Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Janeiro de 2015 - Vol.20 - Nº 1 História da Psiquiatria A CRISE NO MODELO DE ASSISTÊNCIA MÉDICA NO BRASIL Walmor J.Piccinini Nas minhas férias, com mais tempo de assistir TV tive o dissabor de assistir sucessivas reportagens sobre desvios de conduta de médicos e empresários ligados à medicina. Não bastasse a ação do governo afrontando as instituições médicas e seus associados, somos obrigados a assistir profissionais da medicina delinquentes dando motivos para os inimigos da profissão. Aqui cabe um registro de um velho professor meu, quando comentava certas atitudes isoladas de maus médicos. Ele me dizia; “não existe classe médica, existe a profissão de médico, exercida por indivíduos de todas as classes inclusive alguns desclassificados”. Para coibir estes desclassificados existiam os CRM e o CFM, o tempo foi me mostrando que estes órgãos cumprem suas obrigações rotineiramente, nunca se aparelharam ou nunca tiveram respaldo legal para agir ativamente. Geralmente sua ação ocorre somente em caso de ser provocada. Não é meu objetivo questionar nossos órgãos reguladores, deixo isto para outros estudiosos especialistas no assunto. Neste pequeno trabalho vou tentar entender o que se passa nas relações do médico com seu paciente e com a sociedade em geral. Para definir alguns pontos importantes vou me basear no Guia da Relação médico-paciente de 2001 do CREMESP que pode ser encontrado em; http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Publicacoes&acao=detalhes&cod_publicacao=4 O Guia tem dezesseis páginas muito instrutivas tanto para médicos como para os pacientes. Vou me limitar a alguns pontos que retirei do mesmo. O Juramento do Médico e alguns aspectos da relação médico-paciente: Juramento do Médico (Declaração de Genebra*) No
momento de me tornar um profissional médico: Prometo solenemente dedicar a
minha vida a serviço da Humanidade. Darei aos meus Mestres o respeito e o
reconhecimento que lhes são devidos. Exercerei a minha arte com consciência e
dignidade. A saúde do meu paciente será minha primeira preocupação. Mesmo após
a morte do paciente, respeitarei os segredos que a mim foram confiados.
Manterei, por todos os meios ao meu alcance, a honra da profissão médica. Os
meus colegas médicos serão meus irmãos. Não deixarei
de exercer meu dever de tratar o paciente em função de idade, doença,
deficiência, crença religiosa, origem étnica, sexo, nacionalidade, filiação
político-partidária, raça, orientação sexual, condições sociais ou econômicas.
Terei respeito absoluto pela vida humana e jamais farei uso dos meus
conhecimentos médicos contra as leis da Humanidade. Faço essas promessas
solenemente, livremente e sob a minha honra. * Adotada em 1948 e revista em
1994 pela Assembleia Geral da Associação Médica Mundial. (Guia Cremesp) As expectativas em relação ao médico e a medicina são cada vez maiores, segundo alguns pensadores, quanto mais se ampliam os conhecimentos médicos, maior a insatisfação da população em geral com os mesmos. Por maiores que sejam os progressos da medicina ela não consegue dar a imortalidade e a felicidade geral para todos e nem vai conseguir. Quando enfrentamos um caso de difícil solução ou mesmo de solução impossível, sempre existe a queixa que poderíamos fazer mais. Culpa nossa por nos assumirmos como membros do Olimpo, da Imprensa que acentua os fracassos em detrimentos das conquistas ou da idealização mágica do médico-feiticeiro que tem uma ligação direta com deus. “Existe hoje, portanto, uma
enorme expectativa de que a Medicina possa resolver tudo. Mesmo que as
conquistas científicas sejam velozes e promissoras, ainda faltam respostas para
muitas situações”. “Se, por um lado, dominamos
exames precisos e procedimentos complexos, realizamos transplantes e deciframos
genes, por outro temos, por vezes, deixado de lado aspectos elementares da
relação humana. Já a ausência de políticas públicas eficazes, a deterioração
dos serviços de saúde e das relações de trabalho, as deficiências do ensino
médico, dentre outros fatores, geram problemas que poderiam ser evitados”. “1. O que melhora a relação
médico-paciente Por parte do médico: - Prestar um atendimento
humanizado, marcado pelo bom relacionamento pessoal e pela dedicação de tempo e
atenção necessários. - Saber ouvir o paciente, esclarecendo dúvidas e
compreendendo suas expectativas, com registro adequado de todas as informações
no prontuário. - Explicar detalhadamente, de forma simples e objetiva, o
diagnóstico e o tratamento para que o paciente entenda claramente a doença, os
benefícios do tratamento e também as possíveis complicações e prognósticos. -
Após o devido esclarecimento, deixar que o paciente escolha o tratamento sempre
que existir mais de uma alternativa. Ao prescrever medicamentos, dar a opção do
genérico, sempre que possível. - Atualizarem-se constantemente por meio de
participação em congressos, estudo de publicações especializadas, cursos,
reuniões clínicas, fóruns de discussão na internet etc. - Ter consciência dos
limites da Medicina e falar a verdade para o paciente diante da inexistência ou
pouca eficácia de um tratamento. - Estar disponível nas situações de urgência,
sabendo que essa disponibilidade requer administração flexível das atividades.
- Indicar o paciente a outro médico sempre que o tratamento exigir
conhecimentos que não sejam de sua especialidade ou capacidade, ou quando
ocorrer problemas que comprometam a relação médico-paciente. - Reforçar a luta
das entidades representativas da classe médica (Conselhos, Sindicatos e
Associações) prestando informações sobre condições precárias de trabalho e de
remuneração e participando dos movimentos e ações coletivas. Por parte do
paciente: - Lembrar-se de que, como
qualquer outro ser humano, o médico tem virtudes e defeitos, observando que o
trabalho médico é uma atividade naturalmente desgastante. - Considerar cada
médico principalmente por suas qualidades, lembrando que em todas as áreas
existem bons e maus profissionais. Ter claro que o julgamento de toda a classe
médica por conta de um mau médico não faz sentido. - Não exigir o impossível do
médico, que só pode oferecer o que a ciência e a Medicina desenvolveram. Da
mesma forma, jamais culpar o médico pela doença. - Respeitar a autonomia
profissional e os limites de atuação do médico. Ele não pode ser
responsabilizado, por exemplo, por todas as falhas dos serviços de saúde,
muitas vezes sucateado por seus gestores. Nesse sentido, é direito do paciente
denunciar e reivindicar para que o Estado cumpra sua obrigação. Existem órgãos
competentes para isso, como os Conselhos de Saúde e o Ministério Público, além
da direção dos próprios serviços. - Não exigir dos médicos exames e
medicamentos desnecessários, lembrando que o sucesso do tratamento está muito
mais na relação de confiança que se pode estabelecer com o médico. - Seguir as
prescrições médicas (recomendações, dosagens, horários etc.) e evitar a
automedicação. - Ter consciência dos seus direitos (tratados a seguir). 2. Os direitos do paciente Abandono Após iniciado o tratamento o médico não pode abandonar
o paciente, a não ser que tenham ocorrido fatos que comprometam a relação
médico-paciente e o desempenho profissional e desde que assegurada à
continuidade na assistência prestada. Acompanhante O paciente tem o direito de ser acompanhado por pessoa
por ele indicada, se assim desejar, nas consultas, internações, exames
pré-natais e no momento do parto; receber do profissional adequado, presente no
local, auxílio imediato e oportuno para a melhoria do conforto e bem-estar. Alta O médico pode negar-se a conceder alta a paciente sob
seus cuidados quando considerar que isso pode acarretar-lhe risco
de vida. Se o paciente ou familiar decidirem pela alta sem parecer favorável do
médico, devem responsabilizar-se por escrito. “Nesse caso, o médico tem o
direito de passar o caso para outro profissional indicado ou aceito pelo
paciente ou família”. Anestesia
Receber anestesia em todas as
situações indicadas. Recusar tratamentos dolorosos ou extraordinários para
tentar prolongar a vida. Atendimento digno O paciente tem direito a um atendimento digno,
atencioso e respeitoso, sendo identificado e tratado pelo nome ou sobrenome. O
paciente não pode ser identificado ou tratado por números, códigos, ou de modo
genérico, desrespeitoso ou preconceituoso. Autonomia Consentir ou recusar, de forma livre, voluntária e
esclarecida, com adequada informação, procedimentos diagnósticos ou
terapêuticos a serem nele realizados. Criança A criança, ao ser internada, terá em seu prontuário a
relação das pessoas que poderão acompanhá-la integralmente durante o período de
internação. Exames. É vedada a realização de exames compulsórios, sem
autorização do paciente, como condição necessária para internação hospitalar,
exames pré-admissionais ou periódicos e ainda em
estabelecimentos prisionais e de ensino. Gravação O paciente tem o direito de gravar a consulta, caso
tenha dificuldade em assimilar as informações necessárias para seguir
determinado tratamento. Identificação Poder identificar as pessoas responsáveis direta e
indiretamente por sua assistência, por meio de crachás visíveis, legíveis e que
contenham o nome completo, a função e o cargo do profissional, assim como o
nome da instituição. Informação O paciente deve receber informações claras, objetivas
e compreensíveis sobre hipóteses diagnósticas; diagnósticos realizados; exames
solicitados; ações terapêuticas, riscos, benefícios e inconvenientes das
medidas propostas e duração prevista do tratamento. No caso de procedimentos
diagnósticos e terapêuticos invasivos, deve ser informado sobre a necessidade
ou não de anestesia; o tipo de anestesia a ser aplicada; o instrumental a ser
utilizado; as partes do corpo afetadas; os efeitos colaterais; os riscos e as
consequências indesejáveis e a duração esperada do procedimento; os exames e as
condutas a que será submetido; a finalidade dos materiais coletados para exame;
as alternativas de diagnósticos e terapêuticas existentes,
no serviço onde está sendo realizado o atendimento ou em outros serviços, além
do que mais julgar necessário. Medicação Ter anotado no prontuário, principalmente se estiver
inconsciente durante o atendimento, todas as medicações, com dosagens
utilizadas; e registro da quantidade de sangue recebida e dos dados que
permitam identificar a sua origem, sorologias efetuadas e prazo de validade. Morte O paciente tem o direito de optar pelo local de morte
(conforme Lei Estadual válida para os hospitais do Estado de São Paulo). Pesquisa Ser prévia e expressamente informado, quando o tratamento
proposto for experimental ou fizer parte de pesquisa, que deve seguir
rigorosamente as normas regulamentadoras de experimentos com seres humanos no
país e ser aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do hospital ou
instituição. Prontuário Ter acesso, a qualquer momento, ao seu prontuário
médico, recebendo por escrito o diagnóstico e o tratamento indicado, com a
identificação do nome do profissional e o número de registro no órgão de
regulamentação e controle da profissão. Receituário Receber as receitas com o nome genérico dos
medicamentos prescritos, datilografadas ou em letra legível, sem a utilização
de códigos ou abreviaturas, com o nome, assinatura do profissional e número de
registro no órgão de controle e regulamentação da profissão. Recusa
O paciente pode desejar não ser
informado do seu estado de saúde, devendo indicar quem deve receber a
informação em seu lugar. Respeito Ter assegurado, durante as consultas, internações,
procedimentos diagnósticos e terapêuticos, a satisfação de necessidades, a
integridade física, a privacidade, a individualidade, o respeito aos valores
éticos e culturais, a confidencialidade de toda e qualquer informação pessoal,
e a segurança do procedimento; ter um local digno e adequado para o
atendimento; receber ou recusar assistência moral, psicológica, social ou
religiosa. Sangue Conhecer a procedência do sangue e dos hemoderivados e
poder verificar, antes de recebê-los, os carimbos que atestaram origem,
sorologias efetuadas e prazo de validade. Segunda opinião. Direito de procurar uma segunda opinião ou parecer de um outro médico sobre o seu estado de saúde. Sigilo Ter resguardado o segredo sobre dados pessoais, por
meio da manutenção do sigilo profissional, desde que não acarrete riscos à
terceiros ou à saúde pública. Fontes: Lei Estadual (São
Paulo) Nº 10.241, de 17/03/1999 Pareceres
dos Conselhos de Medicina Resolução Nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.
3. Os direitos do médico - Exercer a Medicina sem ser
discriminado por questões de religião, raça, sexo,nacionalidade,
cor, opção sexual, idade, condição social, opinião política ou de qualquer
outra natureza. - Indicar o procedimento adequado ao paciente, observadas as
práticas reconhecidamente aceitas e respeitando as normas legais vigentes no
país. - Apontar falhas nos regulamentos e normas das instituições em que
trabalhe, quando as julgar indignas do exercício da profissão ou prejudiciais
ao paciente, devendo dirigir-se, nesses casos, aos órgãos competentes e,
obrigatoriamente, à Comissão de Ética e ao Conselho Regional de Medicina de sua
jurisdição. - Recusar-se a exercer sua profissão em instituição pública ou
privada onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar o
paciente. - Suspender suas atividades, individual ou coletivamente, quando a
instituição pública ou privada para a qual trabalhe não oferecer condições
mínimas para o exercício profissional ou não o remunerar condignamente,
ressalvadas as situações de urgência e emergência, devendo comunicar
imediatamente sua decisão ao Conselho Regional de Medicina. - Internar e
assistir seus pacientes em hospitais privados com ou sem caráter filantrópico,
ainda que não faça parte do seu corpo clínico, respeitadas as normas técnicas
da instituição. - Requerer desagravo público ao Conselho Regional de Medicina
quando atingido no exercício de sua profissão. - Dedicar ao paciente, quando
trabalhar com relação de emprego, o tempo que sua experiência e capacidade
profissional recomendarem para o desempenho de sua atividade, evitando que o
acúmulo de encargos ou de consultas prejudique o paciente. - Recusar a
realização de atos médicos que, embora permitidos por lei, sejam contrários aos
ditames de sua consciência. Fonte: Código de Ética Médica Capítulo II -
Direitos do Médico - Artigos 20 a 28 4. Prontuário médico e
consentimento do paciente Dois instrumentos são
fundamentais para assegurar a boa relação entre médico e paciente: o prontuário
médico e o termo de consentimento livre e esclarecido do paciente. Prontuário O prontuário deve conter, de
forma legível, identificação do paciente; evolução médica diária (no caso de
internação); evoluções de enfermagem e de outros profissionais assistentes;
exames laboratoriais, radiológicos e outros; raciocínio médico, hipóteses diagnósticas e diagnóstico definitivo; conduta terapêutica,
prescrições médicas,
descrições cirúrgicas, fichas anestésicas, resumo de alta, fichas de
atendimento ambulatorial e/ou atendimento de urgência, folhas de observação
médica e boletins médicos. O prontuário deve ser guardado
por um período de pelo menos dez anos podendo, no final desse tempo, ser
armazenado em qualquer meio que possibilite sua reconstituição. O paciente tem
direito de acesso ao prontuário. Sem o consentimento do paciente, o médico não
poderá revelar o conteúdo de prontuário ou ficha médica, a não ser por dever
legal. Se o pedido for feito pelos familiares, será necessária a autorização
expressa do paciente. No caso de óbito, o laudo
deverá revelar o diagnóstico, o procedimento do médico e a causa mortis.
Para sua eventual defesa judicial, o médico poderá apresentar o prontuário
médico à autoridade competente. Consentimento livre e
esclarecido O médico tem o dever de
informar ao paciente sobre os riscos do ato médico, dos procedimentos e das consequências
dos medicamentos que forem prescritos. O termo de consentimento livre
e esclarecido tem como finalidade formalizar ou documentar o médico e o
paciente sobre as consequências e os riscos do ato médico. Pode ser realizado
verbalmente, transcrito no prontuário ou simplificado a termo em um documento. O termo não pode ser imposto,
não exclui nenhuma responsabilidade do médico e não tem valor para evitar
possível pedido de indenização futura. Deve ser apresentado em linguagem
acessível e simples e, após o entendimento, pode ser assinado pelo paciente e
pelo médico, se a opção for pelo documento escrito. Não existe modelo de termo de
consentimento, que deve ser elaborado pelas instituições de saúde, submetido à
avaliação da Comissão de Ética Médica e, quando necessário, ao próprio Conselho
Regional de Medicina. No caso de
pesquisa clínica, envolvendo medicamento ou tratamento ainda em teste, o
consentimento é rigoroso e deve seguir as normas da Resolução nº 196/96 do
Conselho Nacional de Saúde. (Guia Cremesp). O Conselho Federal de Medicina
disponibiliza no seu Portal Médico o Código de Ética Médica http://www.portalmedico.org.br/novocodigo/integra.asp Enfim não é por falta de normas, de
divulgação, de pregação que ocorrem as falhas pessoais no exercício da
medicina. Devemos considerar a possibilidade de que as mudanças são tão rápidas
que, mesmo os Conselhos, têm dificuldade em acompanhá-las. A Revista Veja, em
reportagem de Cecília Araújo (http://veja.abril.com.br/blog/10-mais/ciencia/as-10-maiores-descobertas-da-historia-da-medicina/) fez um resumo do livro do Professor
Jofre M. de Rezende sobre os maiores progressos da medicina nos últimos cem
anos. Mesmo tendo omitido algumas áreas como a Anestesia e a Psiquiatria a
lista dá uma ideia da complexidade do assunto. 10. Transplantes de órgãos. Os transplantes inicialmente se resumiam a
um único órgão: o rim. Atualmente, já se é possível transplantar coração,
pulmão, fígado, tecido pancreático e medula óssea. No futuro, certamente,
outros órgãos também poderão ser substituídos. O sucesso dos transplantes se
deve, antes de tudo, à imunologia, pela descoberta dos antígenos de
histocompatilidade, e à farmacologia, pela obtenção de drogas
imunossupressoras. O uso de próteses também tende a se expandir em diferentes
especialidades, pela disponibilidade de materiais inertes e duráveis, incapazes
de provocar reações teciduais. 9. Grandes progressos nos atos cirúrgicos –
com destaque para a cirurgia cardíaca, a neurocirurgia e a oftalmologia – foram
possíveis graças à colaboração de outras disciplinas, como a anestesiologia, a
neurofisiologia, a bacteriologia e a imunologia. O coração, antes intocável,
tornou-se um órgão acessível, graças à introdução da circulação extracorpórea,
que permitiu a correção das malformações congênitas, a revascularização e
outros tipos de operações. Já a neurocirurgia e a oftalmologia se beneficiaram
com o uso dos raios laser. 8. A fecundação artificial do óvulo em
laboratório e o implante intrauterino do ovo fecundado são uma façanha sem
paralelo na história da reprodução humana. A partir dessa descoberta,
acredita-se que o caminho esteja aberto para que se possa conseguir, no futuro,
o desenvolvimento do embrião fora do ventre materno. Já a clonagem de animais
pela manipulação celular mostrou ser possível a clonagem de seres humanos,
enquanto as células-tronco provaram seu potencial no tratamento de muitas
doenças degenerativas. 7. O campo da engenharia genética deu
origem a um acontecimento promissor: a determinação da estrutura do DNA – base
de toda matéria viva e responsável pela transmissão do código genético. Mais
tarde, reveladas as chamadas enzimas de restrição, capazes de fragmentar a
molécula do DNA, tornou-se possível alterar o código genético de uma célula,
introduzindo nela um segmento de DNA de outra totalmente diferente. A
engenharia genética já colabora para a produção de hormônios, enzimas e
vacinas, e prevê-se que sua atuação se amplie consideravelmente no futuro. 6. A fibroendoscopia foi um grande
progresso nos métodos diagnósticos porque substituiu os então utilizados
aparelhos metálicos, rígidos e cheios de limitações. Em 1958, foi publicado o
primeiro trabalho sobre a utilização de fibra óptica em endoscopia, resolvendo
um dos problemas aparentemente insolúveis: o da curvatura da luz. A novidade
possibilitou a obtenção das imagens antes não alcançadas. Vinte anos depois, a
fibroendoscopia foi superada pela videoendoscopia. 5. Técnicas de Alta Sensibilidade. Os
laboratórios desenvolveram técnicas de alta sensibilidade que contribuíram para
o diagnóstico clínico. Um exemplo foi o radioimunoensaio (que depois evoluiu
para o método imunoenzimático), que permitiu detectar substâncias em
concentrações infinitamente pequenas nos líquidos orgânicos e nos tecidos.
Algumas dessas substâncias são os hormônios, os peptídios, os neurotransmissores,
os antígenos e os anticorpos. Pela descoberta do radioimunoensaio, Rosalyn
Yallow recebeu o prêmio Nobel de 1974. Ela foi à segunda mulher a receber essa
distinção em Fisiologia e Medicina. 4. A descoberta dos raios-X, no final do
século XIX, e sua aplicação com fins diagnósticos, no início do século XX,
constituíram um marco importante na história da medicina. Seu sucesso levou à
busca de outros métodos diagnósticos por imagens, que resultou no surgimento da
ultrassonografia, método de larga aplicação, sobretudo em obstetrícia; da
tomografia computadorizada, cuja alta resolução permitiu o diagnóstico de
lesões não detectáveis pelos métodos anteriores; e da ressonância nuclear
magnética, capaz de gerar imagens nítidas das áreas magnetizadas, substituindo
outros exames mais agressivos. 3. Síntese de hormônios e vitaminas. O
isolamento e a determinação da estrutura química de hormônios possibilitou
a síntese de grande parte deles em laboratório. Dois exemplos práticos são a
composição artificial da insulina, usada no tratamento da diabetes mellitus, e
da cortisona, de grande poder anti-inflamatório e
imunossupressor. A descoberta das vitaminas, por sua vez, revolucionou a
prevenção e o tratamento das doenças resultantes de carências específicas
desses elementos: escorbuto, beribéri, pelagra e raquitismo, raramente
encontradas hoje em dia. 2. A descoberta dos antibióticos,
na primeira metade do século XX, reduziu drasticamente as taxas de mortalidade.
Se até então doenças como pneumonia e febre tifoide matavam milhares de pessoas
no mundo todo, elas passaram a ser controladas a partir daí. Moléstias de
difícil tratamento no passado, como sífilis, tuberculose e lepra, também
puderam ser curadas graças aos antibióticos. Entretanto, algumas bactérias
terminaram por criar resistência à substância, o que incentivou uma busca
continuada de novos tratamentos. 1. A maior contribuição da medicina à saúde
foi no campo da prevenção das doenças, por meio da imunização em massa e das
ações desenvolvidas sobre o meio ambiente. Doenças como tétano, difteria,
coqueluche, sarampo, poliomielite, febre amarela e hepatite B já podem ser
evitadas graças à existência de vacinas eficazes. Medidas voltadas para o meio
ambiente, como saneamento básico, hábitos de higiene e melhoria das habitações,
também contribuíram em larga escala para a elevação do nível de saúde a partir
do século XX.
Algumas áreas da medicina se tornaram eminentemente técnica, a figura do
paciente é quase um acessório. Se acrescentarmos os intermediários entre o médico
e seu paciente, fica distante a clássica relação médico-paciente com
continuidade, conhecimento mútuo e profundo respeito entre ambas às
partes. Os clínicos em geral, entre eles
os psiquiatras são os guardiões desta relação. A prática psiquiátrica, influenciada
pela prática analítica preserva esta relação como fundamental no tratamento.
Existem psiquiátricas que trabalham preferencialmente como prescritores e a
relação fica reduzida ao efeito positivo ou negativo dos psicofármacos.
Uma realidade que desafia os bons médicos é a redução constante dos
valores recebidos e a tentativa de adaptar-se aos novos tempos reduzindo a
duração das consultas, restringindo o contato com seu paciente. Se por um lado
os planos de saúde aumentaram o público alvo da medicina, por outro lado a
pressão de redução de custos atingiu profundamente a relação médico paciente.
Hoje em dia os prestadores de serviços, clínicas, hospitais, despersonalizaram
o médico e os utilizam sem qualquer culpa ou pudor com o objetivo de manter
seus serviços rentáveis. Assim temos um atendimento em volume que tornam muito
difícil a relação médico-paciente. Nas especialidades, em muitas delas ela é
praticamente inexistente. O profissional trabalha numa linha de montagem e sua
preocupação é que ela seja alimentada continuamente. Nos EUA, no tempo que
morei por lá, acompanhei vários acidentes em que ocorreu a cirurgia na perna
errada, extração de órgão errado e acidentes similares. Volto para o Brasil e
vejo os mesmos acidentes acontecerem. Cirurgião que nunca viu o paciente, entra na sala, opera o lhe mandam operar e depois o erro é
contatado. O
que me consola é que tem muito médico dedicado, atento, preocupado com seu
paciente. Diante das notícias ruins lembrei-me de um querido amigo, precocemente
falecido que escreveu anos atrás sua visão de um médico. Trata-se do psiquiatra
Cláudio Duque do Recife que nos brindou com a seguinte história:
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