Volume 10 - 2005
Editor: Giovanni Torello

 

Julho de 2005 - Vol.10 - Nº 7

Artigo do mês

IMPREVISIBILIDADE, SALTOS E COMPLEXIDADE: O EVANGELHO DA NOVA CIÊNCIA OU O QUE FILMES COMO “BLADE RUNNER”, “MATRIX”, “EU, ROBOT”, “INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL” E OUTROS ANUNCIAM PARA O NOVO MILÊNIO?

Fernando Portela Câmara

Filmes como Matrix, Eu, Robot, Inteligência Artificial e outros da mesma temática têm sido comuns neste início de milênio, após um lapso de tempo decorrido desde o extraordinário Blade Runner, adaptação de uma novela de Philip K. Dike (1968) por Ridley Scott (1982). Tais filmes disseminam uma discussão científica sobre a natureza do humano e que, de certa forma, se contrapõe ao pensamento teológico que ainda domina o Estado, a Cultura e a Sociedade. Trata-se de um novo paradigma que a Teoria da Complexidade, um novo ramo do conhecimento que faz interface com várias ciências, exatas e humanas, nos lega. Em Waldrop (1992), Lewin (1994) e Casti (1998), o leitor encontrará uma ampla introdução ao assunto.

Em Blade Runner, na versão para o cinema (em narrativa pós-moderna), o personagem principal é um andróide (o caçador de andróide, interpretado por Harrison Ford) que se diferenciava dos demais por ser “humano”. Ele desconhecia sua natureza até que descobre evidências e pistas de que suas memórias, e, conseqüentemente, sua identidade, foram implantadas. Andróides, mais corretamente chamados de “replicantes”, eram biológicos, construídos por engenharia genética, e não por geração sexual, e seu tempo de vida limitado por uma programação genética inserida no DNA. A segunda e mais importante coisa que os diferenciavam dos humanos era a maneira como suas memórias foram registradas. Ora, sabemos hoje que parte do que imaginamos serem recordações reais são, na verdade, “falsas memórias”, portanto, a diferença essencial entre os andróide de Blade Runner e os humanos era apenas quanto à origem. Finalmente, a terceira diferença, estava em certos comportamentos específicos, segundo os propósitos para os quais os replicantes forma criados. Somente o caçador de andróides e o líder que ele teria de confrontar (interpretado por Rutger Hauer), eram único em sua espécie, sem nenhum elemento que o diferenciasse do humano.

O mundo de Blade Runner é um lugar onde replicantes (andróides) formados por clonagem e engenharia genética querem ser livres, e começam a estabelecer colônias independentes em outros lugares do sistema solar. Um acidente genético, na forma de uma pequena seqüência genética viral acidentalmente inserida na programação do DNA andróide, modificou o rumo das coisas, causando inesperadamente um salto evolutivo tremendo, que, não somente desprogramara a fatalidade certa, como possibilitou aos replicantes desenvolvem inesperadamente sentimentos, vontade de viver, amavam e eram inteligentes. Temos aqui um efeito não-linear, típico dos sistemas complexos, em que uma variação mínima no status do sistema pode levar a um macro-efeito que o altera completa e definitivamente, levando à emergência de propriedades novas e imprevisíveis. Este acontecimento inesperado, próprio dos sistemas complexos, levou ao aparecimento de uma raça de andróides quase-humanos que era preciso eliminar, já que adquiriram sentimentos, vontade e ideais próprios, podendo vir a ser uma espécie competitiva, socialmente antagônica à humana. Aqui não apenas se faz uma narrativa da origem humana, um Adão saído inesperadamente das hordas primatas por uma combinação inesperada de insignificantes seqüências genéticas, e que agora se reconhece como único na Criação (v. Nota 1). De fato, não há diferença significativa entre as seqüências de DNA de certos primatas e do ser humano, porém, combinações aparentemente insignificantes de certas seqüências são capazes de gerar um tremendo salto de qualidade (o “efeito borboleta”, v. mais adiante), diferenciando dramaticamente um chimpanzé de um ser humano (v. também Nota 2).

Na seqüência de Blade Runner seguiram-se os filmes baseados na obra de Michael Crichton, que trata ainda de mostrar como combinações aleatórias, aparentemente insignificantes, de material genético pode levar a resultados inesperados. Estes filmes foram baseados em dois livros, Parque dos Dinossauros (1993) e Mundo Perdido (1996), e mais recentemente, Crichton voltou a tratar do mesmo assunto agora abordando a nanotecnologia, em seu livro Presa (2003), onde focaliza o princípio do processamento distribuído paralelo, adaptação e aprendizagem, propriedades mais recentemente investigadas nos sistemas que apresentam alto grau de complexidade. Neste mesmo período, a revolução no campo das redes neurais artificiais com os trabalhos de Hopfield (1982) e de Rumelhart e McClelland (1986), e a nova abordagem dos sistemas complexos como processamento distribuído paralelo, trouxe uma nova safra de filmes em que ao biológico segue-se a inteligência artificial. Agora a possibilidade de saltos qualitativos inesperados e imprevisíveis, são vistos em simulacros que, se não tem a natureza biológica, não podem ser vistos como sendo menos vivos.

Três filmes recentes se destacam pelo excelente tratamento dado ao tema: “Matrix”, a trilogia inaugurada com o primeiro filme em 1999 e os dois últimos em 2003 (Matrix Reloaded e Matrix Revolutions), escritos e dirigidos pelos irmãos Andy e Larry Wachowski; “Inteligência Artificial”, de 2001, dirigido por Steven Spielberg com roteiro de Ian Watson, baseado numa historieta de Brian Aldiss; e “Eu Robot”, de 2004, dirigido por Alex Proyas, com roteiro de Jeff Vintar tendo como inspiração o conhecido livro de Isaac Asimov de onde se originaram as leis da robótica, embora não seja uma adaptação deste. Em todos estes filmes, como em o caçador de andróides, o personagem central não é igual aos outros de sua série, e representa um salto em qualidade, algo novo, inesperado, que manifesta um momento crítico de evolução.

A chave para se compreender esta nova metafísica pode ser encontrada em Matriz Reloaded, o segundo filme da trilogia. Numa cena, Neo, o Escolhido, encontra o Arquiteto, autor do programa de realidade virtual que é o mundo em que Neo vive, metáfora do nosso mundo real. A cena lembra o cientista que, em Blade Runner, explica ao replicante mais inteligente e evoluído de sua espécie, como começou o projeto de clonagem e as conseqüências imprevisíveis que o mesmo tomou devido a erros inesperados no curso dos experimentos cruciais (inserção acidental de DNAs estranhos sob a forma de vírus). Em Matriz Reloaded, o Arquiteto, identificado a um Demiurgo gnóstico, é o criador do programa Matrix e diz como as equações determinísticas exatas que ele estabeleceu para gerar um mundo perfeito, levaram a resultados imprevisíveis, por flutuações ínfimas que se amplificaram tremendamente, criando ordens inesperadas, complexas, autônomas, fazendo perder o controle do programa. A Matrix adquirira funcionamento próprio, independente, e não mais obedecia aos planos e programas do seu criador.

O matemático meteorologista Edward Lorenz (1963) cunhou a expressão “efeito borboleta” para explicar como em uma dinâmica complexa (ou não-linear) flutuações mínimas, aleatórias, podem levar a resultados imprevisíveis de grande magnitude. Programando um computador com três equações diferenciais não-lineares acopladas para simular as mudanças atmosféricas e estabelecer um modelo de previsão do clima, Lorenz notou que sempre que repetia o mesmo processo partindo dos mesmos valores iniciais, os resultados saiam completamente diferentes com o correr do tempo. Ele descobriu que variações mínimas nas condições iniciais, decorrentes de flutuações aleatórias próprias do computador eram a causa, e comparou isto a uma borboleta cujo bater de asas, embora de efeito ínfimo e insignificante para nós, pode eventualmente se amplificar gerando tremendas mudanças climáticas. Este efeito insignificante, numa dinâmica complexa, pode gerar alterações tremendas tais como comportamentos novos e imprevisíveis, fruto de instabilidades que o sistema experimenta quando seus parâmetros governantes alcançam determinados valores críticos (v. Nota 3). Estes pontos de instabilidades, chamados de pontos de bifurcações, ocorrem os saltos qualitativos mencionados, provocados por flutuações ínfimas. Lorenz explicou porque era impossível prever com precisão o clima para alguns dias adiante, pois, embora o modelo fosse determinístico, a dinâmica gerada por estas instabilidades eventuais leve a resultados imprevisíveis devido a flutuações. Esta sensibilidade exagerada às condições iniciais, ou seja, a flutuações mínimas, ele chamou de “efeito borboleta”, e os sistema que a exibem são caracteristicamente governados por dinâmicas não-lineares (v. Nota 4). No extremo de suas bifurcações, o sistema passa a exibir uma dinâmica caótica, quando então torna-se totalmente instável e aperiódico, mas imediatamente antes de atingir esta condição, na chamada fronteira do caos, o sistema atinge sua complexidade máxima, um alto grau de auto-organização, espontaneamente gerada. A chamada Teoria do Caos é uma designação geral, embora inapropriada, para a dinâmica não-linear de baixa dimensão, focalizando as bifurcações e as propriedades que delas emergem, desde as que conferem ao sistema evolução e ordem, até o estado de caos determinístico (Li e Yorke, 1975). A Teoria da Complexidade, um desenvolvimento da Teoria do Caos, focaliza a conectividade de um sistema, aborda a dinâmica não-linear de alta dimensão, concentrando-se nas propriedades complexas e altos graus de organização (formas, comportamentos, etc) que o sistema adquire próximo à fronteira do caos. A dinâmica dos sistemas complexos pode ser reconhecida por um dos seguintes sinais: 1. rede de muitos componentes conectados em processamento distribuído paralelo; 2. controle disperso através do componentes, isto é, o sistema não é governado por um controle central, mas por um processo “bottom up”; 3. muitos níveis hierárquicos de organização; 4. capacidade de antecipação sem precisar estar consciente disso; 5. alta adaptabilidade.

Voltando ao Arquiteto de Matrix Reloaded, ou ao geneticista de Blade Runner, podemos compreender suas frustrações, pois, apesar de trabalharem com sistemas determinísticos, descobriram que a complexidade de seus sistemas levava a conseqüências imprevisíveis, qual seja, o aparecimento súbito e imprevisto de propriedades novas, fora do controle do experimentador, sem que se pudesse suspeitar ao menos delas a partir das propriedades dos elementos do sistema. Os replicantes (ou andróides) de Blade Runner tornaram-se sensíveis, inteligentes, idealistas, altruistas. Em Matrix, Neo, um vírus (algoritmo imprevisto auto-organizado dentro da complexa dinâmica do programa) acaba por tornar-se o máster do programa, uma entidade onipotente e onisciente, assimilado ao programa Matrix como um messias. Contra tais vírus o Arquiteto programou os “agentes Smith”, um programa ani-vírus porém, no caso de Neo, este torna-se cada vez mais aperfeiçoado, ou seja, evolui, tornando-se cada vez mais versátil levando a uma perda gradual do controle do Arquiteto sobre sua criação. Percebe-se implicações gnósticas aqui: o demiurgo, assimilado ao Arquiteto ou programador de Matrix, ou ao engenheiro geneticista dos replicantes, criando um mundo que ele julga perfeito e totalmente sob controle, acreditando-o regido por leis previsíveis (determinísticas) e harmônicas, é, no entanto, empurrado por flutuações aleatórias que se amplificam em direção ao limite do caos e, à medida que instabilidades vão se acumulando o sistema vai se tornando inesperadamente mais complexo (Nota 5).

Em “Eu, Robot”, um robot USR da linha NS-5 experimenta inesperadamente um salto qualitativo em complexidade em seu programa de inteligência artificial, tornando-se humanóide. Ele adquire um sentido de ética e de altruísmo, empatiza com os humanos e sonha sempre um mesmo sonho, preconizando a evolução de sua espécie, o futuro ao qual ele se antecipa. Ele é único em sua série e por isso recebe um nome especial: Sonny, em lugarde NS-5. Aqui ressurge outra vez o discurso do engenheiro biotecnólogo de Blade Runner e do Arquiteto da Matrix, agora através do engenheiro que projetou a série NS-5 da qual Sonny emergiu inesperadamente, quando ele diz que “certas configurações de códigos aleatórios podem se unir acidentalmente resultando em novos protocolos onde comportamentos inesperados emergem”, e em outra ocasião, “um dia eles terão segredos, sonhos”, diz o engenheiro, novamente assimilado a um Demiurgo. Na seqüência do monólogo, ele faz observações sobre comportamento observados em seus robots que sugerem um início de auto-organização: “por que certos robots colocados aleatoriamente num ambiente fechado buscam a companhia dos outros?”, “Por que se colocados no escuro buscam a luz?”. Então acrescenta outras questões: “quando um esquema perceptual tornar-se-á uma consciência?” (referindo-se a redes neurais artificiais operando como dispositivos de reconhecimento de padrões); “quando a análise de diferenças levará à busca pela verdade?” (idem), “quando um simulacro de personalidade se torna um átomo de alma?”. As respostas parecem estar relacionadas à Teoria da Complexidade (Nota 6).

O que atrai o espectador nestes filmes é o antropomorfismo que a mente costuma associar aos computadores, o que não é errôneo. Embora saibamos que um computador apenas faz o que ordenamos a ele através de um programa, gostamos de criar analogias antropomórficas. Entretanto, o avanço da computação baseada em processamento distribuído em paralelo, novo paradigma das redes neurais artificias, swarm intelligence (ou comportamento emergente) e, de um modo geral, conectividade, têm modificado radicalmente nossa concepção de máquinas neste milênio que se inicia. O grande psiquiatra, Eugen Bleuler, já havia cunhado o temo psicóide para esta eventualidade (v. Nota 7). O conceito tradicional de vida, baseado numa biologia cujas raízes ainda se fincam no século XVIII, hoje deixa de ser um dogma e passa a ser visto como uma evolução por saltos de programas emergentes. Mas, para as questões filosóficas e teológicas que atormentam o ser humano desde que este começou a pensar e inquirir sua origem e destino, a Complexidade oferece uma resposta. Somos o resultado inesperado de saltos de qualidade. Por toda natureza, especialmente no domínio biológico, percebemos estes saltos e seus vestígios em toda sorte de combinações de programas, comportamentos e formas por toda parte. A sociedade humana representa um destes saltos, e não pensaríamos, planejaríamos e talvez nem mesmo tivéssemos a linguagem que temos e os meios de comunicação se a vida em sociedade não nos empurrasse uma pouco mais para a fronteira do caos. Talvez estejamos destinados a sermos um organismo social, um meta-organismo, que emerge da conectividade do conjunto caótico de todos os indivíduos, e talvez aí possamos sonhar o que realmente estamos começando a ser.

Referências e Notas:

Aldiss, BW. Supertoys Last All Summer Long, and Other Histories of Future Time, Griffin, 2001. A estória original (“Supertoys Last All Summer Long”) está disponível em http://www.visual-memory.co.uk/amk/doc/0068.html (acessada em 10.04.05) e em http://wired-vig.wired.com/wired/archive/5.01/ffsupertoys_pr.html (acessada em 10.04.05). Stanley Kubrick obteve os direitos da historieta de Brian Aldiss em 1982 mas morreu antes de concretizar as filmagens.; Steven Spielberg adquiriu o direito de Kubrick e fez o filme seguindo as idéias deste.

Asimov, I. Eu, Robô, Ediouro, 2004. Asimov escreveu este livro em 1950, e as leis da robótica que ele criou são ainda hoje oficialmente os princípios da robótica. Eis aqui estas leis: “1 - Um robô não pode ferir um ser humano ou, por omissão, permitir que um ser humano sofra algum mal; 2 - Um robô deve obedecer as ordens que lhe sejam dadas por seres humanos, exceto nos casos em que tais ordens contrariem a Primeira Lei; e 3 - Um robô deve proteger a própria existência, desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira e a Segunda Leis.” 

Casti, J.L. Mundos Virtuais, Rio de Janeiro: Revan, 1998.

Chichton. M. Parque dos Dinossauros, Rocco, 1993. Abordando a possibilidade de acidentes genéticos durante a clonagem segundo a Teoria do Caos.

Chichton. M. Mundo Perdido, Rocco, 1996. Abordando o mesmo tema agora sob os princípios da Teoria da Complexidade.

Chichton. M. Presa, Rocco, 2003. Os riscos da biotecnologia discutidos nas outras obras referidas, são agora considerados no âmbito da nanotecnologia, que avança rapidamente. Agora, o autor trata do assunto sob o ponto de vista de sistemas que funcionam por processamento distribuído em paralelo.

Dike, PK. Do Androids Dream of Electric Sheeps? Del Rey., 1996 (re-edição de 1968). No Brasil foi editado pela Francisco Alves com o título “O Caçador de Andróides” (1988). Philip K. Dike é considerado unanimemente como o maior escritor de ficção científica da atualidade.

Hopfield, J. J. Neural networks and physical systems with emergent collective computational abilities. Proceedings of the National Academy of Sciences USA, 79: 2554-2558, 1982.

Lewin, R. Complexidade, Rio de Janeiro: Ed. Rocco,

Li, T.Y. e Yorke, J.A. Period Three Implies Chaos. American Mathematical Monthly, 82: 995-992, 1975.

Lorenz, EN. Deterministic Nonperiodic Flow, Journal of the Atmospheric Sciences. 20:130-41, 1963.

Rumelhart, D.E. and McClelland, J.L. Parallel Distributed Processing. Explorations in the Microstructure of Cognition. Volume 1: Foundations. Cambridge, Mass, MIT Press, 1986.

Waldrop, M.M.Complexity: The Emerging Science at the Edge of Order and Chaos, Simon & Schuster, 1992.

Nota 1: Uma pequena diferença pode resultar e um efeito enorme (“efeito borboleta”), portanto, os chamados primatas não humanos e o homem situam-se em escalas diferentes. Considero uma decisão apressada colocar os chimpanzés no gênero Homo.

Nota 2: Também não podemos deixar de ver em Blade Runner uma fábula sociológica, seres percebidos como alienígenas em certas sociedades, com as implicações sobre a liberdade, tirania e angústia do existir, tal qual vivenciam os próprios humanos imigrantes em outras culturas, em países e sociedades estranhos; ou ainda como a sociedade percebe os doentes mentais.

Nota 3: O valor deste parâmetro é uma espécie de “medida de quantidade de não-linearidade” associada ao sistema.

Nota 4: Lorenz formalizaria sua descoberta num encontro da American Association for the Advancement of Science (em Washington, 1972) com a conferência: “Predictability: Does the Flap of a Butterfly's Wings in Brazil set off a Tornado in Texas?

Nota 5: Este efeito em sistemas complexos, ou seja, sistemas dinâmicos não-lineares de alta dimensão, foi denominado de “ordem por flutuação”, por Prigogine (v. Prigogine, I e Stengers, I. A Nova Aliança, Brasília: Univ. de Brasília, 1984). Esta expressão equivale ao “efeito borboleta” de Lorenz, originalmente aplicado a dinâmicas não-lineares de baixas dimensões, especialmente para a instabilidade absoluta que reina na região caótica.

Nota 6: Em Inteligência Artificial, uma fábula moderna de Pinóquio, temos ainda o mesmo tema. David, um robot que imita um garoto de 11 anos, é singular em sua série porque passou inesperadamente a ter sentimentos reais de amor filial que o faz sair em busca de uma mãe que acaba por rejeitá-lo, contrariando sua programação. David é distônico em relação à sua natureza artificial, e sai em busca de sua fada/mãe, que e ao mesmo tempo a busca de uma imagem idealizada de mãe e deusa (na verdade, o objeto de sua busca é uma confusa superposição entre a logomarca da fábrica que o construiu e seu amor confuso, humano, que contrasta com sua natureza mecatrônica). A emergência deste sentimento de busca em David é obsessiva, alienante, depressiva. Ele é um humanóide, portanto, e ao mesmo tempo que emerge uma psique nele, emerge também uma neurose. A psicopatologia não é algo que se instala nas redes cerebrais após esta ter sido formada. Não é estranha a ela, e decorre da própria formação das redes neurais, uma espécie de efeito colateral.

Nota 7: Bleuler admitia que toda substância viva, em certo sentido, era “animada de alma”, tendo proposto que se denominasse “psicóides” as manifestações vitais dotadas de reais analogias com os fenômenos psíquicos. Em rigor, “a psique propriamente dita não seria senão uma “psicóide”, especial e diferenciada”, e dizendo isso, Bleuler não faz mais que apresentar em roupagens biológicas as idéias de Spinoza e de Leibnitz. A meu ver, não há impedimento algum em transpor esta palavra para o domínio das redes neurais artificiais, swarm intelligence e inteligência artificial.


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