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Volume 22 - Novembro de 2017
Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello

 

Maio de 2015 - Vol.20 - Nº 5

História da Psiquiatria

ASSOCIATIVISMO MÉDICO E A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA

Walmor J.Piccinini

     Quando conclui o Curso Médico na Faculdade de Medicina de Porto Alegre (UFRGS), em 1965 me deparei com algumas exigências para poder praticar minha profissão.  A primeira era ser inscrito no Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul. Órgão que fazia parte de uma estrutura maior, o conselho Federal de medicina.  A inscrição era obrigatória, sem ela não se pode exercer a profissão.  A segunda não era obrigatória, mas  aconselhável de  ser associado da Associação Médica do Rio Grande do Sul que fazia parte de uma estrutura maior a Associação Médica Brasileira.A terceira que na época não parecia ter importância era a de ser  sindicalizado,  não se considerava a existência do Sindicato Médico.

    Estas eram as opções do jovem médico. Tendo entrado para uma residência médica, o trabalho intenso e absorvente não deixava muito tempo para tecer considerações sobre este assunto. O treinamento visava a clínica particular, os pobres eram atendidos gratuitamente e com objetivo de treinamento.  Como não se pensava em ser empregado não se sentia a necessidade do Sindicato Médico que zelava pelos direitos trabalhistas dos médicos.  As Associações Médicas serviam para congregar e promover a  atualização científica. Com o tempo passaram a defender melhor remuneração dos médicos em seus contratos com o governo. O Conselho servia, além de credenciar os profissionais para poder ingressar no mercado de trabalho,  zelar pela defesa dos princípios éticos da atividade médica.

    Segundo M.E.Labre(1993): A configuração do associativismo profissional se deu a partir dos estados, passando a constituir, cada uma dessas três formas, uma entidade nacional. No caso dos médicos temos o Conselho Federal de Medicina ou Ordem dos Médicos (1945), a Associação Médica Brasileira (1952) e a Federação Nacional dos (Sindicatos) Médicos (1975). Até hoje essas representações nacionais (assim como as das outras profissões de saúde) se mantêm separadas. De fato, nunca chegaram a se unir em uma organização centralizada com representação monopólica dos interesses de cada categoria nem, muito menos, em uma confederação das associações de todos os profissionais ou, ainda, em uma representação nacional de todos os trabalhadores de saúde. Esse traço - representação dividida ou tricotômica - tem efeitos deletérios sobre a coesão interna da categoria e a mediação de demandas dos profissionais junto ao governo e, o mais importante para nós, em relação à vocalização pública e legítima dos associados (e não apenas dos dirigentes de turno) em apoio a políticas que visem favorecer a população, como é o caso do SUS. Além disso, no plano interno, essa divisão cria problemas esdrúxulos no que se refere às competências de cada órgão: por exemplo, enquanto o Conselho de Medicina processa médicos indiciados por erros de responsabilidade profissional, o Sindicato os defende por intermédio de seu setor jurídico!

    Durante meu Curso de medicina tive que trabalhar e um desses trabalhos foi obtido mediante concurso público e através dele passei a ser Atendente do IAPB (Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários). Havia uma liberalidade quanto ao horário que poderia ser compensado de várias formas. O trabalho não interferiu com meu desempenho acadêmico e vice-versa. Como consequência da minha atuação, quinze dias depois de formado fui chamado na Delegacia do IAPB e recebi das mãos do delegado  minha credencial como médico. Cumpre relatar que não conhecia o delegado e não conhecia nenhum político que pudesse ter intercedido em meu favor. Cito este fato para registrar que na época o serviço público não era disputado pelos médicos, os candidatos eram recebidos de braços abertos.

     Desde os primórdios da atuação médica no Brasil existiram associações ou sociedades médicas. As principais instituições médicas criadas entre 1808 e 1850 foram as seguintes: Academia Médico-Cirúrgica (1813, Salvador; 1815, Rio de Janeiro), Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro (1829), Faculdade de Medicina (1832, Salvador e Rio de Janeiro), Instituto Homeopático (1843, Rio de Janeiro), Instituto Vacínico (1843, Rio de Janeiro) e Junta Central de Higiene Pública (1850, Rio de Janeiro). O Imperador Pedro II ambicionava desenvolver a Ciência no país. Uma das formas foram as Academias e desta ideia surgiu a Academia Imperial de Medicina. Nome pomposo para reunir meia dúzia de médicos, na maioria estrangeiros.

        Sociedades Médicas existiram desde o Império, mas a atuação pública se tornou mais visível a partir de 1923 com a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública. No mesmo ano foram criadas as Caixas de Aposentadorias e Pensões que nos anos trinta vieram a constituir os Institutos de Aposentadorias e Pensões. Repetindo afirmação anterior, o setor de saúde brasileiro era formado por três setores: a medicina pública, a medicina previdenciária e a medicina liberal privada. Esta divisão se repetia nos Municípios, nos Estados e no Governo Federal. Na década de 80 começou a ser discutida a integração dessas  as ações dos municípios, estados e governo federal e foi desenvolvido o SUS, Sistema Único de Saúde. A ideia era evitar a superposição de gastos, racionalizar as ações preventivas e curativas e descentralizar as decisões.  O problema é que o governo centralizou a arrecadação e passou a deixar para os municípios a maioria dos encargos. Essa viagem do dinheiro dos municípios e estados para Brasília facilitou desvios e o retorno se transformou em poder político. Já nos anos 90, um ação proposta nos Estados Unidos da América é adotada sem muitos questionamentos em nosso meio. Surge o “managed care”, a aplicação do gasto per cápita e o favorecimento de grupos políticos.

Ainda M.Labre observa: Como lutar por um sistema único, universal e equitativo se as elites do operariado, dos empregados e do funcionalismo reivindicam e conseguem serviços assistenciais de qualidade providos pelo setor privado por intermédio de planos de saúde ou de sistemas próprios, fechados?

    Nosso objetivo não é discutir o SUS e sua problemática embora interesse a todos os médicos. Vou continuar no Associativismo médico. Mesmo porque, se formos ampliar o escopo do trabalho teríamos que examinar  a atuação da ABIFARMA (1948); da Federação Brasileira de Associações de Hospitais (1966) e do Sindicato dos Donos de Hospitais – Sindhosp (1938).

    Em 1966 foi fundada a Associação Brasileira de Psiquiatria em ação patrocinada pela Associação Médica Brasileira ( José Flores Soares e Manoel Antonio Albuquerque) e apoiada pelos Catedráticos (José Leme Lopes, José Lucena, Antonio Carlos Pacheco e Silva). A Ata de Fundação pode ser encontrada em http://www.polbr.med.br/ano02/wal1002.php

    Numa interpretação sujeita a várias interpretações diria que os psiquiatras ligados ao Ensino triunfaram sobre os psiquiatras ligados a assistência psiquiátrica hospitalar. Na época, os donos de hospitais eram poderosos, dominavam economicamente a profissão e tinham assento nas decisões governamentais.

Num artigo de 2003 (www.polbr.med.br/ano03/wal1003.php) registro a fundação da World Psychiatric Association: O ano de 1961 foi marcado pela fundação da Associação Mundial de Psiquiatria no Congresso Mundial de Montreal. Até então existia um grupode pessoas que se reuniam em torno de congressos Mundias: O primeiro aconteceu em Paris em 1950, o segundo em Zurich em 1957 e o terceiro em Montreal em 1961. Nesse encontro, representantes de 40 países decidiram fundar a WPA. O Brasil foi representado pelo Professor Antônio Carlos Pacheco e Silva, da USP-São Paulo. O primeiro presidente foi Dom Ewin Cameron, o vice foi J. Braceland e o Secretario Geral foi Henri Ey.

Nesse ano, no Brasil, registramos a fundação de duas entidades:

A primeira foi o “Centro de Estudos Paulo Elejalde” congregando os psiquiatras do Centro Psiquiátrico Nacional que pertencia ao Serviço Nacional de doenças mentais. Humberto Alexandre foi escolhido como presidente, o vice foi Amin Curi, os secretários foram Elso Arruda e a Doutora Nise Magalhães da Silveira.

A segunda foi a Associação Psiquiátrica do Rio de Janeiro. Contava com 86 psiquiatras e foi fundada em 7 de agosto de 1961. Sua primeira diretoria estava assim constituída: Presidente: Dr. Pedro Pernambuco Filho.

(No ano de 1961 a psiquiatria brasileira dispunha das revistas: Neurobiologia, Arquivos de Neuro-Psiquiatria e Jornal Brasileiro de Psiquiatria. A esse grupo, em 1961, foram adicionadas as revistas, Arquivos da Clínica Pinel e a Revista Psiquiatria do Rio Grande do Sul. Essa última pertencia ao Centro de Estudos Luis Guedes, ligado a Universidade Federal do RGS. O Centro de Estudos Luis Guedes foi fundado em 1959 junto com a primeira turma do Curso de Formação em Psiquiatria Dinâmica. No ano seguinte foi realizada a Primeira Jornada SulRioGrandense de Psiquiatria Dinâmica na cidade de Gramado-RS. O Volume I, No 1,2,3. publicou os trabalhos apresentados naquela Jornada. O vol.I No 4 publicou trabalhos de analistas gaúchos comemorando o reconhecimento como “study group” do Centro de Estudos Psicanalíticos de Porto Alegre pela IPA, no seu XXII Congresso realizado em Edimburgo (1961). O patrocinador desse reconhecimento foi a Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro.)

Vice: Professor José Leme Lopes.

Sec. Geral: Dr. William Asmar.

Primeiro Secretário: Paulo Marchos.

Tesoureiro: Dr. Almir Almeida Guimarães.

Segundo Tesoureiro: Doutor Rawlinson Prestes Lemos.

    Segundo Labre:  Para fins de exposição podemos distinguir cinco tipos ou segmentos:

(a) prestadores lucrativos;

b) prestadores filantrópicos;

(c) empresariado autônomo;

d) sistemas fechados;

(e) seguradoras.

(a) Prestadores lucrativos.

(Continua)


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