Volume 15 - 2010
Editor: Giovanni Torello

 

Maio de 2010 - Vol.15 - Nº 5

História da Psiquiatria

HISTÓRIA DA ASSOCIAÇÃO PSIQUIÁTRICA DA AMÉRICA LATINA (APAL)

Walmor J. Piccinini

O término da Segunda Guerra Mundial despertou um clima de busca de entendimento em diferentes setores da humanidade. A primeira entidade de grande repercussão mundial foi a Organização das Nações Unidas em São Francisco em 1945. Pouco depois, em 7 de abril de 1948 foi fundada a Organização Mundial da Saúde com sede em Genebra. Em 1950 realizou-se em Paris o Primeiro Congresso Internacional de Psiquiatria. Não existia uma entidade mundial de psiquiatras, existia uma Entidade formada para organizar Congressos Mundiais de Psiquiatria. Ela ainda organizou o segundo congresso em Zurich (1957) e o terceiro em Montreal em 1961. Durante a realização deste terceiro congresso nasceu a Associação Mundial de Psiquiatria.

Não é difícil imaginar as dificuldades e os custos para comparecer a um congresso como o de Paris. A representação latino-americana era pequena, mas reunia nomes expressivos de diferentes países, todos encantados por poder participar de um conclave, presidido pelo Professor Jean Delay e tendo Henri Ey como Secretário Geral. Brilhavam as estrelas da psiquiatria tradicional Meduna, Sakel, Cerletti, Ana Freud, Minkowski. Franz Alexander e muitos outros. A empolgação do momento talvez tenha impedido a compreensão que se estava assistindo ao fim de uma época. A psiquiatria deslocava seu eixo do asilo e macro-hospitais, para o ambiente clínico universitário. A Penicilina acabava com o flagelo da neurolúes. O tratamento pelo Cardiazol e pela insulina era abandonado e nos anos seguintes começava a era dos psicotrópicos.  Expandia-se a fronteira do conhecimento do funcionamento cerebral, o surgimento da medicação psicotrópica para o tratamento da doença mental, a melhor compreensão da influência dos fatores sócio-culturais para entender a doença e a mudança de atitude terapêutica dos psiquiatras. Numa análise da psiquiatria dos anos 60 eu já havia escrito: “Em 1950 realizou-se em Paris o que foi chamado o Primeiro Congresso Mundial de Psiquiatria e nas palavras entusiasmadas de Jean Delay seria o Congresso da Terapêutica. Nele houve animada sessão presidida pelo Professor A C. Pacheco e Silva do Brasil em que foram discutidos os novos métodos terapêuticos. Manfred Sakel discorreu sobre a insulinoterapia que foi descoberta em 1927, Von Meduna falou sobre o choque cardiazólico descoberto em 1929 e Hugo Cerletti falou sobre o Eletrochoque descoberto em 1938. O ambiente foi, digamos, eletrizante. Sackel era arrogante, autoritário, se julgava o inventor da terapia de choque e afirmava que os outros dois vieram a ele para receber orientação. Isso irritou Von Meduna que se recusou a cumprimentá-lo. Cerletti conquistou a todos por sua simplicidade e porque, estava sempre se desculpando por ter inventado o Eletrochoque que era muito menos assustador que o choque cardiazólico, mas ainda assim um tratamento bárbaro.

 

      Nesse congresso de Paris alguns psiquiatras latino-americanos começaram a examinar a idéia de se criar uma entidade própria. Destacavam-se os nomes de José A. Bustamante (Cuba), Raul Gonzáles Henriques (México). (Segundo Bustamante, em reunião paralela ao Congresso de Paris,  foi recusada a proposta do Professor Vallejo Nágeras de constituir uma organização ibero-americana, bem como da edição na Espanha de uma revista psiquiátrica).

No ano de 1951 foi realizado na Cidade do México uma Conferência Internacional de Saúde Mental e seguiram os debates em torno da criação de uma entidade latino-americana. Do Brasil foram 14 participantes, entre eles o Professor A.C. Pacheco e Silva de São Paulo e O Professor Henrique Roxo do Rio de Janeiro.

Nesse encontro no México foi fundado o Grupo Latino-americano de Estúdios Transculturales (GLADET). Este grupo organizaria investigações transculturais em que se reuniriam esforços de países com expressão da cultura ibero-africana (Brasil e Cuba) e os países com expressão da cultura indo-hispanica (México e Peru).

Junto com o GLADET, foi criada uma comissão formada por Raul Gonzáles Henríquez, Carlos Seguin e José A. Bustamante que teria por missão criar uma organização que incluísse todos os psiquiatras latino-americanos. Poucos meses depois, o Dr. Raul Gonzáles Henriques sofre trágico acidente num barco de pesquisas e morre tragicamente.

Carlos Seguin e José A. Bustamante seguiram trabalhando, mas de uma forma lenta, aproveitando os congressos. A eles se uniram Guillermo Dávila, Gregório Berman e Pacheco e Silva.

    Durante dez anos de encontros, debates e estabelecimento de regras de funcionamento foi fundada a APAL. Durante uma conferência no Hotel Habana Libre com o grupo já referido, Carlos A. Seguin, Dávila, Berman, Pacheco e Silva, Bustamante e Mata Gregório. Este último ficou encarregado de organizar o primeiro congresso da APAL em Caracas, na Venezuela.

Depois desse Primeiro Congresso em 1961, a APAL tem realizado encontros bianuais. A APAL nunca conseguiu ser uma força independente, seus congressos, geralmente eram atrelados aos congressos nacionais da especialidade. No Brasil, os dois congressos da APAL coincidiram com os congressos da associação psiquiátrica brasileira. O de 1970 foi histórico, aconteceu o primeiro congresso brasileiro de psiquiatria e o VI congresso da APAL.

José A. Bustamante, professor titular de psiquiatria de Cuba lamenta que os cubanos, mesmo tendo dedicado anos e muito esforço na criação da APAL foram impedidos de comparecer a congressos, durante muitos anos, devido a questão política.

O segundo congresso foi realizado no México e o Dr. Guillermo Dávila foi escolhido como presidente. Coube a Guillermo Dávila a iniciativa de fundar a Revista APAL. Essa revista não chegou a ter uma regularidade de impressão, em boa parte, segundo queixa de alguns editores, pela falta de colaboração de autores latino-americanos.

Para o Terceiro congresso Carlos A. Seguin foi eleito presidente e José A. Bustamante, como um desagravo foi eleito vice-presidente. Isso criou um grande problema, pois novamente os cubanos não receberam vistos para comparecer e, teóricamente, o próximo congresso deveria ser realizado em Cuba. Para evitar uma grave crise. Guillermo Dávila foi eleito presidente da assembléia e Gregório Berman seu vice. Com essa solução, o Congresso de 1966 foi realizado em Buenos Aires. Segundo Bustamante, este congresso permitiu atrair uma grande leva de sul-americanos para o IV Congresso Mundial de Psiquiatria em Madrid.

Em Bogotá foi realizada a quinta edição do Congresso da APAL. Seu presidente foi Humberto Rosselli. (De Rosselli tenho um artigo sobre  “Ventura e desventura de las Asociaciones Psiquiátricas, uma história de 50 anos”. Este artigo foi apresentado na Reunión Anual de La Sociedad Antioqueña de Psiquiatria. Medellín, 2 de marzo de 1985. Espero reproduzi-lo em outro artigo, por enquanto cito algumas linhas sobre a APAL: “Os avatares de La APAL a lo largo de muchos años  han sido difíciles. Há logrado reunir Congresos bianuales con magra representación de los interesados, publicar una Revista de escasa circulación. Generalmente los esfuerzos bianuales se limitam AL país sede Del evento internacional, sin mucha representación de los restantes. A mi entender hay varios defectos en la organización de la APAL: en primer lugar es una federación de instituciones nacionales, las instituciones nacionales que agrupa son débiles, están fragmentadas, sujetas a avatares políticos y a lucha fraticidas, pocas puedan presentar un modelo de integración y representación verdaderamente nacional. Una de las honrosas excepciones es la Sociedad Colombiana de Psiquiatria.”

No Congresso Mundial de Madrid começam as démarches para a criação de uma entidade que reunisse as organizações psiquiátricas americanas, nasce o CIAP (Consejo Interamericano de Asociaciones Psiquiátricas).

Esse Conselho reunia a Associação Americana de Psiquiatria, a Associação Canadense de Psiquiatria e a APAL. Essa entidade teve vida curta e um dos motivos foi político, preocupação com o capitalismo e a reunião de entidades muito desiguais em termos de número de associados e poderio econômico. O CIAP, com apoio da Associação Psiquiátrica Americana chegou a reunir-se numa memorável Conferência de Saúde mental das Américas em 1968, na cidade de San Antonio (Texas). Pouco tempo depois a APAL começou um processo de esfriamento do Conselho com o argumento que era instrumento do “imperialismo ianqui” e foi com muita dificuldade que se conseguiu realizar uma Segunda Conferencia Interamericana de Salud mental de Niños e Adolescentes no México em 1975. Depois disso, o trabalho do Conselho, inicialmente promissor quanto ao avanço da psiquiatria e a Saúde mental do Continente, começou a decair e, quando a APA e a Associação Canadense suspendeu a ajuda financeira ela terminou. A APAL nunca conseguiu cumprir sua parte de colaboração econômica. Foi o fim do CIAP.

 

 

 

Congresos (Lugar, Año y Presidente)

I - 1961 - Caracas, Venezuela, Presidente Dr. Jesús Mata De Gregório

II - 1962 – México.  Presidente Dr. Guillermo Dávila

III - 1964 - Lima, Peru, Dr. Carlos A. Seguín

IV - 1966 - Buenos Aires, Argentina, Presidente Dr. Gregório Berman

V - 1968 - Bogotá, Colômbia, Dr. Humberto Rosselli

VI - 1970 – São Paulo, Brasil Presidente Dr. Clovis Martins

VII - 1972 – Punta Del Este, Uruguay Dr. Daniel Murguia

VIII - 1975 – Acapulco, México Presidente Ramón de la Fuente Núñez

IX - 1977 - La Habana, Cuba Presidente Dr. José A. Bustamante

X - 1979 - Caracas, Venezuela, Presidente Dr. Mauro Villegas

XI - 1981 - Quito, Ecuador, Presidente Dr. Gustavo Matute

XII - 1983 – Porto Alegre, Brasil Presidente Dr. Manoel Antonio Albuquerque

XIII - 1985 - Sto. Domingo, R. Dominicana Dra. Fior Solís de Méndez

XIV - 1987 - Argentina Presidente Dr. Diego Block

XV - 1989 - Bogota, Colombia Presidente Dr. Horacio Taborda

XVI - 1992 - Caracas, Venezuela, Presidente Dr. Rubén Rendón Aponte

XVII - 1994 - México, Presidente Dr. Antonio Ruíz Taviel

XVIII - 1996 - Mar de Plata, Argentina, Presidente Dr. Roger Montenegro

XIX - 1998 - La Habana, Cuba, Presidente Dr. Eduardo Ordaz

XX - 2000 - Lima, Peru, Presidente Dr. Rafael Navarro

XXI - 2002 - Guatemala, Presidente Dr. Ismael Salazar

XXII e XXIII ……..

XXIV – 2006 – Santo Domingo. República Dominicana

XXV - 2008 – Isla Margarita - Venezuela

XXVI - 2010 – Puerto Vallarta, México, a ser realizado no período de 28 de outubro a 2 de novembro de 2010. Presidente Dra Martha Ontiveros Uribe.

A Revista da APAL tem uma história complicada desde sua fundação. Seu fundador foi Guillermo Dávila. Clóvis Martins conseguiu editar alguns números e hoje ela é vista apenas como uma apêndice em psiquiatria.com, jornal eletrônico espanhol. No período de 1984 a 1989 foi editada conjuntamente com a Revista da ABP. A Revista ABP-APAL cumpriu uma tarefa  histórica e manteve viva sua chama. Com o retorno ao nome de Revista Brasileira de Psiquiatria, foi desfeita a parceria com a APAL. Graças aos arquivos do Professor Manoel Antonio Albuquerque e de sua esposa a psiquiatra Iracema Campos de Albuquerque disponho de um patrimônio histórico que espero um dia poder doar para a APAL.

Uma grande iniciativa de integração latino-americana foi o livro editado por Guillermo Vidal da Universidade de Buenos Aires e Renato D. Alarcón da Universidade Caytano Heredia- Lima. Este livro foi editado pela Editora Médica Panamaericana AS. De Buenos Aires em 1986. Reúne colaboradores de toda a América Latina e considero documento de fundamental importância para retratar o pensamento dos psiquiatras sul-americanos


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