Junho de 2021 – Vol. 26 – Nº 06

Walmor J. Piccinini

Minha história com a psiquiatria começou em 1960 quando estudante de medicina do primeiro ano e com 18 anos de idade. Comecei a trabalhar como atendente/enfermeiro num hospital psiquiátrico, a Clínica Pinel de Porto Alegre. Na época predominavam os grandes hospitais públicos e seus Centros de Estudos. Os psiquiatras aprendiam a profissão de forma prática, com a tutoria de professores das Universidades ou de psiquiatras mais antigos. O primeiro curso formal de ensino da psiquiatria começou em 1957 na Divisão Melanie Klein (fundada em 1961) no Hospital Psiquiátrico São Pedro. A escolha do nome confirma a inclinação para a psicanálise dos seus fundadores. A Clínica Pinel desde o início formou seus médicos no estilo da Clínica Menninger de Topeka, Kansas. Um hospital “dinâmico”, que adotava orientação psicanalítica.

Resumindo, até os anos 60s predominavam os Centros de Estudos dos Grandes hospitais que tiveram grande expansão na era Vargas com a criação da DINSAN e seu eterno Dirigente o Dr. Adauto Botelho. Os psicólogos era poucos e mais dedicados ao ensino. Serviço social dava seus primeiros passos. Os psiquiatras aplicavam testes e desenvolveram alguns Serviços de Rorchach. A tese para obtenção da cátedra de psiquiatria da UNB em 1954, pelo professor Leme Lopes foi sobre a aplicação do Rorchach.

A revolução da assistência psiquiátrica que começou durante e após a segunda guerra mundial saudava o surgimento dos antipsicóticos e antidepressivos. Os excedentes de vestibulares da área da saúde favoreceram o surgimento de novos cursos, entre eles os de Psicologia.

Cursos de Psicologia (de acordo com Rudá, Almeida e Coutinho)

Anteriormente à Lei n. 4.119 (1962, 27 de agosto), a formação era desenvolvida através de cursos de especialização ou mesmo cursos breves de preparo técnico. São Paulo registrou uma das primeiras experiências de especialização na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Sedes Sapientiae, em 1953 (Baptista, 2011). No Rio de Janeiro, o Instituto de Seleção e Orientação Profissional (ISOP), oferecia uma série de cursos breves, voltados para o preparo técnico de profissionais habilitados ao exercício da Psicotécnica (Instituto de Seleção e Orientação Profissional, 1949, 1951, 1952). Além disso, aponta-se também o curso de especialização em Psicologia na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), que viria, após o acréscimo de mais um ano letivo, conceder o título de psicólogo, em 1959 (Gomes & Hutz, 2010)

Desse modo, é possível dividir a narrativa sobre a formação de psicólogos no Brasil em três períodos: (1) o período heroico – tomando emprestado o termo de Lourenço Filho (1971) –, que compreende as primeiras experiências formativas, pouco sistemáticas e de fraca regulamentação; (2) o período do Currículo Mínimo, instituído a partir da Lei n. 4.119 (1962, 27 de agosto) e do Parecer n. 403 do antigo Conselho Federal de Educação (CFE); e (3) o período das Diretrizes Curriculares Nacionais, instituídas em 2004 e reformuladas em 2011.

O número de psiquiatras oi aumentando e a necessidade de uma entidade nacional foi amadurecendo e em 13 de agosto de 1966 foi fundada a Associação Brasileira de Psiquiatria.

Rio de Janeiro e São Paulo eram os maiores centros de assistência psiquiátrica do país e a possibilidade que dominassem a nova associação era muito grande, por isso foi acordado que um presidente seria do sul e alternaria com o norte e nordeste.

Os alunos e psicólogos recém graduados foram se organizando, de início por melhores condições de trabalho e remuneração e mais adiante pelo espaço do tratamento. Eles foram apoiados por alguns psiquiatras e pela ABP.  Foram surgindo novas entidades, todos em busca por espaço.

Ao longo dos anos os psiquiatras que lutavam contra a Federação Brasileira de Hospitais Psiquiátricos em busca de espaços e melhor remuneração dos psiquiatras começam a ser contestados por esta nova força que crescia em número e qualidade de serviços prestados.

Os grandes hospitais públicos foram sendo abandonados pelos governos, pois eram muito dispendiosos e os profissionais passaram a criar hospitais particulares e a se dedicarem aos consultórios particulares. Pelo outro lado os psicólogos começaram a derrubar os obstáculos a formação de psicanalista e hoje dominam o campo que até os anos oitenta era privativo dos médicos.

Os psiquiatras se reúnem em torno da Associação Brasileira de Psiquiatria e são desafiados permanentemente por uma série de entidades, na maioria dirigida por psicólogos, mas com alguns psiquiatras na liderança. Algumas delas:

Abrasco/ Associação Brasileira dessaúde coletiva

Abrasme/ Associação Brasileira de Saúde Mental

o CFP/Conselho Federal de Psicologia,

o CEBES/Centro Brasileiro de Estudos e Saúde.  O Cebes é um espaço plural e suprapartidário cuja missão histórica é a defesa da democracia, dos diretos sociais e da saúde. Desde 1976, a entidade desenvolve ações voltadas para a ampliação da consciência e do pensamento crítico em saúde.

o IMS-UERJ/Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro,

o MNLA/Movimento Nacional da Luta Antimanicomial e a

RENILA/Rede Nacional Inter núcleos da Luta Antimanicomial

A estas forças antipsiquiátricas se contrapõem:

A Associação Brasileira de Psiquiatria/ABP

Conselho Federal de Medicina/CFM, a

Federação Nacional dos Médicos/FENAM, a

Associação dos Amigos, Familiares e Doentes Mentais do Brasil/AFDM e

a Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos/ABRATA.

Nos últimos 30 anos o Ministério da Saúde passou a ser aparelhado pelo Partido Comunista Brasileiro e outros partidos de esquerda lá colocados pelo ministro José Serra. A Coordenação de Saúde Mental, geralmente desprezada pelos psiquiatras passou a ser dirigida pelo Professor Pedro Delgado e ele com sua equipe produziu uma grande virada nos rumos da assistência psiquiátrica no Brasil. Marcou o desaparecimento dos psiquiatras do Ministério da Saúde e o domínio de outras profissões como antropólogos e psicólogos.

O Ponto de virada parece ter sido a nomeação de Valencius Wurch Duarte Filho para a Coordenação de Saúde Mental Álcool e outras Drogas do Ministério da Saúde em 10 de dezembro de 2015.  Ele substituiu Tykanori Kinoshita um dos líderes das forças antipsiquiátricas. A permanência no cargo do Dr. Valencius durou poucos meses e foi muito tumultuada pela oposição a ele. Surgiu o movimento de ocupação da Coordenadoria De saúde Mental e mais do que isto, o novo nomeado não conseguia nem uma mesa para poder trabalhar. O que parecia um movimento de resistência heroica desnudou as forças que impediam qualquer mudança de rumos da assistência psiquiátrica.

Referências

  1. Formação em psicologia no Brasil: o período do currículo mínimo (1962-2004) por Caio Rudá Universidade Federal da Bahia Denise Coutinho Naomar de Almeida Filho Universidade Federal do Sul da Bahia Brasil.
  2. Chaves, Lilian Leite – Dos eventos documentados aos documentos manejados: A política de saúde mental brasileira em disputa. Anuário Antropológico, Brasília, UnB, 2018, v. 43, n. 2: 261-284
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