Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Março de 2016 - Vol.21 - Nº 03 Artigo do mês
PREVALÊNCIA DE ANSIEDADE PATOLÓGICA EM PORTADORES DE BRUXISMO DE SONO NA REGIÃO DE COARI-AM
Nathalia Marques Santos1,3,
Marianne Ferreira Melo1,3, Sarah Isabela Magalhães Costa1,3,
Aline Maciel Monteiro2,3,4, Claudio Herbert Nina-e-Silva2,3,4.
1:
Acadêmicas de Medicina, Faculdade de Medicina, Universidade de Rio Verde
(UniRV). 2: Professores
de Habilidades Médicas – Comunicação, Faculdade de Medicina/UniRV. 3: Grupo
de Estudo de Neurociências e Saúde (GENS-FAMERV/UniRV). 4:
Laboratório de Psicologia Anomalística e Neurociências/UniRV. Resumo: O objetivo do presente estudo foi verificar a prevalência de sintomas
de ansiedade patológica em moradores de comunidades ribeirinhas da região de
Coari-AM portadores de bruxismo do sono. Participaram do estudo 87 indivíduos
portadores de bruxismo do sono identificados durante a triagem para atendimento
médico-odontológico no decorrer de ação cívico-social da Marinha do Brasil na
região de Coari-AM. Os participantes responderam ao Inventário de Ansiedade de
Beck (BAI). Utilizou-se o teste não-paramétrico de Mann-Whitney para análise
estatística. Os resultados evidenciaram uma relação estatisticamente
significativa entre a ansiedade geral e o bruxismo do sono (p=0.011366). Palavras-chave: Ansiedade. Bruxismo. Medicina
do Sono. 1. INTRODUÇÃO Entre as atividades parafuncionais do sistema
estomatognático, o bruxismo do sono é considerado uma das disfunções mais
prejudiciais na medicina do sono, pois se constitui em um fator de risco para a
desordem temporomandibular e para a dor miofacial (AMERICAN ACADEMY OF SLEEP
MEDICINE, 2005; MANFREDINI et al., 2005). O bruxismo do
sono é um transtorno de movimento relacionado ao sono (AMERICAN ACADEMY OF
SLEEP MEDICINE, 2005). Esse transtorno de movimento relacionado ao sono é uma
atividade parafuncional do aparelho mastigatório que se caracteriza pelos
movimentos de ranger os dentes durante o sono, além do apertamento e desgaste
dentário, caracterizado pelos ruídos e desconforto nos músculos mastigatórios
(FISMER et al., 2008; GONÇALVES; TOLEDO; OTERO, 2010; MAYER; HEINZER; LAVIGNE,
2015). As atividades
parafuncionais do sistema estomatognático são aquelas que envolvem o
acionamento neuromuscular anormal, repetitivo, intenso, inconsciente e sem
objetivo funcional aparente dos grupos musculares e articulações desse sistema
(AMERICAN ACADEMY OF SLEEP MEDICINE, 2005; ALVES-REZENDE et al., 2009). Os pacientes portadores de bruxismo do sono costumam
sentir dor, contratura muscular e/ou cefaléia logo após despertarem. Isso
ocorre devido ao fato de a atividade parafuncional ocorrer com mais intensidade
e freqüência durante o período do sono (MANFREDINI et al., 2004; AMERICAN
ACADEMY OF SLEEP MEDICINE, 2005; MANFREDINI et al., 2005; MACEDO, 2008). A etiologia do bruxismo ainda
não foi totalmente esclarecida, mas acredita-se que esse distúrbio seja causado
pela interação de fatores morfológicos, patofisiológicos e psicológicos
(MACEDO, 2007; MACEDO, 2008; CARVALHO et al., 2008; MAYER; HEINZER; LAVIGNE,
2015). Os fatores morfológicos estão relacionados com a estrutura óssea da
região facial e, no passado, foram considerados como a causa Os fatores patofisiológicos
estão relacionados com distúrbios do sono e são desencadeados por alterações
químicas cerebrais, provocadas pelo uso de medicamentos, drogas, fumo, álcool
e, também, fatores genéticos (MACEDO, 2007; CARVALHO et al., 2008;
ALVES-REZENDE et al., 2009). Os fatores psicológicos
(personalidade, medo, agressividade, frustração, dor e ansiedade) podem
desencadear um aumento da tensão muscular no sistema estomatognático (CARVALHO
et al., 2008; FISMER et al., 2008; MAYER; HEINZER; LAVIGNE,
2015). Desse modo, há evidências de que os fatores psicológicos, tais como
personalidade, estresse e ansiedade, são fundamentais na etiologia do bruxismo
(PEREIRA et al., 2006; GONÇALVES; TOLEDO; OTERO, 2010). Por outro lado, de acordo com
os resultados de um estudo de revisão sistemática da literatura conduzido
recentemente por Manfredini e Lobbezoo (2009), não há evidências contundentes
de que a ansiedade esteja diretamente associada ao bruxismo do sono. A ansiedade é uma reação de
defesa do organismo a ameaças reais ou imaginárias (BARLOW, 2009). Essa reação
de defesa é mediada pela interação entre os sistemas nervoso e endócrino por
meio da chamada resposta fisiológica de estresse, a qual se caracteriza pela
ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenais e da conseqüente liberação de
cortisol e hiperativação do sistema nervoso autônomo simpático. De acordo com a Classificação
Internacional das Doenças, 10ª edição (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1993), a
ansiedade patológica se caracteriza por queixas comuns e contínuas de palpitações,
sudorese, tremores, desconforto epigástrico, nervosismo, tensão muscular,
sensação de cabeça leve e tonturas, entre outros pressentimentos e
preocupações, que levam a um estresse decorrente de um ambiente crônico. Essa
sintomatologia gera sofrimento para o indivíduo e prejuízos no meio social e/ou
ocupacional significativos (SALLES; LÖHR, 2005; FISMER et al., 2008; BARLOW, 2009). Vários estudos têm
evidenciado comorbidade entre a ansiedade e o bruxismo (DUARTE; HÜBNER, 1999;
CARVALHO et al., 2008; MANFREDINI et al., 2004;
MANFREDINI et al., 2005; FISMER et al., 2008; GONÇALVES; TOLEDO; OTERO, 2010).
Por conta dessa constatação, Pereira et al. (2006), sugeriram que o tratamento
do bruxismo requer uma abordagem multidisciplinar, envolvendo cuidados odontológicos
associados ao controle e manejo do estresse e à redução da ansiedade
patológica. Corroborando esse ponto de
vista, Manfredini et al. (2005) afirmam que o êxito no tratamento do bruxismo
está diretamente relacionado a uma conduta clínica que reconheça plenamente os
aspectos emocionais envolvidos no bruxismo. Assim, cabe aos profissionais que
realizam o tratamento do bruxismo levantar informações que promovam a adequada
percepção da natureza transdisciplinar dessa patologia. De acordo com Pereira et al.
(2006), a melhor abordagem terapêutica para o bruxismo é estabelecer uma melhor
qualidade de vida, a partir da conjugação do controle/tratamento odontológico
com a intervenção psicossocial. Fissmer et al. (2008) realizaram um estudo sobre a
relação entre ansiedade e bruxismo em 20 estudantes de Odontologia em Santa
Catarina. Os resultados desse estudo evidenciaram uma relação consistente entre
a ansiedade e o bruxismo entre os participantes. Apesar de ser um transtorno do sono frequente, os
estudos epidemiológicos de prevalência do bruxismo do sono na população geral
são considerados imprecisos (MACEDO, 2008). No entanto, estudos estrangeiros
(MAYER; HEINZER; LAVIGNE, 2015) e brasileiros (PIRES, 2007; MACEDO, 2008) têm
descrito índices semelhantes de prevalência do bruxismo do sono na população
adulta em geral variando de 3% a 12%. Como não há
estudos que tenham investigado a prevalência da ansiedade em moradores de
comunidades ribeirinhas da região de Coari-AM que apresentam bruxismo do sono,
justifica-se a realização do presente estudo em virtude da obtenção de dados
epidemiológicos que podem ser úteis para a implementação de políticas públicas
de saúde voltadas para essas comunidades ribeirinhas da Amazônia. Portanto, o
presente estudo objetivou verificar a prevalência de ansiedade patológica em
bruxômanos das comunidades ribeirinhas da região de Coari-AM por meio da
aplicação do Inventário de Ansiedade de Beck (BAI) durante a realização de
ações cívico-sociais (ACISO) promovidas pela Marinha do Brasil naquela região. 2. MATERIAIS E MÉTODOS A presente pesquisa foi um estudo
de observacional e transversal realizado no decorrer da ação cívico-social
(ACISO) desenvolvida pela Marinha do Brasil nas comunidades ribeirinhas da
região de Coari-AM. Durante a triagem para atendimento na ACISO, os pacientes
que apresentaram diagnósticos prévios de bruxismo do sono (categorias DeCS:
C07.793.099.500; C10.886.659.637; F03.870.664.637), realizados por médicos e/ou
cirugiões-dentistas da rede pública de saúde da região, foram convidados a
participar da pesquisa.
Dos 91
pacientes portadores de bruxismo do sono identificados na triagem, 87
concordaram em participar da pesquisa. Após a leitura e assinatura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido, os participantes responderam à versão
validada em português do Inventário de Ansiedade de
Beck/BAI (CUNHA,
2011). O BAI é composto de uma lista de 21 itens, com escala de quatro
alternativas de respostas que refletem níveis crescentes de ansiedade (BECK et al., 1988; CUNHA, 2011).
A prevalência é uma medida
epidemiológica que mensura a proporção de indivíduos de uma população que
apresentam uma determinada patologia em um momento específico (CENTERS FOR
DISEASE CONTROL AND PREVENTION, 2012). Dessa
forma, a prevalência informa a persistência da ocorrência de uma doença em uma
dada população (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1989, 2006; CENTERS FOR DISEASE
CONTROL AND PREVENTION, 2012). Para calcular a prevalência
de sintomas de ansiedade patológica no grupo de pacientes que apresentavam
diagnóstico prévio de bruxismo do sono, o número de pacientes que apresentaram
escores indicativos de ansiedade patológica no BAI foi dividido pelo número
total de pacientes investigado (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1989). Os dados foram analisados pelo programa Statistica for
Windows 10.0. O teste não-paramétrico utilizado foi o de Mann-Whitney, com
nível de significância p<0,05. 3.
RESULTADOS E DISCUSSÃO A prevalência de sintomas de ansiedade na amostra
investigada foi igual a 83,51% (n=76). Verificou-se a existência de associação
estatisticamente significativa (p=0.011366)
entre ansiedade e bruxismo. Em relação ao nível de ansiedade, verificou-se que
27,63% (n=21) dos participantes obtiveram escores de ansiedade leve, 55,26%
(n=42) dos participantes obtiveram escores de ansiedade moderada e 17,10%
(n=13) dos participantes obtiveram escores de ansiedade severa. Os presentes
resultados que indicaram associação estatisticamente significativa entre a
ansiedade e o bruxismo do sono estão plenamente de acordo com a literatura
relativa ao bruxismo em geral (DUARTE;
HÜBNER, 1999; CARVALHO et al., 2008; MANFREDINI et al., 2004;
MANFREDINI et al., 2005; MACEDO, 2007; PEREIRA et al., 2006; PIRES, 2007;
FISMER et al., 2008; GONÇALVES; TOLEDO; OTERO, 2010; MAYER; HEINZER; LAVIGNE,
2015). Contudo, os
nossos resultados estão em desacordo com os achados de Manfredini e Lobbezoo
(2009) segundo os quais não haveria evidência clínica consistente de relação
entre ansiedade patológica e o bruxismo do sono. Esse fato poderia ser
explicado por eventuais discrepâncias entre as metodologias empregadas em nosso
estudo e nos estudos revisados por Manfredini e Lobbezoo (2009). Afinal, alguns
dos trabalhos revisados por Manfredini e Lobbezoo (2009) utilizaram o
autorrelato como parâmetro para identificação do participante como bruxômano,
ao passo que, no presente estudo, os participantes foram selecionados com base
em diagnóstico prévio de bruxismo do sono realizado por um médico ou um cirurgião-dentista. 4. CONCLUSÃO Os resultados do presente estudo
evidenciaram que a maioria dos participantes identificados como portadores de
bruxismo do sono também apresentou escores de ansiedade patológica de acordo
com o BAI. Sugerimos a realização de
novos estudos que verifiquem quais são os fatores ansiogênicos relacionados à
ocorrência de ansiedade patológica em comorbidade com o bruxismo do sono em
moradores de comunidades ribeirinhas da região de Coari-AM. 5. AGRADECIMENTOS À Marinha do Brasil e ao Exército
Brasileiro pelo apoio e por levarem atendimento médico-odontológico de
qualidade às comunidades carentes da Amazônia. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES-REZENDE,
M.C.R.; SOARES, B.M.S.; SILVA, J.S.; GOIATO, M.C.; TÚRCIO, K.H.L.; ZUIM,
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and Human Services, 2012. CUNHA, J. A. Manual da versão em português das escalas
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2011. DUARTE,
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