Junho de 2013 - Vol.18 - Nº 6 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Junho de 2013 - Vol.18 - Nº 6 História da Psiquiatria A PSIQUIATRIA E SEUS DESAFIOS (1) Walmor J. Piccinini Neste ano de 2013 resolvi voltar a
frequentar o Congresso da Associação Americana de Psiquiatria. Quando comecei
os preparativos, ainda em 2012, estava bastante motivado
pela perspectiva do lançamento do DSM-5 e para rever São Francisco, cidade que
visitei muitas vezes ao longo dos anos. A região do Moscone Center, antes uma
parte degradada da cidade, é agora, um centro cultural com praças, cinemas,
museus e agradável de caminhar. A única coisa que não mudou foi o clima, agradável,
mas frio, muito parecido com Porto Alegre. O Congresso
foi realizado nos dias 18 a 24 de maio de 2013 e sobre sua organização coletei
algumas informações. O
Congresso faz reservas pelo menos dez anos antes para obter o espaço necessário
para as atividades e vagas nos hotéis. A APA procura estabelecer uma relação
geográfica entre as reservas e o local do encontro. São necessários sete mil quartos
em hotéis para os congressistas, equipe e exibidores. Dentre os
expositores, o maior espaço é utilizado pela editora da APA. São necessárias de
100 a 135 salas para as sessões científicas. Geralmente são utilizados 50
funcionários extras. Também são locados 50 ônibus. Um fato que merece
destaque é que inúmeros imigrantes que fizeram carreira nos Estados Unidos se
tornaram presidentes da Associação. Quem presidiu o congresso foi um médico
psiquiatra originário da Índia, pessoa gentil, de fino trato e competente.
Resolvi traduzir seu discurso de abertura para que os leitores tomem
conhecimento de suas ideias e ao mesmo tempo tenham uma ideia de como funciona
a Associação Americana de Psiquiatria. Discurso de
Abertura do Presidente Dillip Jeste. Muitos anos atrás emigrei para os EUA com três
parceiros, Sonali minha esposa, meu amor pela psiquiatria e meu sotaque indiano. Eu reporto feliz
que nenhum desses parceiros me abandonou. Para alguém criado e educado milhares
de milhas distante, mesmo a ideia de se tornar membro da APA parecia uma fantasia.
Muito mais me tornar presidente. Eu ainda tenho um senso de descrença da sorte
que tive. Este último ano foi incrivelmente trabalhoso, mas um ano fantástico e
de grande privilégio. Eu posso resumir meus sentimentos em três palavras –
gratidão, orgulho e contentamento. Minha gratidão se estende a todos os membros
da APA pela confiança e fé na minha capacidade de dirigir esta maravilhosa
organização representante de 33 mil psiquiatras. A APA é a maior sociedade
psiquiátrica do mundo e a mais antiga organização médica dos Estados Unidos. A APA é um verdadeiro
microcosmo de nosso país. O lema do país “E pluribus unun” significando um de
muitos, reflete os dois, sua diversidade e sua unidade. América não é verdadeiramente um melting pot, mas é mais uma salada
ou um mosaico cultural, no qual diferentes grupos mantém sua unicidade,
servindo a um objetivo comum. Eu penso que o mesmo se aplica para a APA. Os
membros da APA diferem na idade, gênero, etnia, sub-especialidade, na prática, nos pontos de vista políticos, entretanto, todos
estamos reunidos no objetivo comum de promover cuidados médicos da mais alta
qualidade para pessoas com doença mental. A governança da APA é um banco de três
pernas. Que são o Board of Trustees que é dirigido pelo presidente e a Assembleia, que
representa as raízes da democracia, começando nos ramos distritais, e o Staff, Estes três componentes necessitam
trabalhar em conjunto para servir aos membros que por sua vez servem aos
pacientes e suas famílias. Um ano atrás, como presidente eleito, eu jurei focar
na unidade dentro da APA. Eu tenho orgulho de afirmar que no último ano nós tivemos uma unidade exemplar entre o Board of Trustees, Assembleia e Staff. Sem esta unidade
não atingiríamos os nossos objetivos. Nós ainda mantivemos uma parceria exitosa
com outras organizações como a AMA e o NAMI. Eu espero que esta unidade
continue no futuro. Eu desejo a agradecer especificamente a algumas pessoas. Estou
agradecido ao meu antecessor John Oldhan, MD e meu sucessor
Jeff Liberman, MD, pela sua ajuda incrível no ano que passou. Ambos são
amigos de longa data e distinguidos colegas antes disso, e agora nós estamos
ainda mais unidos. Eu devo muito aos meus mentores, dois dos quais podem estar
assistindo esta reunião do céu- o falecido Dr. N.S.Vahia e Richard Jed Wyatt. Eu também desejo
agradecer aos meus colegas, alunos e staff da Universidade da Califórnia San Diego por me permitirem
utilizar tempo trabalhando na APA. Eu desejo agradecer especialmente ao meu
diretor Lewis Judd, MD. Last but not least, eu desejo expressar minha satisfação pela minha família e
amigos. Minha mulher Sonali é uma super mulher. Uma completa psiquiatra infantil e uma
maravilhosa mãe, ela faz tudo. Eu fico feliz por ser um homem por trás de uma
mulher de sucesso, na verdade acrescento, três mulheres de sucesso, incluindo nossas duas filhas. Shafali é uma neurologista infantil
e Neelum está completando a residência em pediatria. Entre elas,
estas três mulheres participaram de quatro maratonas e quatro caminhadas de 60 milhas para pesquisa
de câncer de mama.. Elas tem sido minhas amigas,
orientadoras, filósofas e chefes. Esta injusta balança de gêneros em nossa
família começou a ser corrigida pelo acréscimo de Richard, Nischal, e Kiran. Somando-se ao seu
trabalho diário, Richard e Shafali administram uma
organização sem fins lucrativa chamada ACEing Autism, que ensina tênis para crianças com autismo com o objetivo
de melhorar suas habilidades motoras, e mais importante, suas habilidades
sociais. Eu desejo mencionar vários outros membros da minha família que estão aqui Vijay, Reshma, Vikram, Maya, Leena, e seus esposos. Eu tenho orgulho de ser
psiquiatra. Mesmo a psiquiatria não sendo a mais lucrativa disciplina médica,
estudos mostram que os psiquiatras estão no topo ou próximo dele das especialidades
médicas em termos de satisfação no trabalho. Esta satisfação profissional está
relacionada ao cuidar dos mais deslocados indivíduos do mundo. No ano que passou, nós
realizamos duas tarefas maiores com impacto em longo prazo; completar
e aprovar e publicar o DSM-V, e a seleção do novo CEO/Medical Director. Em relação à primeira tarefa – Eu estive envolvido com o DSM-5 quase desde o início da sua concepção.
Eu fui membro da Força Tarefa original, e Diretor do Grupo de Trabalho dos
Transtornos Neuro-cognitivos. O trabalho do DSM-5 foi desenvolvido por
especialistas voluntários de todo mundo. Tem havido um interesse público sem
precedentes e um escrutínio da mídia sobre o DSM-5. Meu trabalho como
presidente foi assegurar a finalização do texto, e sua aprovação pelo Board of Trustees. Isto requereu
coordenação e colaboração do grupo de trabalho do DSM-5, de 13 grupos de
trabalho com cerca de 10 membros cada, e quatro comitês independentes de
revisão, mais especialistas em critérios, codificação e trabalhos de campo. Estes
grupos nem sempre concordavam um com os outros. Em cima disto, a APA
disponibilizou online rascunhos com os critérios do DSM-5 para a comunidade
externa para sua revisão e recebeu 23 mil comentários públicos. Como juntamos todas estas
fontes e chegamos a um consenso! Nós criamos um grupo de sumário (Summit Group) com representantes
dos vários grupos envolvidos para trabalhar juntos, Tivemos vários encontros,
bem como longas conferências online com momentos em que 35 pessoas participavam. Não foi fácil.
Houve debates intensos, mas, todos queríamos a mesma coisa – um manual
de diagnóstico clínico que refletisse a melhor ciência conhecida nos dias
atuais. O DSM-5 está publicado. Queremos destacar Davi Kupfer, MD, O Diretor da
Força Tarefa do DSM-5, e também par Daniel Regier, MD, MPH, o Vice-diretor. Esperamos que o DSM-5 nos
leve a diagnósticos mais acurados, melhor acesso a serviços de saúde mental, e melhore o resultado dos pacientes.
Naturalmente, com os avanços científicos ele necessitará revisões. A Ciência
não deve ser paralisante, muito menos a medicina. Em relação à segunda tarefa- escolher o
próximo CEO/Medical Director da APA – Jay Scully, MD, irá se afastar no final deste ano após 12 anos de um
incrível serviço. Jay liderou a Associação através da confecção do DSM-5, na construção
do Mental Health Parity Act, na reorganização da APA e seus componentes, e na relação
próxima com várias outras sociedades. Jay fez um melhor trabalho na
administração do orçamento do que nosso governo e o congresso. Jay deixa a APA mais forte do
que quando começou. Nós vamos sentir a perda da sua liderança,
entusiasmo e dedicação aos nossos membros e seus pacientes. No ano passado eu
formei um comitê de busca incluindo grandes líderes da psiquiatria, liderados
por Paul Appelbaum, MD, um distinguido ex-presidente da APA. O processo
eletivo transcorreu com eficiência. O Board Of Trustees selecionou um destacado
sucessor para Jay: Saul Levin, MD, MPH. Saul tem uma longa história na APA, serviu na
Delegação da APA junto a AMA, no Political Action Comittee Board e no Comitê de Programação
Científica. Saul é no momento o Diretor Interino do Departamento de Saúde do
Distrito de Columbia. Ele foi, previamente
o Vive-Presidente de Ciências, Medicina e Saúde Pública da AMA. O conhecimento na
Informação eletrônica em Saúde, trocas e implementação
do Affordable Care Act, mais sua provada liderança em grandes
organizações vem bem à mão, na medida em que nos adaptamos e assumimos um papel
de liderança na reforma da saúde mental. Somando-se a estas duas
maiores tarefas, a APA realizou um destacado trabalho em outras maneiras.
Permitam-me sumarizar algumas destas atividades e seus resultados. Uma importante tarefa
envolveu uma disputa contra companhias seguradoras, que estavam descriminando
contra pessoas com doença mental diminuindo seus
benefícios. Nós vencemos várias destas batalhas, mas não descansaremos até
existir uma paridade em saúde mental. A APA continua a defender um melhor
reembolso do tratamento psiquiátrico pelo Medicare e Medicaid. Nós estamos vigilantes com
os desdobramentos da reforma da saúde. No primeiro dia de
atividade participei de um debate com o Dr. Dillip Jeste sobre o Futuro da
Psiquiatria. Achei curioso, pois há 17 anos havia participado de debate
parecido no Congresso de New York. Era
uma sala pequena e o debate era estimulado pelo presidente. Interpelado a
explicar o porquê da minha presença, falei que estava curioso em debater o
futuro da especialidade e comparar com outro debate sobre o futuro. Parece que
eu era o único com esta experiência, consequência da longa vivência
psiquiátrica. Espero no próximo artigo estabelecer comparações. Publicamos na
Psychiatry Online Brasil "A Psiquiatria em Transformação ou A Visão de uma
Nova Psiquiatria". Junho de 2001 Vol6 n6. Segundo o Dr. Jeste, enquanto aos nascidos no
pós- guerra seguirem envelhecendo, o futuro da psiquiatria estará ligado ao
tratamento da população geriátrica. Ele, como psicogeriatra focou a psiquiatria geriátrica como
debate inicial. Plasticidade neuronal, resiliência, otimismo nos permitem a ter
uma ideia positiva sobre o envelhecimento. Contrariando antiga crença, o MRI
estrutural nos mostra que o cérebro pode sofrer mudanças depois dos 20 anos. A
isto se somam estudos que idosos reportam uma melhora no seu bem estar mental e
felicidade, mesmo com o declínio do bem estar físico. Ele fala de
uma “psiquiatria positiva” cujos esforços demonstram que otimismo, resiliência,
engajamento social, e a sabedoria que vem com a idade pode desempenhar um papel
no aumento da felicidade. A
plasticidade continua mesmo na velhice. Isto significa que as psicoterapias
psicossociais e mudanças, podem de fato alterar a estrutura do cérebro mesmo na
velhice. Como definir
a psiquiatria: primariamente, a psiquiatria está dirigida ou focada no
diagnóstico e tratamento da doença mental. Este é o nosso trabalho principal e
devemos continuar a fazê-lo. No futuro nosso trabalho deverá ter maior alcance.
Se assuntos como otimismo, resiliência e engajamento social pode reduzir a mortalidade
e melhoram as perspectivas de melhorar das doenças, nós desejamos fazer parte
desta luta. Quem teria melhor condição de ensinar as pessoas acerca do
otimismo, resiliência e engajamento social do que os psiquiatras. Dr. Jeste
afirma que o psiquiatra não deve se contentar em tratar sintomas e prevenir
recorrência. O psiquiatra deve ir alem do controle dos sintomas. Da plateia
veio à observação que a psiquiatria só poderá atingir este ponto na medida em
que a neurociência defina a mente. É necessário o conhecimento da psicofisiologia. Como a psiquiatria
irá se diferenciar da neurologia e surgiu o argumento de que ao serem descobertos os mecanismo de doenças tipo Alzheimer, o
transtorno passa a ser dos neurologistas em vez dos psiquiatras. Como teria acontecido
com a epilepsia por ex. O psiquiatra
trata das pessoas mais desintegradas da sociedade. Tem que enfrentar o estigma
que atinge a ele e ao paciente. Nos
congressos de antigamente a área da indústria era atrativa pela farta
distribuição de brindes, recreação etc. Isto mudou muito, a presença da
indústria foi relativamente pequena, predominavam as livrarias e recrutadores
de psiquiatras. Vários
hospitais tinham representantes oferecendo oportunidades. Governos estaduais
recrutando. Forças armadas e até da Nova Zelândia havia oferta de trabalho. É
claro que uma das exigências era ter a certificação pelo Board Americano. Na área de
equipamentos as vedetes eram os aparelhos de TMS. Alguns novos medicamentos e
um me chamou atenção pelo custo. O Aripiprazol injetável, uma ampola por mês,
custa apenas US$ 1.400,00 a ampola.
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