Volume 14 - 2009 Editores: Giovanni Torello e Walmor J. Piccinini |
Março de 2009 - Vol.14 - Nº 3 Psiquiatria Forense Formação profissional: Psiquiatria Forense Hilda Morana, PhD
(Entrevista para a revista Jovem Médico: edição (01/2009).
Stella Galvão/jornalista) Pela legislação brasileira,
em princípio, qualquer médico que esteja legalmente habilitado para o exercício
profissional pode exercer a Psiquiatria Forense. No entanto, a Associação
Brasileira de Psiquiatria, através de seu Departamento de Ética e Psiquiatria
Legal concede o título de Psiquiatra Forense àqueles que sejam aprovados em concurso
de provas, realizado anualmente durante o Congresso Brasileiro de Psiquiatria.
Embora esse título não tenha força legal, cada vez mais as
instituições médicas o exigem para aqueles que desejam exercer a Psiquiatria
Forense. Denomina-se Psiquiatria Forense ou Psiquiatria Legal a sub-especialidade da Psiquiatria que trata dos problemas
psiquiátricos envolvidos nas causas legais. Em quais circunstâncias históricas
surgiu a psiquiatria legal ou forense? Existem diferenças entre estes
termos(legal/forense)? Qual a consagrada? A
palavra "forense" vem do latim fórum. A figura do Psiquiatra Forense
entrou no Direito Penal para humanizar as condutas forenses e contrabalançar
com os juristas. Surgem, por volta de 1850, testemunhos de especialistas como
auxiliares dos juízes. Começa a aparecer a idéia de
reabilitação do ofensor. A punição busca modificar o ofensor de modo que não
volte a reincidir nas ações criminosas. Inicialmente os psiquiatras passaram a
auxiliar a Justiça nos quesitos criminais e depois se entenderam para as demais
áreas do Direito. Psiquiatria
Legal é o termo utilizado pela Associação Brasileira de Psiquiatria, quando da
fundação do Departamento de Psiquiatria Legal e Ética por seu primeiro
presidente, Dr. Rubim de Pinho. Esta denominação tem
a vantagem de não se limitar ao conceito de fórum. O profissional que envereda por essa
área faz a escolha ainda na residência médica? Ainda
não há Residência Médica específica na área, a não ser Trata-se de uma área que exige
conhecimento da terminologia jurídica? Não,
de maneira nenhuma! O Psiquiatra Forense, em sua formação, vai aprender algumas
Leis e o entendimento jurídico de certos procedimentos para poder alcançar as
conseqüências legais de seus atos, apenas isso. O psiquiatra que enveredar por
essa área deve aprender a redigir um Laudo Psiquiátrico e dominar algumas normas
já consagradas para a conclusão, discussão e respostas aos quesitos. Contudo, é
bom frisar que o que vale é o sólido conhecimento em psiquiatria, a habilidade
em semiologia psiquiátrica, capacidade de conduzir uma boa entrevista e a
leitura atenta do processo para estabelecer o nexo causal. Como um graduando pode identificar sua
aptidão por este campo de atividade, uma vez eleita a
psiquiatria? Gosto
por encrencas! Quem tem medo de juiz, de pelejas, não deve se meter nessa área.
Particularmente, tenho predileção pela Psiquiatria Forense por me permitir ter
uma maior abrangência do quadro psiquiátrico O
candidato também tem que ter o gosto pela escrita, pois em nossa tradição ainda
recorremos ao laudo por escrito. Não temos por norma a apresentação oral do
nosso trabalho pericial. Quais os principais tópicos, referentes
à responsabilização do indivíduo, que são abordados pela Psiquiatria Legal? A
interface entre Psiquiatria e Direito ocupa-se com a tarefa de se considerar o
indivíduo em suas variantes pessoais e singulares, em confronto com os
regulamentos legais da sociedade. A Psiquiatria Forense tem como práxis o
esclarecimento da condição mental do sujeito que busca um benefício da Lei ou
que foi processado em um de seus artigos. O psiquiatra forense não está apto para
julgar, mas para definir as condições mentais, em nexo causal ou
conseqüente, a uma condição psíquica tal que tenha gerado um procedimento do
Direito. Porém, o compromisso do psiquiatra forense é antes de tudo com a
Psiquiatria. Quais
são as habilitações necessárias para exercer a Psiquiatria Forense ou Legal? Certificado
de Atuação na Área de Psiquiatria Forense emitido pela Associação Brasileira de
Psiquiatria. Esse certificado é emitido mediante uma Prova realizada todos os
anos durante o Congresso Brasileiro de Psiquiatria e a efetiva comprovação de cinco
anos de prática em perícias judiciais. Quem tem mais peso em um julgamento: o
advogado ou o psiquiatra forense? Os psiquiatras forenses são considerados auxiliares
da Justiça em virtude da necessidade apresentada pelo juiz de solucionar
questões que exigem conhecimentos específicos. Não existe “peso” em um
julgamento, mas habilidade técnica e competência profissional. O psiquiatra forense é chamado a atuar
por indicação de um juiz, ou contratado pelas partes quando em ação civil. Conforme a Resolução CREMESP
nº 126, de 17/10/2005, que dispõe
sobre a realização de PERÍCIA MÉDICA, o médico é dito perito oficial quando é investido em cargo ou função pública e
realiza perícia médica, por dever legal, agindo de acordo com a lei e as normas
da instituição a que pertença; o médico é dito perito judicial ou louvado quando nomeado, respectivamente, pelo
Juízo ou por autoridade competente, para atuar como perito de confiança em
processo judicial e/ou procedimento administrativo; o médico é dito assistente técnico quando contratado
pela parte para atuar como perito de sua confiança em processo judicial e/ou
procedimento administrativo Um cenário socialmente conturbado favorece
mais doenças mentais na população? Os
aspectos sociais desfavoráveis contribuem para que os que possuem algum defeito
na formação de seu caráter tenham a oportunidade de se expressarem com maior
liberdade. O defeito de caráter obedece a um espectro de manifestação, assim
como qualquer outra condição deficitária do ser humano, que vai desde um leve
transtorno da personalidade até a condição de psicopatia grave. Nasce ao redor
de 2% de psicopatas no mundo todo, (psicopatia entendida como condição grave de
transtorno da personalidade), mas em sociedades desorganizadas como o Brasil a quantidade
de psicopatas é apenas maior, pois, para cá, migram os estrangeiros que
encontram aqui uma grande oportunidade de se manifestar. Quais as implicações legais das doenças
mentais? O
doente mental que comete um crime ou qualquer ato antijurídico não pode ser
responsabilizado se o ato tiver nexo causal com a doença. O juiz pede o
incidente de insanidade mental e nós, psiquiatra forenses, realizamos o laudo
de sanidade mental. Não basta o sujeito que praticou um ato antijurídico ser
doente mental, é necessário que haja o nexo causal, ou seja, que naquelas
circunstâncias o sujeito praticou o ato sem a necessária noção de seu
entendimento e capacidade de determinação. Quando há suspeita de patologia
mental, o juiz interrompe o processo e solicita a perícia. O psiquiatra forense
vai avaliar e emitir o laudo. Ele não é chamado nem pela defesa, nem pela
acusação. Ele é neutro, uma vez que é perito do juiz. Em
que medida quadros psicóticos podem resultar em maior risco de uma pessoa matar
ou praticar violências de toda ordem? A porcentagem de psicóticos e retardados mentais
graves e/ou profundos que cometem crimes é muito pequena, da ordem de menos de
5% de todos os crimes contra pessoas. Uma das características do crime
praticado por estes doentes é que a maior parte das vítimas são indivíduos de
suas próprias famílias. Contudo, se incluirmos o abuso de drogas, a porcentagem
eleva-se muito. Quadros
psicóticos aumentam o risco de violência se o doente não estiver tratado? Com
certeza, a violência está em não se tratar o doente mental. Sempre que um
doente mental não estiver devidamente tratado, os sintomas de delírios e
alucinações podem levar o sujeito a se descontrolar e agredir alguém em função
da desagregação mental. Se devidamente tratado é muito difícil que isso venha a
ocorrer. É
muita responsabilidade declarar inimputável alguém que todas as evidências
mostram ser autor de um crime? É preciso não confundir: O fato de declaramos que o
sujeito que praticou o crime é inimputável, significa apenas que ele não era
capaz de entender e de se de determinar à época do delito, por ser portador de
doença mental a qual gerou tal incapacidade (nexo causal). Isto não quer dizer
que ele vai ser solto nas ruas por determinação judicial. Nestes casos o juiz
suspende a pena e a transforma em medida de segurança e internamento em Hospital de Custódia e
Tratamento. O sujeito só será liberado desta medida quando houver um laudo de
cessação de periculosidade. Qual
a sua opinião sobre controvérsias como as apresentadas pelo médico legista
Sanguinetti no caso da menina Isabela Nardoni? Só posso comentar casos que eu tenha examinado
pessoalmente. Não se pode fazer juízo de casos por informação de mídia que
normalmente distorce os fatos, tanto por desconhecer as questões médicas,
médico-forenses e também por sensacionalismo. A propósito, o legisla conflita com o
psiquiatra forense ou não? Não,
os trabalhos se complementam, contudo pode haver situações em que surjam
dúvidas, o que é normal em opiniões técnicas. O médico legista tem
especialização Como atua o psiquiatra forense? Na área criminal o psiquiatra forense atual tanto na
avaliação do réu quanto na terapêutica do doente mental que delinqüiu. Na área
cível o profissional vai atuar para avaliar a capacidade civil, seja em
perícias de indenizações e ações securitárias, seja para avaliar capacidade em
receber citação judicial, guarda de filhos, anulação de atos jurídicos e
outras. O psiquiatra forense atua ainda na área administrativa e previdenciária,
avaliações realizadas no âmbito de instituições públicas. É uma área atraente em termos de mercado de trabalho? Sim,
a psiquiatria forense é uma especialidade muito atraente para quem gosta de
aprofundar o estudo de casos. Financeiramente é variável.
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