Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Julho de 2016 - Vol.21 - Nº 07 História da Psiquiatria NOTAS SOBRE O ENSINO DA PSIQUIATRIA NO BRASIL Walmor J. Piccinini Com a fundação da Associação Brasileira de
Psiquiatria em 1966 ampliou-se o grande debate nacional sobre a formação dos
psiquiatras. Na primeira metade do século XX não havia cursos que propiciassem
uma formação adequada a quem pretendesse exercer a nobre profissão de
psiquiatra. Os interessados estagiavam
nos grandes hospitais onde recebiam orientação de psiquiatras autodidatas e com
o envolvimento gradativo nas questões de atendimento terminavam por se tornar psiquiatras. Muitos se tornaram excelentes profissionais e formaram outros psiquiatras.
Os mais destacados como Antonio Carlos Pacheco e Silva de São Paulo e Jacintho Gomes do
Rio Grande do Sul estagiaram na França no Serviço do Professor Pierre Marie. O
mais notável dos Psiquiatras do início do século, Juliano Moreira, estagiou em
serviços da Alemanha. Antes de examinar o Ensino em si, vamos dar
uma ideia de como se estruturou a psiquiatria em
termos oficiais: Em 1934 o governo promulga decreto, com força de Lei,
modificando o nome do serviço de assistência a Psicopatas
para o de “Assistência aos doentes Mentais e Profilaxia Mental”, ao mesmo tempo
modifica a legislação reguladora da assistência aos doentes, estabelecendo
precipuamente seus fins. Em 1937
amplia a ação deste serviço e passa a denominá-lo “Divisão de Assistência
Nacional e Saúde Pública”. Em 1941 com
a reorganização do Departamento Nacional de Saúde Pública, o governo transforma
a divisão de assistência aos doentes Mentais em “Serviço Nacional de Doenças
Mentais” com as seguintes atribuições: •
Cumprir a Lei de 1934. •
Prestação de assistência através de órgãos próprios diretamente
subordinados ao Serviço (hospitais, departamentos de consultas externos,
higiene mental etc.) •
Assistência aos serviços estaduais e municipais, prestando-lhes
auxílio técnico, material e financeiro. O SNDM
estimulou a construção de hospitais pelo país e organizou os primeiros cursos
de especialização. Médicos oriundos de várias partes do país vinham ao Rio de
Janeiro os para cursos e
após três meses eram certificados como psiquiatras. No Rio Grande do Sul
em 1938 foi realizado o primeiro concurso para psiquiatra do Hospital
Psiquiátrico São Pedro. Os quatro aprovados foram Luiz Ciula,
Mário Martins, Cyro Martins e Victor de Brito Velho. O Sistema de Residência Médica em
Psiquiatria começou no Hospital do Ipase em 1948. Depois em 1951 no Hospital de Clínicas da
USP e o terceiro em 1960 na Clínica Pinel de Porto Alegre. O termo Residente,
antigamente, tinha outra conotação. Por ex. O Dr. Mário Martins foi “residente”
no Sanatório São José de Porto Alegre, era residente mesmo, pois sendo muito
pobre pediu para o Dr. Jacintho Gomes alojamento no
hospital onde residiu por alguns anos. Quando
recebi meu diploma de médico eu já fazia plantões em vários hospitais e recebi
convites para permanecer no corpo clínico. Tentei explicar que iria fazer
Residência e um dos diretores, abriu um sorriso e me disse ;-se
teu problema é residência, temos a casa do administrador que será sua.
Francisco Franco da Rocha residia no Hospital do Juqueri
e lá criou seus filhos. No seu
livro "Organização da Psiquiatria no Brasil", o ex-professor
catedrático da Unifesp, Darcy de Mendonça Uchôa dedica 4 páginas para o Ensino da Psiquiatria. Nele
faz referência ao lugar modesto da psiquiatria no currículo do estudante de
medicina. Ela era ensinada no sexto ano com aulas magistrais e pouca prática.
Na Medicina da URGS havia um estágio de quinze dias em que os futuros médicos
"visitavam" o hospício e de lá saiam horrorizados. "À
medida que se ampliava e se aprofundava o pensamento psiquiátrico surgiram duas
áreas fundamentais: o ensino da psiquiatria visando a preparar o estudante de
medicina, que se tornará clínico geral ou especialista em qualquer outro ramo
médico e aquele destinado a formar um especialista em psiquiatria". Dentro
desta perspectiva foi incluída no curso básico a cadeira de Psicologia Médica.
Era a influência de psicanalistas professores: Eustachio
Pereira Nunes no Rio de Janeiro, Hernan Davanzo em Ribeirão Preto, Paulo Guedes no Rio Grande do
Sul e Darcy de mendonça Uchôa em São Paulo. Era a época de uro
da medicina psicossomática. Ainda, segundo Uchôa,
" A inclusão da Psicologia médica nos currículos representou, a nosso ver,
importante contribuição para o aprimoramento do ensino na área psicológico-clínica e psiquiátrica, porém, de forma alguma
suficiente para a formação do psiquiatra especialista." Os psiquiatras continuaram a serem formados
sob orientação de grandes figuras autodidatas da psiquiatria. A psiquiatria poderia
ser considerada artesanal tanto na assistência como no ensino. Com a chegada dos psicanalistas a psiquiatria
que não dispunha de tratamentos eficazes, foi enriquecida pela abordagem
psicodinâmica e, o mais importante, na minha visão, atraiu um grande número de
jovens médicos entusiasmados com a nova perspectiva de tratamento. No Congresso
da SPBNM de 1967 o tema dominante foi a Influência da psicanálise no Hospital
Psiquiátrico. Começara a surgir novos temas na psiquiatria tradicional, ela saia dos
macro-hospitais e ia para a comunidade. Hospitais-abertos, comunidade
terapêutica, grupoterapia, socioterapia,
ambulatórios, hospital-dia, hospital-noite, lazer para os doentes. Ainda
segundo Uchôa a psiquiatria passou a ser mais médico psicológica e menos repressora e custodial. Foi dentro
desta efervescência transformadora que foi fundada a Associação Brasileira de
Psiquiatria. Muito mais do que uma associação classista, a ABP tornou-se a
grande incentivadora do ensino e pesquisa em psiquiatria. De início com
congressos modestos, mas sempre preocupada com o ensino, tornou-se o grande
território da educação em psiquiatria. Difundindo conhecimento, de início com
um programa de aulas gravadas em cassetes, até o atual Plano de Educação
Continuada online e presencial. Suas Revistas cresceram e hoje são expressões
da ciência nacional. A formação
de bons profissionais em medicina psiquiátrica requer uma boa formação pessoal,
boa formação médica e educação continuada. A
Associação Mundial de Psiquiatria fez algumas recomendações para o bom ensino
da psiquiatria: 1) Duração mínima de três anos, considerando-se, porém, a
possibilidade de maior duração em instituições com estrutura capacitada para
tal; 2) Currículo flexível para adaptar-se às novas
circunstâncias que surgem diariamente, considerando também as diferenças
regionais de cada escola médica ou serviço; 3) Estágio em neurologia 4) Conteúdo programático diversificado, incluindo
neurociências, psicopatologia, filosofia, teorias psicodinâmicas,
psicofarmacologia, discussões de artigos científicos e bases teóricas da
psiquiatria clínica; 5) Estágio psiquiátrico em todos os níveis de atendimento -
ambulatorial, enfermaria, reabilitação, hospital-dia e comunitário; 6) Obrigatoriedade do ensino de psiquiatria infantil,
geriátrica e forense, de interconsultas e álcool e
drogas; 7) Ensino teórico e prático de psicoterapia, possibilitando
o contato do residente com linhas terapêuticas diversificadas, incluindo
abordagens individual, conjugal, familiar e em grupo; 8) Carga horária reservada para áreas optativas, permitindo
ao residente realizar intercâmbios, aprofundar-se em alguma área de interesse
ou iniciar atividade de pesquisa; Vários departamentos de psiquiatria colocam
seu histórico na Internet. escolhi o mais tradicional
e antigo para ilustrar este texto. Histórico do
Departamento Departamento de Psiquiatria e Medicina
Legal Em fins do século XIX, nasce a
cátedra de Psiquiatria e, também, sob sua responsabilidade, a primeira unidade
de assistência ao doente mental universitária. Em 1883, o Professor João Carlos
Teixeira Brandão foi aprovado em concurso para provimento da primeira cátedra
de Psiquiatria de nossa Faculdade de Medicina. Até então, os temas
psiquiátricos eram tratados em Clínica Geral, pois não existia a disciplina de
Psiquiatria. Em 1893, foi criado o Pavilhão de Observações do Hospício como um
setor demarcado do Hospício Pedro II ficando sob a direção do catedrático de
Psiquiatria. Até 1852, quando da inauguração do Hospício Pedro II -
posteriormente denominado Hospital Nacional dos Alienados - os doentes mentais
eram assistidos no Hospital Geral da Santa Casa da Misericórdia. Em 1938, o Instituto de Psicopatologia e
Assistência a Psicopatas foi transferido para a Universidade transformando-se
no Instituto de Psiquiatria da Universidade do Brasil - IPUB - que,
atualmente, é Centro de Excelência em Saúde Mental do SUS-RJ e Centro
Colaborador em Saúde Mental para Ensino, Pesquisa e Treinamento em Serviço da
Organização Mundial de Saúde - OMS. Em 1968, surge o Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal
cujas atividades sempre foram integradas ao trabalho de pesquisa, assistência e
ensino realizado no Instituto de Psiquiatria. O Departamento tinha, então, à
frente o Professor José Leme Lopes, catedrático de Psiquiatria e, como
Professores Regentes de Psicologia Médica e Medicina Legal, os Docentes Eustachio Portella Nunes e Thales de Oliveira Dias,
respectivamente. Em 1978, inaugurado o Hospital Universitário
Clementino Fraga Filho, alguns professores do Departamento de Psiquiatria e
Medicina Legal assumem o Serviço de Psicologia Médica e Saúde Mental, cujas
atividades estão integradas ao ensino de Psicologia Médica. A necessidade de uma orientação aos interessados no
TEP (Título de Especialista em Psiquiatria) criou uma grande tarefa para a abp que é a de orientar os Cursos de Pós-graduação
e Residência em psiquiatria. Para tal, uma equipe de professores de psiquaitria, reunidos pela abp,
criou normas para o bom desenvolvimento do aprendizado. Veremos no próximo
número da polbr.
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