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Volume 22 - Novembro de 2017
Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello

 

Junho de 2015 - Vol.20 - Nº 6

COLUNA PSIQUIATRIA CONTEMPORÂNEA

EVIDÊNCIA CONFIRMADA DE REPROGRAMAÇÃO EPIGENÉTICA EM HUMANOS

Fernando Portela Câmara, Prof. Associado UFRJ


Pela primeira vez uma equipe de cientistas demonstrou como o estilo de vida de pais pode influenciar também a vida dos seus filhos e netos (Tang et al, 2015). Até agora havia evidências de que fatores ambientais tais como fumo, dieta e estresse contínuo podiam deixar marcas nos genes dos descendentes das primeira e segunda gerações. É bem conhecido o caso de filhas de mulheres holandesas que engravidaram durante um longo período de fome no final da 2ª Guerra Mundial, que tinham um risco dobrado de esquizofrenia (http://www.newscientist.com/article/mg20026804.100-famine-leaves-its-mark-on-fetal-dna.html). Camundongos criados nas mesmas condições tiveram duas gerações de descendentes com alta proporção de depressão e ansiedade, apesar de crescerem em ambiente saudável. Isto levou alguns geneticistas a questionarem se a informação genética presente nos espermatozoides e óvulos podia ser afetada pelo ambiente, violando a barreira de Weismann (separação entre as linhagens somáticas e germinativas).

Aos poucos foi se fortalecendo a hipótese que nossos genes podem ser afetados pelo ambiente em que vivemos através de mecanismos epigenéticos. Isto se daria pela ativação ou desativação de genes pela respectiva adição ou remoção de grupos metil, observação  já realizada em experimentos in vitro com  animais. Esses radicais ligando-se a uma base nitrogenada impede o encaixe da enzima nesse ponto do DNA e, consequentemente, da leitura das instruções genéticas iniciadas a partir daí. Isto era negado até recentemente, pois admitia-se que durante a formação dos gametas o genoma passa por uma processo de limpeza, sofrendo reparos e remoção de bases errôneas e radicais.

A equipe de Azim Surani (Cambridge University) demonstrou pela primeira vez que alguns genes escapam desse mecanismo de limpeza, que excluiria grupos metila do DNA durante o desenvolvimento. Ficou estabelecido que 2 a 5% da metilação do genoma escapam a esta reprogramação, mas ainda assim pode impactar as futuras gerações de filhos e netos embora em menor grau. Há somente uma pequena janela de oportunidade por onde alguns desses genes marcados podem passar, e estes seriam mais frequentemente aqueles implicados em transtornos mentais tais como esquizofrenias e transtorno bipolar, bem  como genes implicados em distúrbios metabólicos e obesidade.

Tang WWC, Dietmann S, Irie N et al. A Unique Gene Regulatory Network Resets

the Human Germline Epigenome for Development, Cell 2015; 161: 1453-67.


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