Psyquiatry online Brazil
polbr
Volume 22 - Novembro de 2017
Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello

Maio de 2015 - Vol.20 - Nº 5

Psiquiatria na Prática Médica

DELIRIUM

Prof. Dra. Márcia Gonçalves*


É uma síndrome cerebral de origem orgânica, cujo sintoma fundamental consiste de um comprometimento da consciência, geralmente em associação com comprometimentos globais das funções cognitivas, que ocorre de forma aguda, com curso breve e flutuante (e melhora rápida) quando a causa é eliminada.

Tem como características os distúrbios da consciência: redução da clareza da consciência quanto ao ambiente, com diminuição da capacidade de focar, mudar ou manter a atenção; os distúrbios da percepção: Desorientação quanto ao tempo e espaço, porém raramente ocorre perda do reconhecimento de si. Há a tendência de confundir o novo com o familiar, por exemplo, o quarto do hospital com o próprio quarto. Ilusões, ou seja, erro de interpretação de estímulos sensoriais, por exemplo, a cortina balançando pode ser confundida com um ladrão. Alucinações, ou seja, percepções sem estímulo sensório relevante (desde simples formas geométricas até padrões visuais e sonoros complexos); os distúrbios do pensamento: A capacidade para registrar, reter e evocar informações pode estar afetada, bem como a capacidade de aprender; os distúrbios do humor: Anormalidades na regulação do humor, como raiva, irritação e medo infundados, bem como apatia, depressão e euforia; distúrbios da atividade psicomotora: asterixia, que é a incapacidade para manter uma postura fixa. Sendo bilateral é quase patognomônico ;tremor, falta de coordenação, incontinência urinária. Disfunção autonômica

Diagnóstico diferencial:
 

delirium

Demência

Início súbito

Início insidioso

Flutuação das alterações cognitivas

Alterações cognitivas estáveis

Potencialmente reversível

Irreversível

Urgência médica

Não urgente

 
 

delirium

esquizofrenia

Distúrbios no ciclo sono/despertar

Usualmente não

Alterações no nível da consciência

Sem alterações

O desconhecido como conhecido

O conhecido como desconhecido

Generalização

Personalização

 

Causas: pode resultar de quase tudo que afete o metabolismo do cérebro:

  • Causas intracraniais (epilepsia, trauma, infecções, etc.)

  • Causas extracraniais (ingestão de drogas ou abstinência, envenenamento, sedativos, tranqüilizantes, disfunção endócrina, doenças de órgãos, etc.)

Delirium é um quadro considerado emergência e ao mesmo tempo é o distúrbio psiquiátrico mais comum em pacientes idosos hospitalizados. Basicamente , o delirium é secundário a doença física grave, intoxicação medicamentosa e abstinência a hipnossedativos, álcool ou outra droga de abuso.

O início é súbito subitamente, tem curso flutuante e se manifesta por comprometimento global das funções cognitivas, distúrbio da atenção e do ciclo sono-vigília e atividade psicomotora anormalmente elevada ou reduzida.

Delirium pode ser a única manifestação clínica conseqüente a infarto agudo do miocárdio, pneumonia, septicemia, distúrbios metabólicos e hidroeletrolíticos em idosos hospitalizados. O seu pronto reconhecimento conduz à imediata investigação, no sentido de se identificar precocemente a causa básica, salvando vidas. De outra forma, tempo precioso pode ser desperdiçado, com pesado ônus nas taxas de morbimortalidade, nos custos hospitalares ou na demanda e utilização de serviços médicos e de enfermagem.

No idoso, o delirium se apresenta com sonolência, hipoatividade motora , torpor, As pessoas da família perceberem as primeiras alterações do estado mental do paciente.

De acordo com a versão mais recente do Manual Estatístico e Diagnóstico da Associação Psiquiátrica Americana (DSM-IV), para o diagnóstico de delirium requer-se a presença de quatro características fundamentais (Tabela). As três primeiras características definem a síndrome de delirium e a quarta, sua provável etiologia: doença física, toxicidade medicamentosa, abstinência, múltiplas etiologias e, no caso de não se poder atribuir a nenhuma causa, sem outra especificação (SOE).

Tabela – Critérios diagnósticos para delirium devido a doença clínica

A. Distúrbio da consciência (isso é, diminuição da percepção do ambiente) com diminuição na capacidade para focalizar, manter ou mudar a atenção.

B. Uma alteração na cognição (tal como uma deficiência de memória, desorientação, ou distúrbio de linguagem) ou o desenvolvimento de um distúrbio da percepção que não possa ser atribuído a uma demência preexistente, estabelecida ou em evolução.

C. O distúrbio desenvolve-se em curto espaço de tempo (usualmente horas a dias) e tende a flutuar durante o curso do dia.

D. Há evidência na história, exame físico ou exames laboratoriais de que o distúrbio seja causado pelas conseqüências fisiológicas diretas de uma condição clínica geral qualquer.

Fonte: American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fourth Edition, 1994.

O Delirium por Intoxicação com Substância pode ocorrer com as seguintes substâncias:

álcool

opióides

anfetaminas e relacionadas

fenciclidina e relacionadas

canabinóides

sedativos

cocaína

hipnóticos e ansiolíticos

alucinógenos

outras substâncias inalantes


O Delirium por Abstinência de Substância pode ocorrer com as seguintes substâncias:

Álcool (Delirium Tremens)

anfetaminas e relacionadas

sedativos

hipnóticos e ansiolíticos

outras substâncias


Os medicamentos que podem causar o Delirium são os seguintes:

anestésicos

cardiovasculares

analgésicos

antimicrobianos

antiasmáticos

antiparkinsonianos

anticonvulsivantes

corticosteróides

anti-histamínicos

relaxantes musculares

anti-hipertensivos

anticolinérgicos (in.psicotrópicos)



Toxinas que causam Delirium incluem:

anticolinesterase

dióxido de carbono

organofosforados

substâncias voláteis

monóxido de carbono

combustíveis ou tintas




A primeira característica do delirium é o distúrbio da consciência, que envolve alteração do nível de percepção do ambiente e redução da capacidade para concentrar, manter ou mudar a atenção. O paciente idoso usualmente se mostrará desatento, letárgico, sonolento, torporoso, incapaz de obedecer a ordens complexas ou manter raciocínio seqüenciado, distraindo-se com muita facilidade. Raramente o idoso com delirium apresenta-se hiperativo, agitado ou agressivo, exceto no delirium por abstinência ao álcool, benzodiazepínicos ou antidepressivos tricíclicos. A segunda característica do delirium é a presença de distúrbios cognitivos A terceira característica do delirium é a sua instalação aguda e seu curso flutuante. A quarta característica do delirium é a presença de uma ou mais doenças clínicas ou de toxicidade medicamentosa.

.O curso do delirium é variável e dependente de diversos fatores. A gravidade e a importância da causa determinante, as condições de saúde, a idade e o estado mental prévio do paciente em questão são decisivos para o curso e prognóstico do delirium.

Complicações decorrentes da hospitalização, como escaras de decúbito, quedas, infecções, incontinência urinária e má nutrição são mais freqüentes nos pacientes que desenvolvem delirium. Os efeitos cognitivos do delirium desaparecem lentamente ou se perpetuam. Em alguns pacientes, após a resolução do delirium, a demência se torna evidente; discute-se se a demência estava ou não presente antes da instalação do delirium ou presente sem ter sido reconhecida. Em alguns pacientes, o insulto desencadeador do delirium é relativamente leve, deixando a impressão de que delirium seja um identificador de redução da reserva cerebral ou de demência previamente não diagnosticada ou compensada.

O tratamento do delirium é uma emergência médica cujo desfecho depende da causa, da saúde em geral do paciente e das chances e rapidez do tratamento. A abordagem inicial do paciente delirioso deve centrar-se no diagnóstico e tratamento de qualquer fator causal ou contribuinte e em medidas de apoio visando as funções vitais do paciente.

    Referências

  1. American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders. 4th ed. Washington (DC): American Psychiatric Association, 1994.

  2. Lipowski ZJ. Acute confusional states (Delirium) in the elderly. In: Albert ML, Knoefel JE, editors. Clinical Neurology of Aging. 2nd ed. New York: Oxford University Press, 1994:347-62.

  3. Caine ED, Grossman H, Lyness JM. Delirium, dementia, and amnestic and other cognitive disorders and mental disorders due to a general medical condition. In: KaplanHI, Sadock BJ, editors. Comprehensive textbook of psychiatry. 6th ed. Baltimore: William & Wilkins, 1995:705-44.

  4. Francis Jr J. Delirium. In: Duthie EH, editor. Practice of Geriatrics. 3rd ed. Philadelphia: W. B. Saunders Co., 1998:279-86.

  5. Organização Mundial da Saúde, coordenadora. Classificação de transtornos mentais e de comportamento da CID-10: Descrições clínicas e diretrizes diagnósticas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

  6. Arq. Neuro-Psiquiatr. v.59 n.2A São Paulo jun. 2001

  7. Kaplan, Harold I., Sadock, Benjamin J., Grebb, J.: Compêndio de Psiquiatria: Ciências do Comportamento e Psiquiatria Clínica. Porto Alegre, 9a edição, Ed. Artes Médicas.


  • Coordenadora da disciplina de psiquiatria e psicologia médica da Universidade de Taubaté – SP

[email protected]


TOP