Psyquiatry online Brazil
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Volume 22 - Novembro de 2017
Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello

 

Julho de 2015 - Vol.20 - Nº 7

História da Psiquiatria

“ASSIM É SE LHE PARECE”

Walmor J.Piccinini

Vivemos num mundo de imagens e mensagens diretas ou subliminares. Nem sempre o que vemos é o que está sendo mostrado: muitas vezes, só vemos o que nosso interesse determina. Lembro com muito gosto uma frase de Pirandello “Assim é se lhe parece”.   Isso posto, vamos ao que interessa.

As Barbas do Imperador (Lílian Moritz Schwarcz, São Paulo, Cia das Letras, 1998), nos introduz de forma agradável e inteligente no interior da vida social do império e, principalmente, desvenda aspectos pouco comuns da vida do nosso Imperador D. Pedro II, o qual foi coroado Imperador do Brasil aos 14 anos de idade. Essa introdução pode dar a entender que vamos examinar questões fundamentais da História do Brasil, longe disso, serve apenas para que pesquemos um aspecto repetitivo da vida nacional, a questão da imagem. Como bem demonstra a autora, através de inúmeros quadros pictóricos do nosso jovem imperador, sua imagem era sempre apresentada como de alguém mais maduro, mais velho. Para a nação era transmitida, não a imagem de um menino imberbe e sim a de um jovem maduro que seria brindado com uma barba precoce o que lhe conferia mais idade do que a real.  Se a imagem de D.Pedro II foi vendida ao Brasil dessa forma, ele por sua vez foi enganado por uma pintura,  a da futura imperatriz Teresa Cristina, que lhe foi apresentada através de uma imagem pictórica muito favorável. A realidade se mostrou bem outra, quando D.Pedro II a encontrou levou um susto, era baixinha, gorducha e manca. Nosso Imperador, vencido o susto, desempenhou suas funções maritais com galhardia e com ela teve varias filhas, infelizmente os filhos homens não sobreviveram.

Passaram-se os anos e nos deparamos com o mesmo fenômeno quando encaramos notícias de Brasília. Se, no império, as imagens eram elaboradas por longas horas de poses diante de um pintor, agora elas são imediatas, o dia a dia é programado para aparecer na mídia. Vocês já repararam nos ternos e gravatas dos nossos políticos? São produzidos pelos melhores alfaiates, planejados para dar uma impressão positiva no vídeo. Fico imaginando que boa parte do dia eles passam planejando aqueles 30 segundos diante das câmeras. Aparecer no Jornal Nacional é o sonho e glória de todos. Vivemos a ditadura da imagem. Na clínica, o que nos é transmitido pela linguagem corporal, saber “ler” a imagem, é fundamental.  Todas as tentativas de psicanálise on-line esbarram na dificuldade de leitura corporal. As câmeras individuais podem amenizar essa dificuldade, mas ela persiste. O tratamento feito com pessoas que já mantinham um contato prévio transcorre com muito mais facilidade. Nem sempre a presença física é suficiente para se descobrir o que, realmente está se passando na cabeça de um paciente. Certa ocasião chefiava uma unidade psiquiátrica em que muitos pacientes saiam para sessões analíticas com seus terapeutas. Um determinado paciente, devido ao risco de suicídio, saia acompanhado por um AT. O consultório, do seu analista, estava situado no oitavo andar de um prédio no centro da cidade. Contou-me o AT que, subitamente, o paciente jogou-se pela janela. Num reflexo de muita sorte o acompanhante conseguiu segurá-lo pelas pernas e lá ficou os dois num movimento pendular, cai não cai. Frustrado no seu intento, o paciente arranhou as mãos no concreto externo, no esforço de atingir seu objetivo. Retirado da janela, o AT esperou o analista abrir a porta e tentou lhe contar o ocorrido. Não lhe foi permitido abrir a boca. Terminada a sessão, retornaram ao hospital e o AT contou-me o que acontecera. Entrei em contato com o analista e informei-o que o paciente não iria mais ao seu consultório e que, se quisesse continuar o tratamento deveria vir ao hospital. Diante do fato ele se dispôs a ouvir meus argumentos. Contei-lhe o ocorrido e ele me disse assustado. Ah! Então foi por isso que meu divã apareceu todo sujo de sangue.  Obviamente não houve uma leitura corporal. Não preciso lembrar que a investigação das reais motivações da pessoa é muito difícil.  Esse, afinal, é o grande trabalho analítico, descobrir o que realmente a pessoa quer nos dizer e que esconde de si mesma com grande habilidade.

A proteção da figura de D.Pedro II foi fundamental na consolidação da unidade brasileira. Os atuais políticos brasileiros vivem em função da próxima eleição, suas mensagens são sempre com esse objetivo. Nosso trabalho terapêutico tem que estar sempre alerta para as aparências.


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