Volume 14 - 2009 Editores: Giovanni Torello e Walmor J. Piccinini |
Abril de 2009 - Vol.14 - Nº 4 História da Psiquiatria PRIMÓRDIOS DA PSIQUIATRIA NO CENTRO-OESTE DE MINAS GERAIS Nadja
Cristiane Lappann Botti O marco da constituição da Psiquiatria brasileira foi a criação do Hospício Pedro II, no Rio de Janeiro, inaugurado em 1852, com 140 pacientes (RESENDE, 2000). Minas Gerais, a partir de 1900, tinha a sua disposição 25 leitos no Hospício para internação. No período de 1852 a 1886 foram criadas instituições psiquiátricas em São Paulo, Pernambuco, Pará, Bahia, Rio Grande do Sul e Ceará (ODA & DALGALARRONDO, 2005). Minas Gerais foi o último dos grandes Estados brasileiros a construir um hospital psiquiátrico (RESENDE, 2000). Somente em 1900 foi proposta a criação da Assistência aos Alienados no Estado, sendo em 1903 o início das atividades do Hospital Colônia de Barbacena (MAGRO FILHO, 1992). Em Minas Gerais, entre 1900 e 1934, há sucessiva publicação de instrumentos legais alterando os nomes das instituições psiquiátricas e regulamentando o funcionamento (MORETZOMN, 1989). Em 1920, Arthur da Silva Bernardes, Presidente do Estado, afirma que o funcionamento do Asilo de Barbacena era antagônico aos princípios da Psiquiatria. Em 1922, Arthur Bernardes aprova o Decreto nº 6169 que regulamenta a Assistência aos Alienados visando melhora e descentralização dos serviços, estabelecendo a criação de novos asilos-colônias (MORETZOMN, 1989). Em 1927, Antonio Carlos Ribeiro de Andrada, Presidente do Estado, assina o Decreto nº 7556 criando o “Hospital Psychiatrico regional na cidade de Oliveira” (ALMEIDA, 1927). Após 10 meses da assinatura foi lançada a pedra fundamental do hospital com a presença de Djalma Pinheiro Chagas e convite solene ao “povo de Oliveira para assistir às solemnidades” (ALMEIDA, 1928). O Hospital Psiquiátrico de Oliveira teve sua origem no prédio do ex-sanatório de tuberculoso que o Estado adquiriu pelo Banco da República (MAGRO FILHO, 1992). Este sanatório foi construído por Carlos Ribeiro de Castro, especialista no tratamento da tuberculose e adquirido em 1927 pela quantia de 35:000$000 (ALMEIDA, 1927). Nos anos de 1928 e 1929 o prédio do sanatório foi reformado para se adaptar a função de hospício, “o prédio soffrerá diversas reformas para a sua adaptação ao fim que vae agora ser destinado, obras estas que serão atacadas brevemente, sob a competente direção do engenheiro desta circumscripção, dr. José Zuquim” (ALMEIDA, 1927). Djalma Pinheiro Chagas, idealizador do hospital e secretário da Agricultura, Indústria, Terras, Viação e Obras Públicas do Estado, designou a reforma do sanatório e a supervisão da construção a José Zuquim e Caio Líbano Soares, respectivamente. Carlos Pinheiro Chagas, irmão do referido Secretário, indicou Caio Líbano para supervisionar a adequação do hospital as exigências psiquiátricas da época (MORETZOMN, 1989). O hospital, “elegante e majestoso”, localizava-se no bairro São Sebastião, tinha construção sólida, ampla, arejada e com “sobriedade de linhas que muito condiz com os fins a que se destinava”. Em outubro de 1928, a etapa final da construção, foi comemorada com festa, foguetes e personagens ilustres, “pelas 17 horas mais ou menos, foi a quietude e a calma habitual da nossa cidade quebrada pelo espoucar de innumeros foguetes ... estava sendo levantada a ultima parte da cumieira do grande e magestoso edificio que servirá dentro em breve para nelle funcionar o Hospital Psychiatrico de Oliveira” (ALMEIDA, 1928). A inauguração do Hospital Psiquiátrico, em janeiro de 1931, teve a presença de comitiva de autoridades; “dr. Levindo Coelho, secretario da Educação e Saude Publica; dr. Djalma Pinheiro Chagas, ministro do Tribunal Especial; dr. Leopoldo Dias Maciel, representante do sr. presidente do Estado; dr. Eduardo Amaral, representante do sr. dr. Secretario da Agricultura; dr Carlos P. Chagas, director do Serviço de Industria Pastoril; dr. Mario Telles, chefe do serviço zootechinico do Ministerio da Agricultura; cel. Luiz Fonseca, da Força Publica do Estado; dr. Pedro Magalhães, chefe de linha da Estrada de Ferro Oeste de Minas; dr. Caio Líbano Noronha, director do Instituto Raul Soares, de B. Horizonte e ... innumeras pessoas do povo” (ALMEIDA, 1931). A inauguração contou com festa “espoucar de foguetes e aos sons festivos da musica, executada pela banda local. Terminada a cerimônia da inauguração foi em seguida offerecisa pela prefeitura as altas autoridades e demais pessoas um taça de champagne”. Também foi realizada missa pela comunidade para comemorar a inauguração e o fim da Revolução de 30. José Cezarini, diretor do hospital, fez discurso de inauguração: “proferindo um vibrante discurso, no qual não se sabia o que mais admirar, si a belleza da phrase ou a justeza dos conceitos emittidos” (ALMEIDA, 1931). A estrutura física do prédio apresentava-se em consonância com a ciência e o modelo de tratamento psiquiátrico na época: “o Hospital Neuro-Psychiatrico possue salas de operação bem instaladas, onde o distincto cirurgião poderá desempenhar os trabalhos concernentes à sua especialidade, com todo conforto, exigencias technicas e de asepsia” (ALMEIDA, 1930). O hospital foi inaugurado com moderno laboratório de análises clínicas e gabinetes de Raios X. O laboratório era dirigido pelo médico e químico alemão Von Ruthland que chegou ao Brasil após a primeira “Grande Guerra” (ALMEIDA, 1930); o gabinete de Raios X era dirigido pelo Major Albergaria, farmacêutico-radiologista do Hospital Militar de Belo Horizonte (MORETZOMN, 1989). Compondo o quadro de profissionais encontram-se “os illustres clinicos drs. Alberto de Andrada Machado e João Albino de Almeida, recentemente nomeados alienista e cirurgião do Hospital Neuropsychiatrico de Oliveira” (ALMEIDA, 1930). O hospital de tamanho médio, novo, bem construído e, para a época, bem equipado, passou a receber pacientes do sexo feminino, inidgentes, da região e também aqueles transferidos do Instituto Raul Soares (MORETZOMN, 1989). Caio Libano, responsável pela supervisão da construção do prédio, foi nomeado “para o cargo do director do Hospital Psychiatrico” pelo governo do Estado (ALMEIDA, 1930). Era reconhecido como “proficional competente e um cavalheeiro distincto... com innumeros predicados mores e intelectuaes” (ALMEIDA, 1930). Considerado uma das maiores expressões da Neuropsiquiatria de Minas Gerais, assumiu a regência da Clínica Neurológica da Faculdade de Medicina devido ao afastamento de Washington Pires para assumir o cargo de Ministro da Educação e Saúde no governo de Getúlio Vargas (GUSMÃO, 2006; MENDONÇA et al, 2006). Apesar de ter sido nomeado diretor, ele não foi empossado, devido sua transferência para Belo Horizonte a fim de ocupar a vaga ocorrida com o falecimento de Alexandre Drummond diretor do Instituto Raul Soares. Para substituí-lo foi nomeado, em 1930, José Cezarini, tornando-se então, o primeiro diretor efetivo do Hospital Psiquiátrico de Oliveira e permanecendo até 1933 (MORETZOMN, 1989). O Hospital Psiquiátrico de Oliveira, a partir do Decreto n° 9817 de 1931, passa a chamar-se ‘Hospital Djalma Pinheiro Chagas’, em homenagem ao idealizador do Hospital (MORETZOMN, 1989). Destarte a construção do Hospital Psiquiátrico de Oliveira institucionaliza a assistência psiquiátrica pública e científica do centro-oeste mineiro a partir de um misto de injunções históricas locais e estaduais que se retroalimentam com as necessidades econômicas, políticas e sociais imanentes à superlotação do Hospital Colônia de Barbacena e à conseqüente estratégia de descentralização da assistência psiquiátrica mineira.
REFERÊNCIAS ALMEIDA, J.P. Drs. Alberto de Andrade Machado e João Albino de Almeida. Gazeta de Minas, Oliveira, 01 jun. 1930. Número 22, p. I ALMEIDA, J.P. Hospital Psychiatrico de Oliveira. Gazeta de Minas, Oliveira, 08 maio 1927. Número 19, p. I ALMEIDA, J.P. Hospital Psychiatrico. Gazeta de Minas, Oliveira, 08 janeiro 1928. Número 55, p. II ALMEIDA, J.P. Hospital Psychiatrico. Gazeta de Minas, Oliveira, 21 out. 1928. Número 45, p. I ALMEIDA, J.P. Oliveira em festas, Visita aos Edificios Publicos – Inauguração do Hospital e do Grupo Escolar – Inauguração do Busto do Dr. Antonio Carlos – A Manifestação – O Baile – Os Discursos – Outras Notas. Gazeta de Minas, Oliveira, 18 jan. 1931. Número 3, p. I GUSMÃO, S.S. História da Neurologia em Minas Gerais. Jornal Brasileiro História da Medicina. jul 2006 (Disponível em http://www.sbhm.org.br/index.asp?p=noticias&codigo=95) MAGRO FILHO, J.B. A tradição da loucura – Minas Gerais - 1870-1964. Belo Horizonte: COOPMED/Editora UFMG, 1992 MENDONÇA, J.L; COELHO, R.S; GUSMÃO, S. História da Psiquiatria na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (1911-1961). Jornal Brasileiro História da Medicina. jul 2006 (Disponível em http://www.sbhm.org.br/index.asp?p=noticias&codigo=89) MORETZOMN, J.A. História da Psiquiatria Mineira. Belo Horizonte: COOPMED/Editora UFMG, 1989 ODA, A.M.G.R; DALGALARRONDO, P. História das primeiras instituições para alienados no Brasil. Hist. cienc. saude-Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 12, n. 3, p. 983-1010, dez. 2005 RESENDE, H. Política de saúde mental no Brasil: Uma visão histórica. In: TUNDIS, S; COSTA, N.R. (org.). Cidadania e Loucura: Políticas de saúde mental no Brasil. Petrópolis: Vozes Editora, 2000, p. 15-74
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