Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Giovanni Torello |
Dezembro de 2011 - Vol.16 - Nº 12 France - Brasil- Psy Coordenação: Docteur Eliezer DE HOLLANDA CORDEIRO Quem somos (qui
sommes-nous?)
France-Brasil-PSY é o novo espaço virtual de “psychiatry on
line”oferto aos profissionais do setor da saúde mental de expressão
lusófona e portuguesa.Assim, os leitores poderão doravante nela encontrar
traduções e artigos em francês e em português abrangendo a psiquiatria, a
psicologia e a psicanálise. Sem esquecer as rubricas habituais : reuniões
e colóquios, livros recentes, lista de revistas e de associações, seleção de
sites. Qui sommes- nous ? France-Brasil-PSY est le nouvel espace virtuel de “psychiatry on
line”offert aux professionnels du secteur de la santé mentale d’expression
lusophone et française. Ainsi, les lecteurs pourront désormais y trouver des
traductions et des articles en français et en portugais concernant la
psychiatrie, la psychologie et la psychanalyse. Sans oublier les rubriques
habituelles : réunions et colloques, livres récentes, liste de revues et
d’associations, sélection de sites
1) MOMENTOS DIFICEIS PARA A PSICANÁLISE ? Mauvaise passe pour la psychanalyse ? Catherine Halpern, revista Télérama,n° 3217, 12 de Setembro de 2011 Tradução e resenha : Eliezer de Hollanda Cordeiro
Advertência: O artigo de Catherine Halpern que agora publicamos, vem a propósito para questionarmos a psicanálise. O artigo é claro, muito bem escrito e aborda de tal maneira as dificuldades da psicanálise na França que sua leitura pode ser extrapolada ao Brasil. E mesmo ao mundo inteiro: o questionamento sobre o valor das teorias e da eficiência terapêutica da disciplina inventada pos Sigmund Freud não se tornou universal ? Então, porque advertir os leitores? É que o artigo aborda a questão como se na França só existisse a psicanálise lacaniana. Assim, nenhuma referência é feita às outras sociedades de psicanálise existentes no país, não lacanianas, como a Société Psychanalytique de Paris e a Association Psychanalytique de France. É que os analistas destas sociedades envolvem-se muito pouco com política, mostram-se discretos, não ocupam espaços de influência nas midias, detestam polemicar e preferem trabalhar no anonimato de seus gabinetes. PRIMEIRA PARTE Há trinta anos, no dia 9 de Setembro de 1981, morreu o psicanalista Jacques Lacan. O aniversário de sua morte, que deveria ser a priori muito pouco comentado nesta época de ostentação midiática, foi marcado pela publicação de vários livros importantes, entre os quais um novo ‘’Seminário’’ de Lacan e o livro inteligente, facilmente compreensivel e tocante de Elisabeth Roudinesco : ‘’Lacan, envers et contre tout.’’ Em trinta anos, os tempos mudaram muito : o mestre não foi substituido, a psicanálise sofreu ataques violentos, a sociedade se mercantilizou, se metamorfoseou. Resultado: o estatuto da psicanálise, sua influência sobre a cultura e o pensamento contemporâneos foram profundamente abalados. Mas, como dizia Freud, o mal estar continua existindo na nossa civilização. Nas décadas de 1960 e de 1970, a psicanálise tinha muito sucesso: Lacan era um ídolo, Françoise Dolto participava de um programa de rádio que se tornou um acontecimento.E, se todo o mundo não se estendia no divã, a psicanálise reinava na midia e na vida intelectual. Um Lacan genial e excluido(da International Psychoanalytical Association), sozinho, aprofundou a disciplina, mobilizando ao mesmo tempo a filosofia, a linguística e a topologia. A psicanálise dialogava com figuras fascinantes como Claude Lévi-Strauss ou Michel Foucault. Médicos brilhantes ou filósofos formados em humanidades reconheciam os psicanalistas como fazendo parte da elite intelectual do país. Esta época áurea desapareceu. Antes, aconselhávamos a psicanálise quando queríamos ajudar almas atormentadas. Hoje, não se conta o número de pretendentes querendo tomar o lugar dela, especialmente as terapias cognitivas e comportamentais (TCC), cuja visão da cura é bem diferente: se as análises são longas, as TCC são curtas; se o analista fala muito pouco e mostra-se bastante distante, o terapeuta que pratica a TCC discute com o paciente, precreve-lhe exercícios, planeja com ele experiências e trabalhos práticos. E A GUERRA CONTINUA Para essas novas terapias, o mais importante é fazer com que os sintomas mais incômodos desapareçam. É exatamente o que a psicanalista e filósofa Clotilde Leguil critica : « Esvazia-se assim a verdade que os sintomas podem representar para o sujeito. A fobia, por exemplo, não será inscrita numa história singular, mas considerada como um distúrbio a erradicar por meio da reeducação dos pacientes, até mesmo em grupo.» Tudo separa, na realidade, a psicanálise e as TCC. E, depois de alguns anos, as duas travaram uma luta impiedosa. Em 2004, os defensores das TCC lançaram uma campanha para desqualificar a psicanálise, apoiando-se numa compilação de trabalhos internacionais comparando a eficiência das terapias. Indignados, psicanalistas tomaram posição e o relatório foi enterrado. Mas a guerra continua, o objetivo dos defensores das « TCC » sendo o de banalizar a psicanálise e considerá-la como uma opção qualquer (até menos ‘’performante’’), no heteroclítico catálogo das psicoterapias existentes no mercado da saúde mental. . O TEMPO DAS POLÊMICAS Digamos de uma vez, não é fácil ser freudiano nos tempos atuais. Pierre-Henri Castel, psicanalista e diretor de pesquisas no CNRS, considera de maneira maliciosa que, ‘’ se os psicanalistas sempre tiveram uma propensão para mártires, atualmente eles o são de verdade ». De fato, a psicanálise foi alvo de críticas desde a sua invenção: sobre a ausência de fundamentos científicos, suas teorias sexuais (...) e estas críticas não desapareceram. Ao contrário, os ataques contra ela tornaram-se até mais violentos. No artigo ‘’L’autorité des psychanalystes’’, o antropólogo Samuel Lézé salientou uma verdadeira inversão : em menos de dez anos, o discurso crítico sobre a psicanálise foi suplantado por um discurso sobre a crise da psicanálise. Como prova as polêmicas provocadas pelo ‘’Le Livre noir de la psychanalyse ’’, compêndio feito por defensores das TCC, ou as polêmicas desencadeadas pelo panfleto do filósofo Michel Onfray , ‘’Le Crépuscule d'une idole, L'affabulation freudienne’’. O prestígio intelectual e social dos ‘’psis’’ teria se acabado ? Eles foram tratados ‘’de charlatões, suas teorias qualificadas de falsas e fantasiosas. Muito pior : eles prejudicariam seus pacientes.’’ REFERÊNCIAS : Catherine Halpern Télérama n° 3217 *Le Séminaire livre XIX ... ou pire, de Jacques Lacan, éd. du Seuil. *Je parle aux murs, de Jacques Lacan, éd.
du Seuil. *Clartés de tout, de Jean-Claude Milner, éd. Verdier. *De quoi la psychanalyse est-elle le nom ? de Roland Gori, éd. Denoël. *L'Autorité des psychanalystes, de Samuel Lézé, éd. PUF
2) DIVÓRCIO E SOFRIMENTO Referência: Serge Hefez, psiquiatra e psicanalista, chefe da unidade de terapia familiar no serviço de psiquiatria de crianças e adolescentes do grupo hospitalar da Pitié-Salpêtrière. Doutor Eliezer de Hollanda Cordeiro
Mesmo se o divórcio tornou-se muito banal na França, a separação judicial dos cônjuges se acompanha quase sempre de mágoa, dor e sofrimento. Quando encontram um advogado, as pessoas que solicitam um divórcio sentem-se perdidas, hesitam, esperam que as coisas possam se arranjar,ignorando tudo sobre os trâmites do processo.Uma senhora, por exemplo, pensando nos filhos e almejando protegê-los, disse a seu advogado “haver feito o possivel para que não houvesse nenhum problema durante o período judiciário.” Aliás, juizes e advogados pensam que é melhor assim, que os pais devem fazer o máximo pelos filhos, isto é encontrar um acordo mútuo e não defender pontos de vistas suscetiveis de desvalorizar e magoar o antigo partenário. Mas a realidade é bem diferente, se levarmos em conta as duas questões importantes que entram em jogo: o dinheiro e os filhos. Idealmente, em tais circunstâncias, o advogado deve tentar evacuar o ódio entres os pais para que a separação ocorra sem atritos excessivos, prejudiciáveis a todos. É preciso evitar que ‘’os filhos sejam utilizados por um dos genitores para causar sofrimento ao outro’’, disse Serge Hefez. É que nos casos de divórcio, a transformação do amor em ódio é muito comum. Antes de entrar com uma ação judicial de divórcio na França, os protagonistas podem contactar um serviço de mediação familiar, onde o papel do mediador é o de tentar apaziguar o conflito.‘’Professional neutro, independente e imparcial, ele ajuda os protagonistas do divórcio a encontrarem juntos uma resposta à situação.’’ Os medidadores tentam reconciliar os impetrantes, recebendo-os juntos ou separadamente, podendo até encontrar os filhos de menor idade para avaliar-lhes a capacidade de discernimento. CUSTO FINANCEIRO O divórcio, mesmo por mútuo consentimento, necessita obrigatoriamente a participação de um advogado. Seria possivel encontrar um bom advogado que não exigisse honorários excessivos? É que o procedimento judicial é tão complexo, longo e custoso que o problema financeiro pode se tornar primordial. Uma pessoa contou numa emissão radiofônica “que seu divórcio durou 7 anos e que os advogados davam-lhe a impressão de querer prolongar o procedimento judiciário por razões financeiras.” Serge Hefeld, na mesma emissão, acrescentou que ‘’os advogados podem até mesmo agravar, inconsciente ou deliberadamente, o conflito entre os pais.’’ Um homem que divorciou tres vezes, disse na emissão radiofônica que “ a questão do dinheiro sempre apareceu como muito mais importante do que a defeza dos filhos.’’ TERAPIA FAMILIAL Qunado há divórcio, uma terapia familial pode ser muto importante para ajudar os pais não somente ao longo do procedimento jurídico,mas também ‘’após o divórcio, quando eles e os filhos devem aprender a viverem separados e precisam se reestruturar’’, disse Serge Hefez. ‘’As crianças são às vezes utilizadas como reféns, como justificação, como máquina registradora de crédito, segundo os casos; elas tornam-se prisioneiras dum problema que ultrapassa suas capacidades de compreensão’’, acrescentou o autor já citado. Notemos que o trabalho do terapeuta da família tem pontos comuns com o trabalho do mediador. A diferença mais importante é que o terapeuta da família vai procurar esclarecer os fatores inconscientes em jogo, isto é as causas profundas dos conflitos do casal. O serviço de mediação e os serviços públicos de proteção da criança podem intervir antes do pedido de divórcio e encontrar soluções para os desacordos do casal, orientando-os, aconselhando-os, dando-lhes informações jurídicas proveitosas... Para Serge Hefez, o divórcio dos pais ‘’é sempre uma dolorosa provação para a criança, pelo menos no início. Mas esta provação nem sempre é destrutiva, ela pode até se tornar construtiva se o divórcio se desenrolar de maneira conveniente e se a criança se sentir em segurança e for bem acompanhada.’’ “Embora na adversidade, as crianças podem notar a importância que têm para os pais e compreenderem que as histórias de amor não são eternas, que o fim de uma história de amor não é uma catástrofe irremediável, e que é possível recomeçar a vida. Eles vão perceber que não são os pais que vão se separar mas o marido e a esposa que formavam o casal. Hoje, os antigos amantes deixaram de se amar o bastante para viverem juntos, mas eles permanecerão os pais que sempre cuidaram e cuidarão dos filhos.”
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