Psyquiatry online Brazil
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Volume 22 - Novembro de 2017
Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello

Abril de 2017 - Vol.22 - Nº 4

France - Brasil- Psy

Coordenação: Docteur Eliezer DE HOLLANDA CORDEIRO

Quem somos (qui sommes-nous?)                                  

France-Brasil-PSY é o novo espaço virtual de “psychiatry on line”oferto aos profissionais do setor da saúde mental de expressão lusófona e portuguesa.Assim, os leitores poderão doravante nela encontrar traduções e artigos em francês e em português abrangendo a psiquiatria, a psicologia e a psicanálise.

Qui sommes- nous ?

FRANCE-BRASIL-PSY est le nouvel espace virtuel de “psychiatry on line” offert aux professionnels du secteur de la santé mentale d’expression lusophone et française. Ainsi, les lecteurs pourront désormais y trouver des traductions et des articles en français et en portugais concernant la psychiatrie, la psychologie et la psychanalyse.

SOMMAIRE (SUMÁRIO):

 

  • 1. MEMÓRIAS DE UM BRASILEIRO-FRANCÊS SOBRE A HISTÓRIA DA PSICANÁLISE NO BRASIL (SEGUNDA PARTE)
  • 2. A PSICANÁLISE COMPLETA 100 ANOS
  • 3. TRATAMENTO DO AUTISMO
  • 4. DARCY UCHOA


  • 1. MEMÓRIAS DE UM BRASILEIRO-FRANCÊS SOBRE A HISTÓRIA DA PSICANÁLISE NO BRASIL (SEGUNDA PARTE)

    Eliezer de Hollanda Cordeiro

    Poderíamos até pensar que, havendo recebido desde o início uma recepção favorável da psiquiatria oficial, recepção tanto mais importante que vinha de dois ilustres psiquiatras brasileiros, era normal deduzir que as relações entre a psiquiatria e a psicanálise se desenvolveriam sem muitas dificuldades no Brasil.

    As resistências iniciais dos psiquiatras tendo sido vencidas, e, ao mesmo tempo o obstáculo mais importante desaparecido, como pensava Freud, poderíamos esperar uma penetração mais fácil dos conceitos psicanalíticos. Mas isto não aconteceu porque, durante muitos anos a psiquiatria brasileira pareceu não querer levar em conta a contribuição psicanalítica.

    Se estudarmos a classificação oficial das doenças mentais em vigor no Brasil até 1948, constataremos que ela conservou desde 1910, data de sua aplicação, uma nosografia que não levou em conta nem as contribuições psicanalíticas e nem mesmo as de Bleuler. Com efeito, notemos, por exemplo, que a psicastenia, a neurastenia e mesmo a coréia faziam parte duma única entidade: a das « psicoses neuróticas ».

    Mais de 50 anos foram necessários para que a nosografia brasileira adotasse a neurose obsessiva, embora esta tivesse sido isolada por Freud nos anos 1894-1895.

    É verdade que a psicastenia havia sido colocada na categoria das ‘’psicoses neuróticas’’ e que era possível então argumentar que as obsessões e fobias estavam incluídas nessa entidade clínica descrita por Janet. Mas isto não mudaria o fundo do problema, isto é que as fobias e as obsessões são fenômenos diferentes, exprimindo conflitos psíquicos particulares e com suas dinâmicas inconscientes específicas.

    Em compensação, podemos notar que a antiga noção de degenerescência mental, descrita por Magnan, foi mantida até 1948, a qual incluía também as obsessões. Até esta data, poderemos reencontrar a entidade nosográfica de Kraepelin, a demência precoce, ao lado de outras como a paranóia, a parafrenia e o delírio sistemático alucinatório crônico.

    A partir de 1948 poderemos notar o desaparecimento da demência precoce e a introdução do grupo das esquizofrenias, o qual, além das formas clássicas, englobava também a paranóia

    e a parafrenia.

    Entretanto, não podemos esquecer que a psicanálise apareceu no Brasil relativamente tarde, o primeiro trabalho de Freud (As cinco lições sobre a psicanálise), tendo sido publicado em português em 1931, época na qual ele já havia quase terminado a sua obra, o que certamente tornou ainda mais difícil sua implantação no Brasil.

    Sobre este assunto, podemos fazer alguns comentários sobre as ditas traduções. Elsa Ribeiro HAWELKA- psicóloga e psicanalista com quem fiz uma análise e que também analisou outros colegas que estavam em Paris, autora das traduções dos equivalentes portugueses e espanhóis para o ‘’Vocabulaire de la Psychanalyse’’, publicado por Jean LAPLANCHE e Jean-Bertrand PONTALIS- teve muitas vezes a ocasião de comparar com o texto original alemão, as traduções espanholas e brasileiras das Obras Completas de Sigmund FREUD. Ela nos deu as informações seguintes: ‘’A tradução brasileira das obras completas de Freud pela editora Delta S.A., Rio de Janeiro, São Paulo, 18 volumes, sem data, teve naquela época a vantagem de existir. Ela reuniu todos os trabalhos de Freud que haviam sido publicados na época, isto é, os da’’ Gesamnte WERKE’’. Contudo, ela escreveu que ‘’essa tradução deixou muito a desejar, não somente pela falta de rigor da terminologia adotada, mas também pelas incorreções da língua portuguesa que ela comporta. A versão traduzida, feita em grande parte por pessoas cujo idioma materno não era o português, parece se inspirar da tradução espanhola datada de 1923, igualmente imperfeita. As duas comportam freqüentemente os mesmos erros e as mesmas omissões.

    Mas não podemos repreender os pioneiros da tradução de Freud por causa desses erros, tanto mais que a edição da tradução brasileira foi feita a partir da tradução da edição espanhola.

    Contudo, se quisermos ser menos exigentes, poderemos dizer que a nosografia de 1948 marca o inicio de uma abertura importante às concepções psicogenéticas, especialmente no domínio das neuroses, mas igualmente das psicoses. A influência da psicanálise começou então a marcar, de maneira mais nítida, a psiquiatria brasileira.

    O autor brasileiro que mais se interessou pelo problema da semiologia psiquiátrica parece ter sido Otávio de Freitas, autor de vários trabalhos sobre esta questão. Para ele ‘’a semiologia psiquiátrica não deve se distinguir da semiologia médica nem pelo seu método, nem pelo seu objeto, mas deve ser considerada como uma parte fazendo parte de uma soma de conhecimentos, para não se desligar da realidade.


    2. A PSICANÁLISE COMPLETA 100 ANOS

    Referência: Magazine Littéraire (Sciences Humaines)

    Há cem anos foi publicado Die Traumeting (A Interpretação dos sonhos) escrito por um médico vienense de Viena chamado Sigmund Freud. Ele pretendia explicar enfim o sentido profundo dos sonhos. ’’O sonho não é um caos de sons discordantes, ele tem sentido e não é absurdo,’’  escreveu o inventor da psicanálise. ‘’ Ele é um fenômeno psíquico em toda acepção do termo, é a realização dum desejo (…), a atividade intelectual que ele edifica é uma atividade elevada e complicada.’’

    Conhecemos o resultado: o sonho exprime um desejo recalcado. Quando ele é de natureza sexual e se choca contra os interditos (desejo incestuoso por exemplo), este desejo é recalcado da consciência do sujeito e se exprime por uma forma enviesada. Freud aplicará o mesmo método de análise para explicar os atos falhos e os chistes.

    A Interpretação dos sonhos marcou o nascimento público da psicanálise. Freud desenvolverá em seguida sua teoria do psiquismo, se ocupando ao mesmo tempo da organização do movimento internacional. Desde então, a psicanálise tornou-se uma das correntes intelectuais mais influentes do século vinte.

    O Magazine Littéraire celebrou o centenário da psicanálise, publicando uma edição especial cuja finalidade é de oferecer um panorama bastante grande da herança intelectual de Freud.


    3. TRATAMENTO DO AUTISMO

    Referência: revista Le Point

    Um diurético fabricado há quarenta anos, a bumétamide, permite atenuar a severidade do autismo pela diminuição do nível de cloro nos neurônios. Estes são os resultados estimulantes dum ensaio clínico 2B conduzido na França em 88 crianças de 2 a 18 anos de idade sofrendo de distúrbios do espectro autístico. Uma melhora dos comportamentos sociais e das estereotipias foi observada. Mas será necessário esperar o fim do ensaio de fase 3-que vai começar em 2018- para tirar conclusões definitivas.

    Nota: proponho aqui a definição do autismo segundo o dicionário eletrônico Houaiss: ‘’Polarização privilegiada do mundo dos pensamentos, das representações e sentimentos pessoais, com perda, em maior ou menor grau, da relação com os dados e as exigências do mundo circundante’’.


    4. DARCY UCHOA

    Em 1970, foi publicado pelos doutores G.BENOIT e G. DAUMÉZON, o livro intitulado « Apport de la psychanalyse à la sémiologie psychiatrique »(Contribuição da psicanálise à semiologia psiquiátrica). Os autores citados apresentaram este trabalho no Congresso de Psiquiatria e de Neurologia de língua francesa, em Milão, entre 7-12 de Setembro. Na época, eu era residente estrangeiro no serviço do Doutor Daumézon. Este me pediu então para escrever algo sobre ‘’a penetração da psicanálise na semiologia psiquiátrica no Brasil’’. Após haver feito citações e tecido comentários sobre trabalhos de autores brasileiros como Maurício de Medeiros,Pacheco e Silva,Mário Yahn, Franco da Rocha, Durval Marcondes, Otávio de Freitas, Antônio Austregésilo, William Asmar, Nelson Pires,José Lucena, Zaldo Rocha e Galdino Loreto, escrevi o seguinte sobre Darcy Uchoa:’’ [ele] me parece ser o autor que mais se interessou por trabalhos clínicos sobre diferentes entidades nosológicas (paranóia, esquizofrenia, personalidade neurótica...) , escrevendo, entre outros, um notável trabalho sobre a neurose obsessiva:’’Estrutura psicológica da neurose compulsiva’’, 1945-6, em Neurobiologia, vol.X-XI.


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