![]() ![]() Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Giovanni Torello |
Setembro de 2014 - Vol.19 - Nº 9 COLUNA PSIQUIATRIA CONTEMPORÂNEA SUBMUNDO ACADÊMICO* Luis Vieira Em matéria anterior,
"Qualis sob suspeita" (neste número da Psychiatry On-line), alertamos
sobre a propagação de periódicos questionáveis no sistema acadêmico brasileiro,
sob a chancela da CAPES através da inclusão desses periódicos no Qualis. No
Brasil, assim como no exterior, a publicação de artigos científicos tornou-se a
medida quase exclusiva para o acesso e progressão nas universidades. Com a imitação do
modelo Americano "Publish or Perish", a competição para publicar
artigos foi acirrada no mundo todo. Pressionados por suas instituições, alguns pesquisadores escolhem o caminho mais curto e condenável.
Esse caminho consiste em escolher periódicos cujo tempo para publicação seja
relativamente curto. A maneira que esses periódicos utilizam para oferecer uma
redução do tempo para publicação é através da simplificação do processo de
revisão pelos pares (peer-review-process). Por esse motivo, utiliza-se o
eufemismo questionável para tais periódicos. Em muitos deles, a revisão pelos
pares simplesmente não existe, conforme demonstrado em 2013 por John Bohannon. Com a demanda surge a
oferta. Empreendedores não muito escrupulosos passaram a oferecer o serviço de
publicação de artigos visando em primeiro lugar o interesse monetário e, em
segundo lugar, o interesse científico. Enquanto no sistema tradicional, a receita das editoras provem das assinaturas, no sistema
"open-acess-ouro" ela provem principalmente da taxa de publicação
paga pelo autor ou por sua instituição. Em geral, os valores variam de $ 200
USD até $ 1000 USD por artigo e o tempo de publicação reduzido para poucas
semanas. No Brasil, periódicos questionáveis estão listados no Qualis,
ocultando assim a sua natureza e enganando pesquisadores com pouca experiência,
que são levados a publicar nesses periódicos justamente porque estão listados
pelo Qualis. Convém enfatizar que
com uma revisão superficial ou mesmo nenhuma revisão, o conteúdo científico dos
artigos fica bastante prejudicado. Nos exemplos a seguir, apresentam-se os
riscos que esse atalho representa para a vida acadêmica. DAVID PUBLISHING Uma busca avançada no
Google (scam OR fraud "David Publishing") encontrará muitos websites
alertando que a editora é um embuste (scam) ou uma fraude (fraud). Muitos dos
periódicos dessa editora estão listados no Qualis. Em Fev/2012, Jeffrey
Beall escreveu: http://scholarlyoa.com/2012/02/29/david-publishing-flipping-its-model/ Embora esta editora
alegue estar sediada em Libertyville, Illinois, EUA, ela realmente parece
operar na China. A página inicial mostra uma vista do Parque Industrial
Libertyville, a suposta base de operação, como que para provar que opera nos
EUA. A operação parece ter abandonado Libertyville, e a informação de contato
agora mostra endereço em El Monte, Califórnia. Também é possível que
este website seja uma fraude total. É uma operação chinesa e todas as páginas
do website são lentas para carregar. Poderia ter sido criado principalmente
como um lugar para que os autores chineses obtenham crédito em publicações
estrangeiras. O governo chinês tem programas de incentivo com recompensas
monetárias para estudiosos chineses que publicam no exterior.
Obs. O conceito
Qualis aposto corresponde ao maior dentre as áreas que incluem o periódico, isso
vale também para as tabelas seguintes. SCIENCE PUBLICATIONS O seguintes periódicos estão listados no Qualis, onde convém
notar, a maioria classificada em B2. Uma pesquisa no website da editora, encontrou mais de uma centena de artigos procedentes de
universidades brasileiras, inclusive das melhores posicionadas no cenário
internacional.
O tempo de revisão é
muito curto (4 a 5 semanas), o que é uma característica dos periódicos
questionáveis, além de cobrar $ 525 USD por artigo publicado. Os periódicos
marcados com (*) estão oferecendo uma promoção para artigo
submetidos no mes de Julho de 2014: "There are no article processing
charges for manuscripts that are submitted during July 2014". Será que
veremos pague 1 e publique 2? Esse caso é evidência de como o QUALIS está orientando equivocadamente os pesquisadores
brasileiros. SCIENCE PUBLISHING GROUP Uma busca avançada no
Google (scam OR fraud "Science Publishing Group"),
revela muitas evidências e avisos de que a editora Science Publishing
Group é questionável. Em Jun/2014, Jeffrey
Beall escreveu: http://scholarlyoa.com/2014/06/17/science-publishing-group-publishes-junk-science/ Recentemente tomei
conhecimento sobre o artigo que apareceu no periódico American Journal of
Modern Physics - Modification of Einstein's E = mc^2 to E = 1/22 mc^2. Como
você pode perceber, o artigo "corrige" a
famosa equação da equivalência massa-energia de Einstein. O artigo alega
confirmar a descoberta da natureza da energia escura. Na
minha opinião, este artigo é um excelente exemplo de pseudo-ciência, e
nenhuma editora legítima permitiria tal lixo aparecer em seus periódicos. Em Dez/2013, Martin Rundkvist, arqueologista e editor de um periódico sobre
arqueologia, escreveu o seguinte: http://scienceblogs.com/aardvarchaeology/2012/12/13/nice-try-science-publishing-group/ A Science Publishing
Group é mais um embuste perpetrado por editora de acesso aberto ou imprensa de
vaidade acadêmica. Ontem eles enviaram um convite para submeter artigos,
tornar-me membro de um conselho editorial, ou ainda tornar-me um revisor de um
não especificado conselho editorial. "Junte-se a nós!" Mas eles nem
sequer publicam um periódico sobre arqueologia. O mais próximo que eles possuem
é uma desculpa miserável para um jornal chamado Ciências Sociais. Ele
supostamente serve para tudo, desde a Lei até Antropologia. Os seguintes periódicos da Science Publishing Group contém artigos, cujos autores são de instituições brasileira. O preço cobrado
por artigo publicado é $ 270 USD. No total foram encontradas 42 instituições
brasileiras, inclusive as mais conceituadas. Entretanto, nenhum desses
periódicos está listado no Qualis. O motivo é que os periódicos são
relativamente recentes, sendo que o mais antigo teve início em Nov/2012.
Eventualmente serão listados no Qualis e a publicação em periódicos
questionáveis será reforçada, contribuindo para a baixar
a qualidade das publicações de pesquisadores brasileiros.
SCIENTIFIC RESEARCH PUBLISHING O seguintes periódicos estão listados no Qualis. Uma pesquisa no
website da editora encontrou muitos artigos procedentes de universidades
brasileiras. Com base nos 75 primeiros artigos encontrados, de uma das mais
conceituadas universidades brasileiras, o tempo médio entre o recebimento e o
aceite, o que significa publicação online, foi calculado em 50 dias corridos. A
editora tem um chat online, aparentemente funcionando 24 horas, 7 dias por semana.
Através desse chat, foi descoberto que o preço para publicação no periódico
Open Journal of Physical Chemistry é $ 700 USD.
Dois casos recentes, ilustram a contradição com o comportamento da CAPES, que
ostenta periódicos questionáveis no Qualis, aparentemente sem preocupação com
possíveis perda de credibilidade por parte da Ciência brasileira. Em Jan/2014,
o Reitor da University of Pristina (Kosovo), foi pressionado a renunciar depois
que foi revelado que ele publicou artigos em revistas questionáveis para
atender aos requisitos da promoção a professor titular. Em Fev/2014, um
professor de negócios da Universidade da Islândia, publicou artigos em
periódicos questionáveis, de acordo com a Islândia notícias DV. Depois dos
meios de comunicação islandeses repercutirem a
história, o professor tirou a lista de publicações de seu website que mostrava
inúmeras publicações em periódicos questionáveis. Iceland Professor in
Hot Water for Publishing in Predatory Journals University of
Pristina Rector under Fire for Publishing in Predatory Journals O artigo "Qualis
sob suspeita" vem repercutindo lentamente na comunidade científica
brasileira, possivelmente pelo efeito anestésico da Copa do Mundo. A opção
oferecida por editoras questionáveis é condenável diante das dificuldades na
carreira acadêmica. No Brasil, a formação de 40 mil mestres e 10 mil doutores
por ano pode ser comemorada, por um lado, e questionada, por outro. Como já
indicamos em outro artigo baseado em dados do Centro de Gestão de Estudos
Estratégicos (CGEE) parte crescente desses egressos não está conseguindo
colocação no mundo acadêmico, ou a consegue de forma precária. A política de
editais e programas de curta duração vai resolvendo aqui e ali problemas
imediatos, sem proporcionar uma base estável e duradoura para a atividade
científica no país. * Agradecimentos ao
professor Vinicius Arcaro pelos dados e discussão ![]()
|