Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Setembro de 2015 - Vol.20 - Nº 9 Psiquiatria Forense DIVERGÊNCIAS DE ENTENDIMENTO ENTRE PERITO E MÉDICO ASSISTENTE Quirino Cordeiro (1) O Conselho Regional de Medicina do Distrito
Federal publicou manifestação acerca da Consulta No. 41/2014, que versa sobre
divergências de entendimento entre perito e médico assistente, durante a
realização de perícia psiquiátrica. No contexto pericial, as figuras de médico
assistente e perito são completamente distintas, tanto
em suas competências, como nas atividades que desempenham. Ao médico assistente
cabe a realização do tratamento, devendo se empenhar em utilizar todo seu
conhecimento e habilidades para o benefício de seu paciente, com quem mantém
relação de extrema confiança. Por seu turno, ao médico perito cabe responder a
determinadas questões formuladas pela autoridade que o nomeou. Assim, a relação
estabelecida entre perito e periciando não é de confiança mútua, como acontece
na relação médico/paciente, já que o compromisso do perito não é com ele, mas
sim com a autoridade que o investiu da função pericial. Ademais, cabe ao médico
perito, e não ao médico assistente, o enquadramento do quadro clínico do
periciando nas normas legais ou administrativas, que estão em pauta na
avaliação pericial. As diferenças existentes entre as funções de
médico assistente e perito estão estabelecidas na Resolução do Conselho Federal
de Medicina (CFM) No. 1851/2008, que sofreu recente modificação, por meio da
Resolução 2015/2013, bem como no Código de Ética (Resolução CFM No. 1931/2009).
Em seus Princípios Fundamentais, o Código de Ética Médica
estabelece que “o médico exercerá sua profissão com
autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de
sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de
outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa
trazer danos à saúde do paciente”.
Além disso, no Artigo 98 do mesmo Código é vedado ao médico “deixar de atuar
com absoluta isenção quando designado para servir como perito ou como auditor,
bem como ultrapassar os limites de suas atribuições e de sua competência”.
Assim, fica claro que o Código de Ética Médica preocupou-se em determinar que o
médico não pode se submeter a situações que
comprometam a qualidade técnica e os ditames éticos de seu trabalho. Desse
modo, o médico perito goza de liberdade e autonomia para desenvolver seu
trabalho, não devendo, por conta disso, ficar adstrito ao entendimento do
médico assistente do periciando durante seu julgamento pericial. Sobre esse tema, vale ressaltar também a
Resolução 126/05 do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
(CREMESP), que manifesta o que segue em seu Artigo 5o:
“O médico na função de perito não deve aceitar qualquer tipo
de constrangimento, coação, pressão, imposição ou restrição que possam influir
no desempenho de sua atividade, que deve ser realizada com absoluta isenção,
imparcialidade e autonomia, podendo recusar-se a prosseguir no exame e fazendo
constar no laudo o motivo de sua decisão”. Vale ainda destacar Parecer do CFM sobre
a autonomia do trabalho do médico perito (Parecer CFM 9/06), que diz o
seguinte: “Sua autonomia está garantida técnica, legal e
eticamente, tendo a liberdade para conduzir o ato pericial, única forma de
responder com plenitude por infrações no exercício de sua função… O médico
perito deve obedecer às regras técnicas indicadas para o caso… no pleno
exercício de sua autonomia e sempre compromissado com a verdade… O exame
médico-pericial é um ato médico. Como tal, por envolver a interação
entre o médico e o periciando, deve o médico perito agir com plena autonomia”. Asim sendo, diante da marcante diferença entre as
funções e atribuições assistenciais e periciais, podem existir, em determinadas
situações, diferenças de entendimento entre médicos assistentes e peritos, sem
que isso implique necessariamente em desvio técnico, ético ou legal das partes
envolvidas. No entanto, em que pesem todas as
questões aqui apresentadas, que devem ser observadas quando do trabalho do
pericial e assistencial em Medicina, vale ressaltar que, em sendo a perícia
médica um ato médico, o perito pode ser chamado a responder ética, civil e/ou
criminalmente pelos seus atos profissionais. O mesmo extende-se
ao médico assistente, que também pode ser questionado sobre sua prática
clínica. Por conta disso, tanto médico assistente, quanto médico
perito devem exercer seu trabalho, pautando-o em preceitos ilibados de
conduta profissional.
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