Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Janeiro de 2017 - Vol.22 - Nº 1 Psiquiatria Forense DOCUMENTOS MÉDICO-LEGAIS PÓSTUMOS Quirino Cordeiro (1) No
final deste ano de 2016, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
(CREMESP) publicou o Parecer/Consulta No. 115.404/16, que versa sobre o
fornecimento de parecer psiquiátrico de pessoa já falecida. A
consulta que motivou o Parecer do Conselho apresentava as seguintes perguntas: 1- Um profissional de Psiquiatria tem autoridade para fornecer um parecer psiquiátrico póstumo, baseado
somente em prontuário médico, mesmo considerando que o falecido nunca esteve
sob seus cuidados? 2) Caso o profissional
de Psiquiatria tenha atendido o paciente durante um determinado período, e
tenha anotações sobre o tratamento e o desenvolvimento do paciente/estado da
doença, poderia ele emitir um parecer psiquiátrico póstumo, com base no período
em que o paciente esteve sob seus cuidados? A
resposta do CREMESP foi elaborada pelo Conselheiro Dr. Renato Françoso Filho e pelo
Dr. Mário Jorge Tsuchiya, Membro da Câmara Técnica de Medicina do Trabalho do
Conselho. Os Relatores dividiram sua manifestação em duas partes. Inicialmente,
esclareceram conceitos relativos à confecção de uma Parecer Médico-Legal.
Depois, manifestaram-se sobre a realização de um Laudo Pericial, por meio de
uma perícia indireta. Desse modo, os Relatores abarcaram as duas possibilidades
que um médico psiquiatra possui para realizar um documento póstumo a respeito
de um indivíduo. No que tange ao Parecer Médico-Legal, os Relatores esclareceram
que se trata de uma resposta a uma consulta médico-legal formulada por
autoridade, comissão ou qualquer interessado em esclarecimento de fatos de
interesse legal. O objeto de um Parecer Médico-Legal pode ser desde uma “simples
dúvida técnica, análise de um laudo pericial, análise de perícias
contraditórias, análise de documentos e/ou condutas médicas, ou consulta de um
advogado da parte de um processo, ou até mesmo uma consulta prévia a uma ação e
etc”. Trata-se, assim, de um “documento de cunho particular que não requer
formalidade ou compromisso legal e seu valor depende do renome e da moral do
profissional que o emite”. Em determinadas situações, como no caso da presente
consulta feita ao CREMESP, a saber, avaliação psiquiátrica póstuma, o fato de interesse
somente pode ser esclarecido por meios indiretos, isto é, análise de atos
praticados à época e registros em documentos médicos, como ficha de
atendimentos e do prontuário do paciente. Na caso da elaboração de um Laudo Pericial em situação
póstuma, a avaliação ocorre por meio da realização de uma Perícia Indireta.
Assim, “o fato a ser esclarecido é pregresso e somente poderá ser esclarecido
através das documentações existentes sobre o fato, oitivas de testemunhas etc.”.
Desse modo, o caso “somente pode ser analisado através dos documentos médicos e
prontuários relativos ao ato profissional praticado”. Os Relatores inclusive ampliaram na sua resposta, dizendo
que, “em síntese, em qualquer especialidade médica, e não somente na
Psiquiatria, caracterizando-se uma situação de Perícia Indireta ou necessidade
um Parecer Médico-Legal sobre fatos pregressos, estes serão fundamentados em
uma análise de documentos contemporâneos ao fato a ser técnica e
cientificamente esclarecidos”. No ano de 2012, por meio de resposta elaborada à Consulta no.
150.138/10, o CREMESP também se manifestou sobre a realização de Perícia Indireta em
caso de falecimento do investigado.
Segue o texto da manifestação do Conselho: “realizada nos casos em que a
vítima… falece, situação esta devidamente comprovada, no curso da demanda ou
solicitação administrativa ou já era falecida quando da propositura da ação...
Em situações como essa, em que o exame clínico e eventuais exames
complementares, por razões óbvias, se mostram impossível, a prova pericial
médica há de ser realizada com base exclusivamente nos documentos médicos do
falecido acostados ao processo, bem como nas informações relativas ao seu
histórico familiar e ocupacional; daí a denominação de perícia médica
indireta”. Fato que surge quando da realização
de Perícia Indireta é a dúvida sobre possível descumprimento de normas
ético-deontológicas da profissão. Isso, pois o Artigo 92 do Código de Ética
Médica afirma ser vedado ao médico assinar laudos periciais, auditoriais ou de
verificação médico-legal, quando não tenha realizado pessoalmente o exame
(conforme retificação do Código de Ética Médica contida no DOU de 13-10-2009).
No entanto, o Parecer de 2012 do CREMESP descarta essa possibilidade de
infração ética, relatando “que tal procedimento não afronta o Art. 92 do Código
de Ética Médica..., já que na perícia médica indireta, o exame clínico e
eventuais exames complementares inexistem, e a prova pericial médica há de ser
realizada com base exclusivamente nos documentos médicos do falecido, sendo que
tal situação deve ser referida no laudo que deve ser assinado pelo próprio
médico que procedeu a análise documental na presença dos interessados,
legalmente habilitados”.
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