![]() ![]() Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Fevereiro de 2016 - Vol.21 - Nº 2 Psiquiatria na Infância e Adolescência
COMENTÁRIO SOBRE A LEI “ANTIBULLYING” Por Filipe Augusto Cursino de Freitas A Lei no 13.185, de
06/11/2015, divulgada no Diário Oficial da União (DOU) em 09/11/2015, institui
o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying). Em seu Artigo
primeiro, logo no primeiro parágrafo, considera-se como intimidação sistemática
ou bullying
"todo ato de violência física ou psicológica,
intencional e repetitivo, que ocorre sem motivação evidente, praticado por
indivíduo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidá-la
ou agredi-la, causando dor e angústia à vítima, em uma relação de
desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas". Ainda citando o Diário
Oficial da União, a intimidação sistemática é abordada em oito formas de
agressão, a saber: ataques físicos, insultos pessoais, apelidos pejorativos,
ameaças, grafites depreciativos, expressões preconceituosas, isolamento social
premeditado e pilhérias. Destacam-se como objetivos do
referido Programa de Combate à Intimidação Sistemática, à prevenção e o combate
ao bullying
em todos os espaços reais e virtuais, capacitar equipes pedagógicas e docentes
para o reconhecimento e enfrentamento do problema e dar assistência psicológica, social e jurídica às vítimas e aos agressores,
com intuito de tentar sua inserção no meio social. A nova Lei prevê, ainda, a
responsabilização de escolas, clubes e agremiações recreativas caso não seja
feita conscientização, prevenção, diagnose e combate à intimidação sistemática. A Lei no
13.185 entrará em vigor no início de Fevereiro de 2016 e, mesmo antes de
isso acontecer, já há várias discordâncias e controvérsias no tocante ao texto
em redes sociais e sítios eletrônicos de notícias. Um ponto frequentemente
abordado é o referente ao Artigo 4o. Em seu penúltimo parágrafo,
está escrito que se deve evitar, tanto quanto possível, a punição dos
agressores, dando maior ênfase à responsabilização e à mudança de comportamento
hostil. Não está claro, no texto publicado no Diário Oficial da União de
09/11/2015 - ver link abaixo - o que
seria este "evitar a punição". É possível que venham a ocorrer
interpretações subjetivas sobre como venha a ser o nível de alívio adequado a
cada agressor e a cada tipo de agressão. Também não está claro, no referido
Parágrafo da nova Lei, se há alguma relação do alívio da punição em relação à
idade do agressor. Também não há especificação em relação aos diferentes
ambientes em que a intimidação sistemática pode ocorrer. Em diferentes nações e
culturas, há diferentes formas de abordar comportamentos agressivos em relação
à idade de quem os comete. Uma pesquisa recente do Instituto Datafolha apontou
que 87% da população brasileira são a favor da redução da maioridade penal.
Entretanto, a redução da maioridade penal para os 16 anos de idade foi aprovada
apenas para os chamados crimes hediondos. Isso mostra a tendência existente na
Legislação do Brasil em seguir a tendência da maioria dos países do mundo, nos
quais a maioridade penal se dá a partir dos 18 anos de idade. Outros aspectos da Lei 13.185, de 06
de Novembro de 2015 deixam exposta sua fragilidade em termos da possibilidade
de interpretações subjetivas de seu texto. Não está claro como será feita a
abordagem ao agressor e se será levada em conta a patologia de base, caso haja,
ou a presença de indícios de desvio de caráter ou personalidade na faixa etária
de crianças e adolescentes. Nesses casos, questiona-se como seria uma eventual
punição. Hoje, a Legislação Vigente prevê medidas socioeducativas
para adolescentes e crianças que cometem atos infracionais,
mas não está claro como e se isso seria modificado caso as pessoas envolvidas
nesses atos tenham transtornos mentais. Em suma, está sendo questionada uma
abordagem da Psiquiatria Forense dentro da Psiquiatria da Infância e
Adolescência. Em relação às vítimas, não há clareza sobre como serão abordadas essas pessoas no texto da Lei 13.185, mas
tudo indica que essas serão encaminhadas para avaliação e tratamento na rede de
saúde disponível. Infelizmente, não tem havido incentivo suficiente em toda a
Saúde Pública no tocante a recursos destinados a este fim. No tocante à
Psiquiatria da Infância e Adolescência, a situação consegue ser ainda pior: há
poucos serviços disponíveis em todo o país, quase sempre localizados em
capitais e grandes centros. Muitos desses serviços estão sobrecarregados em
termos de demanda de pacientes. Adicionalmente, a política de saúde pública
prega o fechamento de leitos em hospitais psiquiátricos e abertura de novos CAPs para crianças e adolescentes. Todavia, apenas aquela
ação política tem sido feita. Não tem havido abertura de novos leitos e
serviços em Psiquiatria da Infância e Adolescência e a tendência é que os
poucos leitos existentes sejam fechados devido a questões de natureza política
e ideológica e não técnica. Sabe-se que o bullying é um fenômeno que ocorre
em todo o mundo e pode ter consequências devastadoras
para a saúde física e mental do envolvidos. Contudo, assim como ocorre em
vários outros fenômenos comportamentais estudados em saúde mental, a
caracterização do bullying pode vir a ter um componente subjetivo
importante. As vítimas de intimidação sistemática, as quais, teoricamente,
seriam as maiores interessadas na caracterização do bullying, podem vir a desistir de
procurar ajuda pelos mais diversos motivos. Além disso, há práticas que pode
vir a ser caracterizadas como intimidação sistemática apenas em certos casos.
Os apelidos, por exemplo, nem sempre são motivo para alguém se sentir ofendido
e a caracterização do bullying,
nesses casos, poderá vir de uma interpretação subjetiva da vítima e de outros
envolvidos. O próprio fato de existir uma Lei para combater a intimidação
sistemática já é um indicativo de quão destrutivas as relações entre os seres
humanos podem se tornar, desde tenra idade. As relações destrutivas de
desigualdade de poder sempre ocorreram, nos mais diversos meios, e sob as mais
diversas formas. Resta saber se a aplicabilidade da nova Lei será suficiente
para amenizar os problemas criados pela intimidação sistemática. Link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13185.htm ![]()
|