Volume 5 - 2000
Editor: Giovanni Torello

 

Novembro de 2000 - Vol.5 - Nº 11

No Paiz dos Yankees

Psiquiatria Forense

Dr. Erick Messias

Um dos serviços pelo qual passamos no quarto ano de residência é psiquiatria forense. Atualmente passo as manhãs de quinta e sexta no fórum de Baltimore, no centro antigo da cidade, próximo do porto, e ao lado do quarteirão de prostíbulos (‘the block’), da chefatura de polícia e da prefeitura – uma combinação típica de grandes cidades. Achei que seria interessante apresentar na coluna desse mês algumas noções de psiquiatria forense, como se pratica por aqui, de modo que os leitores possam ter uma comparação com o que se fez do lado de baixo do equador.

Psiquiatria forense é uma das possíveis subespecializações da psiquiatria nos EUA – inclusive com board separado e uma associação, The American Academy of Psychiatry and the Law. A principal ocupação do psiquiatra forense é fornecer avaliações e preparar relatórios como perito – expert witness. Tais avaliações são utilizadas em diferentes situações jurídicas. Alguns exemplos de ações mais comuns:

Na justiça criminal:

  • Competência pra ir a julgamento
  • Responsabilidade criminal
  • Seleção pré e pós julgamento
  • Transferência de jurisdição – questão de determinar se um adolescente pode ser julgado como adulto

Na justiça civil

  • Direitos de custódia de menores
  • Acidentes de trabalho
  • Erro médico
  • Assédio sexual
  • Competência para escrever, ou modificar, testamento

A área forense tem sido considerada uma das especialidades mais atraentes na psiquiatria americana por várias razões. Primeiro, a possibilidade de salários altos: o perito cobra por hora de trabalho, inclusive o tempo revisando prontuátios e outros documentos, assim como o tempo gasto no deslocamento até o tribunal onde dará seu depoimento – que pode ser noutro estado – num sistema chamado portal to portal, ou seja todo o tempo gasto pelo perito do momento em que saiu de seu consultório até seu retorno. Outra razão para a popularidade da área forense é a possibilidade de projeção nacional com casos que chamam atenção da mídia, como os tais assasinos seriais ou pessoas que atacam os famosos, como o jovem que atirou no presidente Reagan – que até hoje está recolhido no St. Elisabeth Hospital. Finalmente o aspecto de ‘qualidade de vida’ ajuda a forense a se destacar como área atrativa: nela não temos pacientes, mas clientes – com os quais não temos responsabilidade clínica ou compromisso de segredo médico - essa é, aliás, uma das primeiras coisas que aprendemos no serviço, no primeiro momento em que entrevistamos o paciente-cliente deixamos claro que estamos ali a serviço da justiça e que não há compromisso de segredo médico a ser mantido.

Uma das pérolas desse serviço são as chamadas Dez regras de psiquiatria forense da Dra. Tellefson – a diretora de ensino do fellowship em forense. Essas regras resumem bem o espírito da especialidade e servirão para concluir a coluna. Vamos a elas:

Regra Zero
Seja pago primeiro, trabalhe depois

Regra Um
Qual é a pergunta a ser respondida?

Regra Dois
Quem faz a pergunta?

Regra Três
Antes de tudo, seja competente

Regra Quatro
Não se levante com suas costas

Regra Cinco
Todos mentem, exceto você

Regra Seis
Não deixe pedra sobre pedra ao examinar um caso

Regra Sete
"eu não sei" pode ser uma resposta adequada

Regra Oito
Nunca há nenhum motivo para falar com repórteres

Regra Nove
Voce não é um juiz

Regra Dez
Ao escrever um laudo: clareza, responda ao que lhe foi perguntado. Seja lógico e use documentos para provar seu ponto de vista

Regra Onze
Na hora de dar um testemunho, prepare-se. Em Roma, como os romanos. E lembre-se:
Você sempre sabe mais.

Acho que o humor e a sabedoria da Dra Christine Tellefson bem que vale a nossa atenção, não somente na prática de psiquiatria forense, mas na nossa prática clínica como um todo. As conclusões ficam por conta de cada um.

Até o próximo mês.  


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