Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Março de 2016 - Vol.21 - Nº 3 Psiquiatria na Prática Médica CORRELAÇÃO ENTRE TRAUMATISMO CRÂNIO-ENCEFÁLICO E TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS Claudio Toshiyuki Nakansihi* 1.
Introdução De
acordo com as diretrizes do Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) o
traumatismo crânio-encefálico (TCE) é definido como “lesão do tecido encefálico
causado por forças mecânicas externas, evidenciado por: perda de consciência
devido ao trauma craniano, amnésia, outras neurológicas ou neuropsicológicas
anormalidades, fratura de crânio e lesões intracranianas diagnosticadas ou
morte”1. O
TCE é classificado como penetrante ou fechado sendo a prevalência deste mais
elevada. Nos traumas fechados há a ação de forças mecânicas que levam o cérebro
contra os ossos do crânio (mecanismo de golpe e contragolpe). Respostas
fisiológicas a esse dano primário, tais como edema cerebral, aumento da pressão
intracraniana, isquemia cerebral, hipotensão e infecção podem também causar
lesão neuronal, neste caso, são chamadas de lesões secundárias2. O
TCE penetrante, em geral, é mais grave e associado a maiores complicações3. Há
grande ligação entre os transtornos psiquiátricos e TCE dentre eles destacam-se
a Depressão Maior e as Alterações de Personalidade, sendo diagnosticados pós
TCE. De acordo com o DSM-IV4 há os seguintes critérios para
diagnóstico de alteração de personalidade: A) uma
perturbação persistente da personalidade que representa uma alteração a partir
de um padrão anterior da personalidade característica do indivíduo. B) existem
Evidências, a partir do histórico, do exame físico ou de achados laboratoriais,
de que a perturbação é a consequência direta de uma condição médica geral. C) a
perturbação não é mais bem explicada por outro transtorno mental (inclusive outros
transtornos mentais causados por uma condição médica geral). D) a
perturbação não ocorre exclusivamente durante o curso de delirium. E) a
perturbação causa sofrimento ou prejuízo clinicamente significativo no funcionamento
social, ocupacional ou em outras áreas importantes. Tipos
de alterações de personalidade: Ø Instável:
se o aspecto predominante é uma instabilidade afetiva. Desinibido: se o aspecto
predominante é um fraco controle dos impulsos, evidenciado por indiscricões sexuais, etc. Ø Agressivo:
se o aspecto predominante é um comportamento agressivo. Ø Apático:
se o aspecto predominante é uma acentuada apatia e indiferença. Ø Paranóide: se
o aspecto predominante é desconfiança ou ideação paranóide.
Ø Outro
tipo: se o aspecto predominante não é nenhum dos anteriores. Ø Combinado:
se há predomínio de mais de um aspecto no quadro clínico. Ø Tipo
inespecificado. Em
um estudo prospectivo5, utilizando registros de diagnósticos de um
banco de dados com 939 pacientes, os autores encontraram uma prevalência de 49%
de transtorno psiquiátrico em pacientes que tiveram TCE moderado e grave, um
ano após ocorrido o acidente. Hawthorne et al.6 encontraram uma prevalência de Depressão
de 23% em uma amostra de pacientes com TCE, usando como critério diagnóstico um
ponto de corte de 8 ou mais na Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão
(HADS)7. Koponen et al.8, num seguimento retrospectivo, avaliaram
60 pacientes sendo que metade com trauma foi classificado como grave ou muito grave,
cerca de 30 anos após o TCE. Os autores encontraram uma incidência de pelo menos
um transtorno psiquiátrico de eixo I de 48.3%, sendo a incidência de Depressão
Maior de 26.7%. A avaliação psiquiátrica foi realizada com base no “Schedules for Clinical Assessment in Neuropsychiatry
interview” 9. Alteração de personalidade (clínica ou subclínica) foi
diagnosticada em 23.3% da amostra, com base nos critérios diagnósticos do
DSM-IV (APA, 1994). 2. Objetivo Correlacionar
o traumatismo crânio-encefálico com os distúrbios psiquiátricos decorrentes do
processo. 3. Discussão Acerca
do TCE pode-se inferir que lesões secundárias, especialmente relacionadas à
hipóxia e hipotensão, estão associadas a prejuízo cognitivo 6 meses após o trauma10.
O mesmo raciocínio pode ser estendido às sequelas psiquiátricas, especialmente
àquelas mais relacionadas à gravidade do trauma, como as alterações de
personalidade. O
TCE tem uma prevalência significativa em países subdesenvolvidos e em desenvolvimento,
onde as estatísticas são escassas e as consequências psiquiátricas virtualmente
desconhecidas 11, 12. O uso de avaliações retrospectivas acerca do
assunto, a utilização de amostras heterogêneas com relação a gravidade do TCE e
avaliação de indivíduos provenientes de ambulatórios de referência são
limitações de diversos estudos, que devem ser consideradas ao analisarmos a
baixa incidência de consequências psiquiátricas nesses pacientes. Tate
et al.13 relataram que alteração de personalidade também pode ser
resultado não só dos efeitos diretos do trauma, mas também de efeitos indiretos
como as reações e respostas do indivíduo aos prejuízos causado pelas sequelas
do trauma, a fatores ambientais e a traços pré-mórbidos de personalidade. Prigatano et
al.14 sugere(m) que os pacientes que falham repetidamente em uma
variedade de tarefas podem se tornar deprimidos ou ansiosos. Entretanto
a apresentação clínica da Depressão no paciente pós TCE pode ser diferente do paciente
com Depressão na população geral. Seel et al.15 descrevem que, nos pacientes pós TCE,
humor depressivo é caracterizado por mais irritabilidade, raiva e agressividade
que por tristeza e anedonia. ·
*- Interno do curso de Medicina da UNITAU ·
** - Prof.
Coordenadora de psiquiatria da UNITAU 4. Conclusão Visto
a gravidade e as consequências geradas nesses pacientes deve-se ressaltar a
importância da avaliação de transtornos psiquiátricos pós TCE com relação ao
avanço da identificação e tratamento desses transtornos mentais, os quais são
muitas vezes identificados como reações “normais”, sendo que a evolução no
atendimento e intervenção precoce no TCE, desfechos como transtornos psiquiátricos,
desempenho cognitivo e qualidade de vida vão se tornando evidentemente importantes.
Estudos com maior controle são necessários para investigar fatores prognósticos
relacionados a transtornos psiquiátricos e cognição após TCE. 5.
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