![]() ![]() Volume 13 - 2008 Editores: Giovanni Torello e Walmor J. Piccinini |
Fevereiro de 2008 - Vol.13 - Nº 2 France - Brasil- Psy Coordenação: Docteur Eliezer DE HOLLANDA CORDEIRO Quem somos (qui
sommes-nous?)
France-Brasil-PSY é o novo espaço virtual de “psychiatry on
line”oferto aos profissionais do setor da saúde mental de expressão
lusófona e portuguesa.Assim, os leitores poderão doravante nela encontrar
traduções e artigos em francês e em português abrangendo a psiquiatria, a
psicologia e a psicanálise. Sem esquecer as rubricas habituais : reuniões
e colóquios, livros recentes, lista de revistas e de associações, seleção de
sites. Qui sommes- nous ? France-Brasil-PSY est le nouvel espace virtuel de “psychiatry on
line”offert aux professionnels du secteur de la santé mentale d’expression
lusophone et française. Ainsi, les lecteurs pourront désormais y trouver des
traductions et des articles en français et en portugais concernant la
psychiatrie, la psychologie et la psychanalyse. Sans oublier les rubriques
habituelles : réunions et colloques, livres récentes, liste de revues et
d’associations, sélection de sites
Laurent Joffrin, Philippe Azoury e Eric
Favereau Jornal Libération QUOTIDIEN : mardi 29 janvier 2008 Resumo e tradução : Eliezer de Hollanda
Cordeiro Por ocasião da estréia de seu documentário, «Ela se
chama Sabine», a atriz Sandrine Bonnaire
aceitou um convite feito por Laurent Joffrin,
redator-chefe do jornal Libération, para retornar aos dois hospitais
psiquiátricos onde a sua irmã havia sido internada durante 5 anos. Aceitou o convite mas precisou : ‘’Não quero que
isto seja um requisitório contra a
psiquiatria. Não tenho nada contra os hospitais. Mas quando vemos como
Sabine voltou’’ ... Philippe
Azoury, crítico cinematográfico, fala do documentário que ‘’mostra Sabine bavando, dormindo, esmurrando, repetindo 100 vezes a mesma questão.E
de sua surpresa ao perceber o
quanto Sabine era bela, bela como a sua
irmã, com quem parecia muito.Sandrine evoca a infância de Sabine, em sequências
em que ‘’se morde os punhos, se arranha o rosto, se despe no pátio de recreio,
quando rejeitada pelas outras crianças da escola. Deixou
de frequentar a escola aos 12 anos
, mas sabia tocar piano em casa, tinha dons,
tocava Bach e Schubert’’. ‘’Alguns anos depois,
os irmãos e irmãs foram viver suas vidas de adultos.Mas Sabine ficou.
Antes de ser hospitalizada, sua situação havia piorado, seu irmão morrera… As irmãs visitavam-na a cada semana, na casa da mãe onde
continuava a viver. Um dia, conta Corinne a irmã mais velha, ficamos muito
inquietas porque Sabine batia na nossa
mãe. Então Sandrine levou-a para a sua própria casa, mas a situação não melhorou.
Foi assim que decidimos levá-la a Villejuif’’. Laurent Joffrin
questiona : ‘’que nos diz o
documentário, sem espírito de sistema nem de demonstração? O julgamento é
severo : nosso país, levado por um necessidade mundial de eficiência, não sabe mais o
que fazer de suas margens.Uma sociedade, disse Tocqueville, se
julga pelo estado de suas prisões. Se julga também pela situação de seus
hospitais psiquiátricos. Sabine, mulher diferente, trancada dentro de si
por um mal enigmático, passou cinco anos
a se tratar.Ela saiu destruida pela metade.
E sua irmã, Sandrine, ignora o
que se passou.’’ PRIMEIRA HOSPITALIZAÇÃO.
‘’L’hôpital Paul-Guiraud à Villejuif é um mundo a
parte, um grande estabelecimento construido, como tantos outros, no fim do
Século XIX, para internar doentes de
Paris e de sua região. Cada serviço corresponde a um setor
geográfico, o de Sabine é o setor 15.’’ ‘’Sandrine e as irmãs foram recebidas por dois médicos que se referiram ao dossiê de
Sabine. As irmãs querem saber porque
Sabine foi trancada e amarrada, porque
colocaram-na numa UMD
(Unidade para doentes difíceis), se isto
não teria agravado a agressividade da irmã, porque lhe deram doses de medicamentos tão fortes, se o caso dela era mesmo tão dificil… E como explicar que o comportamento de Sabine tivesse melhorado, ao ponto que lhe fosse posivel viver atualmente com outros pacientes numa casa de vida, solta, tomando apenas
pequenas doses de medicamentos ? ‘’ ‘’Os médicos disseram que Sabine chegou ao hospital Paul-Guiraud em faze aguda, que seu comportamento era
violento, que se automutilava, que um dia
deu uma tapa num enfermeiro…Embora isto não fosse um ato grave, foi uma tapa sem razão, inquietante pelo seu caráter
imotivado. E acrescentaram que as vezes
era necessário controlar o comportamento de um paciente, que todos os dias
recebiam pacientes como Sabine, que tudo isso
fazia parte do trabalho quotidiano. E perguntaram: Será que ela não teria ficado tempo demais aqui ? Nosso
problema é de encontrar lugares de vida
alternativos. Na época não tínhamos’’. NA UNIDADE PARA DOENTES DIFICEIS ‘’Existem na França cinco unidades deste tipo.
Nelas são hospitalizados doentes chamados
perturbadores, mas também pacientes considerados como perigosos.
Sabine foi encerrada durante cinco meses na UMD. Uma prisão, retorca
Sandrine ao rever o prédio.É estranho, traçam-nos o retrato de uma
Sabine violenta, perigosa. Como se tivesse sido instalada pouco a pouco num papel diferente,
mais violento, mais grave’’. ‘’NÃO E CÓLERA, É TRISTEZA’’ Sandrine Bonnaire : ‘’Fui discutir com a
Dr B, após lhe ter enviado um DVD do filme. Disse-me que não tinha a impressão
de ter mal feito o seu trabalho. E que, se fosse o caso, a equipe inteira tinha se enganado.’’ ‘’No carro que se dirigia à clínica, Sandrine, Jocelyne e Lydie embora estivessem
transtornadas, não deixaram transparecer qualquer emoção. Era a primeira
vez que voltavam aos Murets. Durante o trajeto, a tensão aumentou pouco a pouco,
começaram a evocar lembranças e riam com
tudo isso. Lydie, abafando a sua
ira : no dia do aniversário de Sabine,
fui levar-lhe um bolo. Disseram-me
que as visitas da família eram proibidas.Sabine estava perto de mim. Fiz como
se quizesse ir ao seu encontro. Dois enfermeiros levaram-me para fora da
clínica.’’ -‘’A atriz teria aprendido alguma coisa por
ocasião deste retorno ? Teria sido afetada por certos argumentos ?’’ - ‘’O que sinto não é cólera, é tristeza. As
respostas que deram não nos ensinaram nada. E isto foi o mais terrível’’ SEGUNDA HOSPITALIZAÇÃO
‘’O hospital dos Murets na
Queue-en-Brie(…) Um prédio fechado, cercado de grades, no meio de um
parque. Os médicos aceitam encontrar as irmãs de Sabine, porém sem a presença
dos jornalistas. O chefe de serviço mostrou-se
aberto : Crêiam-me, não poderíamos ter feito melhor. Sabine precisava ser
hospitalizada, até mesmo trancada. Foi uma medida terapêutica. Ao chegar
aqui, fiquei surpreso com a violência que manifestava para consigo e para com
os outros :batia, injuriava, cuspia no rosto das pessoas. Isto não podia
ser tolerado, sobretudo porque ao lado
dela havia pessoas que iam muito mal. Vossa irmã sofre de uma doença extremamente
grave. Uma psicose
infantil com distúrbios do comportamento. É muito difícil, carecemos
muitíssimo de recursos.’’ ‘’Um severo tratamento foi decidido,
manifestadamente mais destinado a
tranquilizar o serviço do que para o bem estar de Sabine. O médico
explica-nos : O problema de Sabine,
é que os neurolépticos não atuam muito
bem nela. Donde a idéia de uma janela terpêutica. A equipe médica suspendeu
todos os medicamentos para que o organismo de Sabine se reconstruisse. Mas
havia um risco em termos de comportamento e foi a busca desta janela terapêutica
que levou Sabine a ficar na UMD
de Villejuif’’. ‘’Um lugar carceral, trancada o dia inteiro, sem nenhuma permissão para
sair’’, ajunta o jornalista. Sandrine pergunta ao psiquiatra ‘’se puderam trabalhar com
a irmã’’ : - ‘’Somente quando ficava mais calma com os
outros, mas na medida de nossas possiblidades. O hospital psiquiátrico é o
lugar de todas as misérias.Temos somente
tres enfermeiros permanentes para 25 doentes. Fazemos o que podemos com os
meios que temos’’. - ‘’O Senhor reconhece que os tratamentos decorrem
às vezes da falta de meios?’’. - ‘’Apezar de tudo, os medicamentos
constituem um progresso.Antes, um doente
podia gritar o dia inteiro até perder a voz’’. -As irmãs : Mas ‘’Sabine era alguém que
exprimia suas angústias.Era capaz de trocas, de contacto, sabia tocar músicas
de Schubert, dezenhava. Perdeu completamente a memória, não sabia mais como se
vestir. Como explicar isto ?’’ - ‘’O que tento lhe dizer é que ela descompensou
várias vezes. Foi isto que a levou ao
hospital.Pode crer, o hospital não é a causa da doença dela.’’ ‘’Sabine deixou os Murets em outono de 2000. Novo
combate : após muitas dificuldades, as
irmãs encontraram um outro lugar, mas a Dra. L. opunha-se à saida de
Sabine. Dizia-nos que devia continuar hospitalizada , que não devia ir para Charente
porque este serviço não era suficientemente medicalizado, conta Sandrine.
Finalmente, em 29 de
dezembro, Sabine foi para um lugar de vida perto de Angoulême’’.
2.A PSIQUIATRIA PÚBLICA ESQUECIDA QUOTIDIEN : mardi 29 janvier 2008 ‘’A psiquiatria pública vai mal. Piorou de vinte nos para cá e os poderes públicos parecem indiferentes. Suprimem-se
leitos sem cessar : existiam 80. 000 em 1989, hoje somente 40.000, enquanto o
número de pacientes atendidos em
psiquiatria foi multiplicado por dois durante o mesmo período’’. ‘’Sinal evidente de tensão : o número de
hospitalizações contra
a vontade do paciente aumentou nos últimos vinte anos e representam
hoje um terço dos pacientes
hospitalizados. Houve mesmo um plano de saúde mental, lançado em 2005 por Philippe Douste-Blazy,
na época ministro da Saúde. Feito às
pressas, após o duplo assassinato no
hospital psiquiatrico de Pau, o plano jamais
foi aplicado. Das dez medidas previstas, só uma foi aplicada. E a maior parte
das medidas aplicadas eram relacionadas às
questões de segurança, aos quartos de
isolamento, às questões de vigilância pela video. Tais problemas são importantes, porém marginais qundo se deve
cuidar dos doentes mentais graves’’. ‘’Em dezembro, o Comité nacional de ética apresentou um relatório
sobre as insuficiências do acompanhampento
dos autistas na França. Seu presidente, o professor Didier Sicard quebrou o
silêncio e evocou ‘’a vergonha frances’’, acrescentando que ‘’os limites dos maus tratos foram
alcançado’’. Segundo o Comité consultativo francês de
ética que dirige, ‘’a falta de
estruturas destinadas a autistas na França acarretou o exílio definitivo para
a Bélgica de cerca de 3.500 crianças e adultos sofrendo de síndromes autistas ou de deficiências
mentais’’. Notemos a constatação: ‘’Na França, isolamos os mais vulneráveis,
enquanto na Suécia toma-se decisões
visando inseri-los no centro da cidade,
em pequenas estruturas, com acompanhantes’’. ‘’Mesmo assim,
não seria verdade dizer que não se faz nada na França. Setores de
psiquiatria, como a clínica
de La Borde por exemplo, esforçam-se
muitas vezes sozinhos e resistem em nome
de uma psiquiatria diferente. Existem
também estruturas associativas ( Ver nosso artigo : Apresentação dos CMPP ),
outras estão sendo criadas, desenvolvolvem-se lugares de
vida,como em Charente, onde se encontra Sabine.Convém salientar o
papel importante desempenhado pelas associações de doentes mentais’’. ‘’Mas pouco importa, neste enorme navio desarvorado, a idústria
farmacêutica é a única que dispõe dos meios necessários, ela impõe a sua lei,
as vezes com razão :muitas moléculas conseguiram abrandar a vida dos
doentes.Mas seria de bom auspício o fato de que nunca se consumiu tantos
medicamentos na França, notadamente antepsicóticos ?’’ ‘’Se a singular história de Sabine mostrasse
uma psiquiatria pública declinando dia a dia ? Félix Guattari,
célebre filósofo-psicanalista, declarou a Libération há 16 anos : ‘’Com pacientes
que sofrem dores insuportávies, creio que, antes de tudo, devemos ser… atenciosos.’’
3.DEFESA DA PSIQUIATRIA
Eliezer de Hollanda Cordeiro
A reportagem sobre o documentário ‘’Ela
se chama Sabine’’, bem como as reações dos familiares da paciente, mostram-nos
a complexidade do problema evocado. De fato, o autismo, como várias doenças
psíquicas, tendem a isolar as pessoas, afetiva e socialmente.
Mas o problema não é a
psiquiatria : não se pode dizer que ela
seja pelo isolamento e pela exclusão dos doentes !Desde Pinel que a
psiquiatria começou um lento processo de transformação dos cuidados, estes
tendo sido acelerados pelos progressos dos métodos psicoterápicos e das
pesquisas farmacológicas. Foi uma grande vitória contra a exclusão social de
inúmeros pacientes, cujas vidas mudaram completamente. A partir daí, os asilos
começaram a se esvaziar.
Contudo, subsistem práticas de isolamento terapêutico, como no
caso de Sabine. O isolamento pode ser
inevitável em certas patologias agudas, pode resultar também da falta de
recursos, como disse um dos psiquiatras às irmãs de Sabine e como salientaram os jornalistas.Mas, ao meu
ver é a formação de muitos que é capenga,
insuficiente!No caso de Sabine, nenhum psiquiatra me parece haver feito uma
trabalho psicoterápico pessoal que lhe permitisse encontrar a família da
paciente.E escutar o que as irmãs e a
mãe de Sabine tinham a dizer, juntas ou individualmente. Não devemos estranhar,
nessas condições, que tivessem se
sentido também excluidas, isoladas, sem poder exprimir os inevitáveis sofrimentos que nunca faltam em tais situações. Não, os hospitais
públicos franceses dispõem de equipamentos, de recursos e de conforto para praticar
uma psiquiatria que não seja exclusivamente medicamentosa.
Por último, traduzi um trecho da reação do colega psiquiatra Serge Hefez,
que me pareceu
interessante publicar no presente trabalho.
Opinião de Serge Hefez : ‘’Os psiquiatras, este insondável rebanho de
desenlameadores de abismo, como escreveu Antonin Artaud, não são
decididamente bem vistos pela imprensa. Então,
cábe-nos tornar mais conhecida a realidade de nossas ações, a quantidade de iniciativas que tomamos, mesmo minúsculas, buscando inserir os doentes mentais na trama da vida
social e recusando excluí-los nos universos fechados dos asilos de alienados. As
vezes até correndo riscos de sermos invectivados
quando doentes perigosos cometem um crime irreparável, como ocorreu há
algum tempo na cidade de Pau …(Ver nosso artigo: ‘’Observações sobre a
psiquiatria francesa’’). ‘’E, mesmo se estou perfeitamente consciente da
existência de ovelhas negras, de especialistas gananciosos e desprovidos de
ética, defenderei ainda aqui a dedicação das centenas de equipes que trabalham todos
os dias no terreno,o mais perto possivel
do sofrimento psíquico’’. 4.REVISTAS *La revue française
de psychiatrie et de psychologie medicale *Nervure 5. ASSOCIAÇÕES *Mission Nationale d’Appui en
Santé Mentale *Association française pour l’approche integrative et
eclectique en psychotherapie (afiep) *Association
française de psychiatrie et psychologie legales (afpp) *Association française de musicotherapie (afm) *Association française de therapie comportementale et
cognitive (aftcc) *Association de langue française pour l’etude du stress et du trauma
(alfest) *Association
de formation et de recherche des cellules d’urgence medico-psychologique
(aforcump) *Association nationale des hospitaliers pharmaciens et
psychiatres (anhpp) *Association scientifique des psychiatres de secteur
(asps) *Association pour la fondation Henri Ey *Association
internationale d’ethno-psychanalyse (aiep) *Collectif de
recherche analytique (cora) *Groupement d’études et de prevention du suicide (geps) *Groupe de recherches sur l’autisme et le polyhandicap
(grap) *Groupe de recherches pour l’application des concepts
psychanalytiques a la psychose (grapp) *Société
française de gérontologie *Société
française de thérapie familiale (sftf) *Société française de recherche sur le sommeil (sfrs) *Société
française de relaxation psychotherapique (sfrp) *Fédération
française d’adictologie *Société de psychologie medicale et de psychiatrie de
liaison de langue française *Union nationale des amis et familles de malades mentaux
(unafam) *Association Psychanalytique de France (apf) *Société Psychanalytique de Paris (spp) *Coordination (coordenador):
Eliezer de HOLLANDA CORDEIRO ![]()
|