Psyquiatry online Brazil
polbr
Volume 22 - Novembro de 2017
Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello

 

Fevereiro de 2015 - Vol.20 - Nº 2

História da Psiquiatria

ALGUMAS OBSERVAÇÕES SOBRE A LOUCURA

Walmor J.Piccinini

Na introdução do seu livro “Madness” A Brief History, Roy Porter começa tentando definir “a verdadeira loucura” cita o sábio Polônio que afirma –“o que não é nada mais do que ser louco”. Cita Shakespeare que afirma: “Não é a loucura, o mistério dos mistérios"? Já o nosso querido Barão de Itararé, nas suas máximas afirma: “Há seguramente um prazer em ser louco que só os loucos conhecem”.

Em artigo publicado na Psychiatry Online Brasil sob o título “Os nomes da loucura” (http://www.polbr.med.br/wal0306.htm) começamos a observar as diferentes denominações da loucura e do louco através dos tempos. Podemos constatar que elas guardam uma relação com as ideias a seu respeito:
Possuídos por espíritos demoníacos.
Mania ou furor insano. (Século V. AC- Euclides, Sófocles) Sofrimento da alma. Perda das Faculdades Mentais.
Louco, lunático, lelé, maniático, tança, vesano, demente.
Alienado, insano (Pinel, Esquirol. Atendimento asilar).
No Brasil colonial e durante parte do Império, a ordem jurídica era determinada pelas Ordenações do Reino e nelas a loucura possuía várias denominações: "desassisados", "sandeus", "mentecaptos" ou "furiosos"; eram ali contemplados ainda os "desmemoriados" e os "pródigos" (Ordenações Filipinas. Dos Curadores que se dão aos pródigos e mentecaptos. Livro 4, título 103).

Com o nascimento da Psiquiatria passamos a observar com mais atenção às manifestações da loucura, a repetição de suas características ao longo dos tempos. Berrios, German, em sua História dos Sintomas dos Transtornos Mentais, observa que os sintomas mentais, na maioria das vezes, são recorrentes e com variações quantitativas no discurso e ações humana. “A descrição final de um sintoma resulta da interação entre um sinal biológico tênue (originado num ponto do cérebro afetado) e estruturas dos códigos psicossociais (ruído) que participam na produção do sintoma.” “É importante à forma na qual os observadores são educados por sua cultura para perceber o transtorno mental”. Este fenômeno leva alguns a afirmar que os sintomas (e as doenças) mentais sejam apenas “constructos” culturais. Berrios ainda afirma que “Não há dúvidas que as variações culturais na apresentação dos sintomas não necessàriamente predominam sobre os sinais biológicos”.

Nem todos pensam assim, voltarei ao tema mais adiante. Quando comecei a pensar neste assunto fui pesquisar na Bíblia e descobrir como a loucura era vista no Velho e no Novo Testamento. O Moacyr Scliar na sua tese de doutoramento examinou as origens da medicina e escreveu: Quatro fases ou períodos são identificados nesta trajetória, que abrange um período não inferior a três milênios:

1. Fase teológica ou bíblica;

2. Fase teológico-filosófica, ou talmúdica;

3. Fase médico-filosófica;

4. Fase moderna.

Tais fases ou períodos correspondem aproximadamente a três modelos de pensamento médico que se sucederam na cultura ocidental: mágico-religioso, empírico e científico. Em cada fase ou período há uma figura polarizadora do pensamento sobre saúde e doença e da prática médica: o sacerdote, o rabino, o filósofo, o médico com formação científica, codificada. (Moacyr J. Scliar) DA BÍBLIA À PSICANÁLISE: SAÚDE, DOENÇA E MEDICINA NA CULTURA JUDAICA Tese apresentada à Escola Nacional de Saúde Pública para obtenção do título de Doutor em Ciências. Orientador: Prof. Luís Fernando Ferreira Rocha da Silva Co-Orientador: Prof. Paulo Ernani Gadelha Vieira Rio de Janeiro 1999



Podemos trazer exemplos da fase teológica ou bíblica. No Velho Testamento temos os episódios de Nabucodonosor condenado à loucura durante sete anos e a trágica história do Rei Saul.

Daniel 4:31-36

"While the word was in the king's mouth, a voice came from heaven, saying, 'King Nebuchadnezzar, to you it is declared: sovereignty has been removed from you, and you will be driven away from mankind, and your dwelling place will be with the beasts of the field You will be given grass to eat like cattle, and seven periods of time will pass over you until you recognize that the Most High is ruler over the realm of mankind and bestows it on whomever He wishes.' "Immediately the word concerning Nebuchadnezzar was fulfilled; and he was driven away from mankind and began eating grass like cattle, and his body was drenched with the dew of heaven until his hair had grown like eagles' feathers and his nails like birds' claws. readHYPERLINK "javascript:void()" more."But at the end of that period, I, Nebuchadnezzar, raised my eyes toward heaven and my reason returned to me, and I blessed the Most High and praised and honored Him who lives forever; For His dominion is an everlasting dominion, and His kingdom endures from generation to generation. "All the inhabitants of the earth are accounted as nothing; But He does according to His will in the host of heaven and among the inhabitants of earth; and no one can ward off His hand Or say to Him, 'What have You done?'

- See more at: http://bible.knowing-jesus.com/topics/Lunatics#sthash.i4sz6UtJ.dpuf

- 1 Samuel 16.14, 16.23

In Samuel (1Sam. 15:1-3.8-9), Saul, o Rei dos Judeus, rebelou-se contra Deus, falhando em seguir ao pé da letra a instrução divina para massacrar os Amalek., tanto os homens como as mulheres, crianças e bebês, gado e ovelha, camelo, jumentos... e não poupá-los. Embora no final ele tivesse destruído todo o povo no fio da espada, ele poupou seu rei, Agag, e poupou o melhor das ovelhas e tudo que fosse bom e não os destruiu. Ele foi denunciado pelo profeta Samuel por seu desafio a Deus. E, logo após isto, assim fomos informados, “o espírito do Senhor abandonou Saul, e um espírito maligno mandado pelo Senhor passou a atormentá-lo”. Como consequência ficou medroso, raivoso, homicida e profundamente melancólico, ele arrastou-se pelo resto do seu governo num estado de intensa perturbação mental, terminando somente com sua morte, auto-infligida no campo de batalha onde ele estava diante de uma derrota inexorável (provavelmente por causa do contínuo desprazer divino)( 1.Sam,31. (Scull)

Um artigo interessante sobre as desventuras do Rei Saul pode ser encontrado em Caroline C Ravello Published: http://www.guardian.co.tt/lifestyle/2014-10-15/madness-recorded-bible


No Novo Testamento há registros ainda mais vivos da loucura, considerada como possessão, com Cristo regularmente sendo retratado expulsando demônios (sete, assim nos contam, de Maria madalena (Mark 16:9; Luke 8:2-3). Numa ocasião especial, há um relato de que Jesus transferiu os demônios para um grupo de porcos: “e após isto, toda a horda de suínos correu violentamente num precipício caindo no oceano, e perecendo em suas águas”. (Mathew 8:32). Com estes precedentes divinos, oração e exorcismo tornou-se uma forma de tratar casos de loucura entre Cristãos e ritos aceitáveis foram elaborados pela Igreja para permitir que padres afastarem o Demônio do seu rebanho.

Bibliografia consultada

  1. Berrios, German: Historia de los síntomas de los Transtornos Mentales. Fundo de Cultura Economica, 2008

  2. Porter, Roy: “A Social History of Madness” Editora WN, NY 1987.

  3. Porter, Roy:” Madness: A Brief History. Oxford U. Press, 2002.

  4. Stone, Michael H.: A Cura da Mente.Editora Artmed, 1999.

  5. Pessotti, Isaias. A Loucura e as Épocas. Editora 34, 1994.


TOP