Novembro de 2013 - Vol.18 - Nº 11 Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello |
Novembro de 2013 - Vol.18 - Nº 11 Psiquiatria Forense PERÍCIA DE RECONSIDERAÇÃO NO INSS: QUEM DEVE FAZER? Quirino Cordeiro (1) No mês de abril deste ano, publicamos Artigo que
tratava de Parecer do Conselho Federal de Medicina (CFM) sobre a eticidade de um mesmo médico que emitiu parecer negativo de um benefício
participar de uma junta recursal do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)
(Processo-Consulta CFM No. 3111/09 - Parecer
CFM No. 03/2010). A consulente, que é médica perita do INSS, fez o seguinte questionamento
ao CFM: “Considerando ser a junta
médica um recurso para que seu solicitante tenha direito a uma nova opinião
dada por um conjunto de dois ou mais médicos, referindo-me especificamente à
Junta de Recurso do INSS, onde o segurado solicita este procedimento após ter
sua solicitação de benefício negada em Perícias Médicas precedentes; pergunto:
É ético que este ato médico seja realizado por dois Peritos Médicos que
realizaram seus dois últimos exames?; O direito
do paciente (segurado) a uma nova opinião estaria sendo respeitado desta
forma?”. Diante do questionamento exposto, o Conselheiro Relator do CFM, Dr.
Gerson Zafalon Martins, fundamentou seu Parecer do seguinte modo: “Recurso
significa o remédio legal direcionado a uma instância superior que tem por
escopo provocar a reforma de uma decisão desfavorável aos interesses de uma das
partes. O Código de Ética Médica estipula ser vedado ao médico deixar de atuar
com absoluta isenção quando designado para servir como perito ou como auditor,
bem como ultrapassar os limites de suas atribuições e de sua competência. Para melhor ilustração, como
analogia, podemos utilizar o Código de Processo Ético-Profissional, que prevê
no seu artigo 41 o impedimento, em processos ético-profissionais e
sindicâncias, de Conselheiro que tenha interesse direto ou indireto na matéria
ou que tenha participado como perito, testemunha ou representante. Por
conseqüência, entendo não ser ético o médico, que atuou anteriormente como
perito e que emitiu parecer negativo de um benefício, ser o responsável pela
análise de eventual recurso. Neste sentido, o direito do segurado a uma nova
opinião não estaria sendo respeitado, visto que o recurso estaria sendo julgado
por médico impedido”. No entanto,
neste ano de 2013, foi realizada consulta ao Conselho Regional do Estado de São
Paulo (CREMESP), versando sobre a mesma temática, ou seja, sobre a eticidade de o médico perito, que
emitiu parecer negativo sobre a solicitação de um benefício do INSS, participar
da perícia de pedido de reconsideração do segurado (Consulta Nº 65.206/2013). “O
consulente Dr. A.J.T.A., solicita parecer do CREMESP sobre a possibilidade de
caracterização de ilícito ético diante das modificações da IN/INSS/PRES Nº
45/2010, editada em 01/02/2013, que permitem a realização de perícia médica de
PR (Pedido de Reconsideração) pelo mesmo perito que realizou a avaliação
anterior e indeferiu o benefício pela não constatação de incapacidade laboral.
Afirma que seus colegas
argumentam que a possibilidade de ampla defesa e contraditório estariam
prejudicados, assim como não seria ético realizar uma nova avaliação pelo mesmo
perito, sem que o segurado tivesse a oportunidade de uma segunda opinião.
Baseiam-se no Processo
Consulta nº 3.111/09 - CFM (03/10), da lavra do Conselheiro Relator Gerson
Zafalon Martins, que trata de RECURSOS realizados na forma de JUNTA MÉDICA,
cuja composição é de peritos que já indeferiram o benefício requerido”. A
referida mudança na Instrução Normativa do INSS foi a seguinte (INSS/PRES Nº 64):
“Art. 278. Sem prejuízo do disposto no parágrafo único do art. 274, da
conclusão médico-pericial contrária à existência de incapacidade laborativa caberá
Pedido de Reconsideração (PR); § 1º O PR será apreciado por meio de novo exame
médico-pericial em face da apresentação de novos elementos por parte do
segurado, podendo ser realizado por qualquer perito médico, inclusive o responsável
pela avaliação anterior”. Assim sendo, diante
dessa consulta, o CREMESP, por intermédio de sua Câmara Técnica de Medicina do
Trabalho e Perícia Médica, manifestou-se do seguinte modo: “Concluímos que o
Processo Consulta nº 3.111/09 - CFM (03/10) trata de recursos relacionados
à Junta Médica, onde não poderá ter como participante o perito responsável pelo
indeferimento do benefício anterior. Já para os casos de Pedidos
de Reconsideração de Benefício, o periciando poderá ser reavaliado pelo mesmo
perito responsável pelo indeferimento do benefício anterior.
Considerando que a Norma
estabelece como condição para o pedido de reconsideração (PR) a existência de
fatos novos, não há impedimento ético para que o mesmo perito realize essa
reavaliação. No entanto, não havendo fatos novos, o perito
deve avaliar a possibilidade de considerar-se impedido, vez que seu parecer
ocorreu levando em conta o quadro apresentado pelo periciando e já submetido à
Perícia”. Desse modo, pode-se
perceber que o Parecer do CREMESP diferenciou duas situações recursais
supostamente distintas para o julgamento da eticidade do ato pericial, ou seja,
“recursos relacionados à Junta Médica” e “casos de pedidos de reconsideração de
benefício”. No entanto, de maneira interessante, apesar de avaliar consulta
concernente à participação do perito em junta médica pericial recursal, o
Parecer do CFM manifestou-se de maneira global sobre o tema, sem especificidades:
“…entendo
não ser ético o médico, que atuou anteriormente como perito e que emitiu
parecer negativo de um benefício, ser o responsável pela análise de eventual
recurso”. Assim, parace existir diferenças entre as manifestações dos dois
órgãos sobre o tema, em que pese o fato de o CREMESP aparentemente não
reconhecê-las diferentes. Ademais, o
CREMESP também aparenta diferir do CFM ao estabelecer como critério de
eticidade para que um perito participe de uma avaliação pericial recursal de
segurado a quem já havia negado benefício, o fato da existência de fato novo no
pedido de reconsideração do periciando. Apesar de parecer louvável a tentativa
do CREMESP de estabelecer critérios para avaliação de imparcialidade,
parece-nos frágil neste caso específico. Aqui, é importante que fique clara a
importância da imparcialidade do perito, bem como a ausência total de suspeição
sobre sua conduta em qualquer situação. Qualquer questão que possa comprometer
a imparcialidade do perito deve ser identificada, colocando-o sob suspeição. A imparcialidade é o
maior bem do perito, é garantida por Lei, pois sem ela a Justiça não é feita. Assim,
o perito deve sempre atentar mesmo para questões mais subjetivas, que possam influenciar
sua prática pericial. Nesse cenário, os psiquiatras forenses José Geraldo Vernet Taborda e Júlio Arboleda-Flórez, em texto que aborda
aspectos éticos da prática pericial, descrevem bem essa questão: “por neutralidade,
entende-se tanto uma condição objetiva de ausência de qualquer interesse no
caso em julgamento, quanto especial atenção às questões subjetivas,
principalmente às de natureza contra-transferenciais” (1). Desse modo, podem
ser temerosas posturas mais lenientes nessa área de atuação médica. Referências bibliográficas: 1- Taborda JGV, Arboleda-Flórez J. Ética em psiquiatria
forense: atividades pericial e clínica e pesquisa com prisioneiros. Revista Brasileira de Psiquiatria, 28(2), 86-92, 2006.
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