lucrativos, dedicada ao ensino, pesquisa e assistência nas áreas de Psiquiatria e Psicologia, desde 1968 formou psiquiatras em parceria com a Faculdade Católica de Medicina de Porto Alegre, posteriormente denominada Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre, hoje Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre. Em 2009, após 41 anos de vínculo oferecendo à população serviço qualificado, desfaz-se o convênio entre o CEJBF e a atual UFCSPA. Seguido de breve passagem da Secretaria de Ensino pelo Hospital Psiquiátrico São Pedro. Em 2011, o CEJBF passa à sua sede própria, localizada à Rua Uruguai, Centro de Porto Alegre, firmando novas parcerias”. Em 2010, o CEJBF formou a última turma de Psiquiatria em conjunto com a UFCSPA, totalizando 30 Cursos de Psiquiatria em 42 anos, além de quatro de Psicoterapias Psicodinâmicas, outras quatro de Psicodrama e mais quatro de Psiquiatria Forense e Saúde Mental. Em 2012 é firmada uma importante parceria Com a Clínica São José, que passa a abrigar a Secretaria de Ensino, a ser local de estágio do primeiro ano do Curso de Especialização em Psiquiatria e a colaborar com os eventos científicos deste Centro de Estudos.

Diretoria por ocasião do Convênio com o Sanatório São José

Presidente: Dr. Theobaldo Oliveira Thomaz
Vice-Presidente: Dr. Miguel Abib Adad
Diretor de Ensino: Dr. Mauro Barbosa Terra
Diretor Administrativo: Dr. Euclides Gomes
Diretor Científico: Dr. Flavio Strohschoen Pinto
Diretor Financeiro: Dr. Sérgio Rodrigues
Diretor de Marketing: Dr. Altair Marcelo Tavares
Presidente do Conselho Deliberativo: Dr. Mauro Barbosa Terra

Diretoria Atual:

Presidente: Dr. Sérgio Rodrigues

Vice-Presidente: Theobaldo Oliveira Thomaz

Diretor Administrativo: Bruno Mendonça Costa

Diretor de Ensino: Carlos Alberto Sampaio Martins de Barros

Diretor científico: Luiz Antônio Saint Pastous Godoy

Diretor de Comunicação: Giovani Zwetsch Gheno

 


Um fato marcante na história do atual CEJBF foi sua reativação em 1981 como Instituto Médico Psiquiátrico. Na ocasião foi eleito presidente o Dr. José Jayme Lemmertz, seu vice foi o Dr. Bruno Mendonça Costa, o Diretor Técnico o Dr. Jorge Eduardo Fernandes Velho. O 1º. Secretário Volnei Luis Saccomori, o segundo secretário foi o Dr. Flávio Strohschoen Pinto e, finalmente o Tesoureiro Dr. Herberto Edson Maia.

O professor José de Barros Falcão faleceu em seis de maio de 1989. Em sua homenagem, em 30 de novembro de 1989 o então Instituto Médico Psiquiátrico passa a ser denominado Centro de Estudos José de Barros Falcão e sua primeira diretoria foi a que segue: Presidente Miguel Abib Adad- Vice, Arno Victor Palma. Secretário Geral e Executivo, Volnei Luis Saccomori. Tesoureiro, José Geraldo Vernet Taborda, Diretor do Curso de Especialização: Carlos A. Crespo de Souza. Diretor didático e Pedagógico: Herberto Maia. Conselho Deliberativo: Montserrat Martins, Flávio s. Pinto e João Machado. Conselho Fiscal: Raul Isehard, Paulo Marocco e Jorge Eduardo Velho.

São inúmeros os colaboradores do CEJBF, para efeitos práticos vamos lembrar os ex-presidentes; Drs. Bruno Mendonça Costa, Flávio S. Pinto, Miguel Abib Adad, Sérgio Rodrigues, Sonia Elisabete Kunzler, Theobaldo Oliveira Thomaz e Volnei Luiz Saccomori (in memória). Nesta lista deve constar o Dr. Luiz Ilafont Coronel que apoiou o CEJBF quando diretor do Hospital Psiquiátrico são Pedro e o Professor João Romildo Bueno que estendeu o manto protetor da UFRJ para a formação de professores.

Bibliografia

Centro de Estudos José de Barros Falcão. O ensino da psiquiatria inspirada na trajetória do seu precursor. De Rogério Rocha.

Lemmertz, José Jayme. Psicanálise e Psicoterapia. Edição do autor. Porto Alegre, 1966.


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