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Abril de 2013 - Vol.18 - Nº 4
Editor: Walmor J. Piccinini - Fundador: Giovanni Torello

 

Abril de 2013 - Vol.18 - Nº 4

Psiquiatria Forense

NOVOS PERITOS TÊM QUE SER NOMEADOS EM CASO DE REAVALIAÇÃO PERICIAL

Quirino Cordeiro (1)
Hilda Clotilde Penteado Morana (2)
(1) Psiquiatra Forense; Professor Adjunto e Chefe do Departamento de Psiquiatria e
Psicologia Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo;
Diretor do Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental (CAISM) da Irmandade
da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo;
(2) Psiquiatra Forense; Perita do Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo;
Doutora em Psiquiatria Forense pela USP; Psiquiatra do CAISM da Irmandade
da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.


A situação de reavaliação pericial acontece com freqüência em casos de perícias previdenciárias. Isso porque, caso o periciando acredite que seus direitos não foram atendidos por determinado perito, pode solicitar recurso da decisão, situação na qual nova avaliação pericial será providenciada.

Diante do quadro descrito acima, o Conselho Federal de Medicina (CFM) foi questionado, por meio do Processo-Consulta CFM No. 3111/09 sobre a eticidade de um mesmo médico que emitiu parecer negativo de um benefício participar de uma junta recursal do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A consulente, que é médica perita do INSS, fez o seguinte questionamento ao CFM: “Considerando ser a junta médica um recurso para que seu solicitante tenha direito a uma nova opinião dada por um conjunto de dois ou mais médicos, referindo-me especificamente à Junta de Recurso do INSS, onde o segurado solicita este procedimento após ter sua solicitação de benefício negada em Perícias Médicas precedentes; pergunto: É ético que este ato médico seja realizado por dois Peritos Médicos que realizaram seus dois últimos exames?; O direito do paciente (segurado) a uma nova opinião estaria sendo respeitado desta forma?”.

Em resposta à referida consulta, o CFM emitiu o Parecer CFM No. 03/2010, que teve como Conselheiro Relator o Dr. Gerson Zafalon Martins. Tal Parecer começa sua fundamentação definindo a situação recursal como sendo um “remédio legal direcionado a uma instância superior que tem por escopo provocar a reforma de uma decisão desfavorável aos interesses de uma das partes”. Na seqüência, deixa claro que o “Código de Ética Médica determina ser vedado ao médico deixar de atuar com absoluta isenção quando designado para servir como perito ou como auditor, bem como ultrapassar os limites de suas atribuições e de sua competência”, estando tal normatização presente em seu Artigo 98.

O Parecer continua sua exposição, a título de ilustração, fazendo uma analogia da questão ora discutida com o Código de Processo Ético-Profissional médico, “que prevê no seu artigo 41 o impedimento, em processos ético-profissionais e sindicâncias, de Conselheiro que tenha interesse direto ou indireto na matéria ou que tenha participado como perito, testemunha ou representante”.

Assim sendo, o Conselheiro Relator do Parecer ora apresentado declara “não ser ético o médico, que atuou anteriormente como perito e que emitiu parecer negativo de um benefício, ser o responsável pela análise de eventual recurso”, isso, pois o perito poderia estar em situação de conflito de interesse. Por fim, o Parecer conclui dizendo que, “neste sentido, o direito do segurado a uma nova opinião não estaria sendo respeitado, visto que o recurso estaria sendo julgado por médico impedido”. Desse modo, o CFM considera como fator de impedimento para participação de uma perícia recursal, o fato de o médico perito ter participado anteriormente em perícia que negou benefício previdenciário ao periciando.

No entanto, talvez valesse a pena o Parecer CFM No. 03/2010 ter avançando nesse ponto de busca pela imparcialidade do perito, propondo que peritos que tenham participado no passado de decisões favoráveis ao pleito do periciando também não pudessem participar de avaliações recursais. Isso evitaria também situações de suspeição, pois os novos peritos que avaliariam o recurso do periciando não estariam presos a decisões passadas.

Assim, pode-se perceber que a questão fulcral desse tema é o princípio ético da imparcialidade, que deve nortear a conduta de todo médico perito. A imparcialidade é fator sem o qual não é possível se fazer justiça, que é o compromisso essencial do trabalho do perito. Sobre a relação íntima que se estabelece entre a imparcialidade do perito e a busca pela justiça, os conselheiros do CFM, Dr. Dardeg de Souza Aleixo e Dr. Luiz Salvador de Miranda Sá Junior, colocam o que segue: “a atitude imparcial associada à preocupação com a Justiça é um dos elementos mais significativos da estrutura ética da formação profissional, especialmente dos médicos. Por imparcialidade entende-se a atitude afetiva e cognitiva de não tomar partido em um litígio, que se conserva equidistante dos que conflitam em uma causa qualquer… A imparcialidade é virtude profissional basilar para a ação do perito. A parcialidade sob qualquer forma, desde a tendenciosidade por simpatia à inclinação interessada, objetiva ou subjetiva, deve ser motivo para impedimento ou suspeição de um perito. Enfim, muito mais que na prática clinica, o perito deve estar certo de que não tem qualquer interesse no resultado de sua perícia. Nem parecer que tem” (1, 2). Aqui, vale a máxima clássica que diz que à mulher de César não basta ser honesta, tem que parecer honesta. O mesmo se dá com a prática pericial. O perito deve evitar qualquer situação que possa colocar em risco sua condição ética de imparcialidade. Assim, o perito deve sempre atentar mesmo para questões mais subjetivas que possam influenciar sua prática pericial imparcial. Os psiquiatras forenses José Geraldo Vernet Taborda e Júlio Arboleda-Flórez, em texto que aborda aspectos éticos da prática pericial, sabiamente escrevem que “por neutralidade, entende-se tanto uma condição objetiva de ausência de qualquer interesse no caso em julgamento, quanto especial atenção às questões subjetivas, principalmente às de natureza contra-transferenciais” (3). Apenas assim, o médico perito pode contribuir de fato para a justiça.

Referências bibliográficas:

1-http://jus.com.br/revista/texto/21081/pericia-medica-a-convergencia-entre-a-medicina-e-o-direito
2- Aleixo DS, Sá Junior, LSM. Ética e Perícia Médica. Jornal do Conselho Federal de Medicina. 17(136), 8, 2002.
3- Taborda JGV, Arboleda-Flórez J. Ética em psiquiatria forense: atividades pericial e clínica e pesquisa com prisioneiros. Revista Brasileira de Psiquiatria, 28(2), 86-92, 2006.


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