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Volume 22 - Novembro de 2017
Editor: Giovanni Torello

 

Dezembro de 2012 - Vol.17 - Nº 12

COLUNA PSIQUIATRIA CONTEMPORÂNEA

BURNOUT REVISITADO

Fernando Portela Câmara. MD, PhD
Prof. Associado IMPG, UFRJ
Coordenador do Depto de Informática da ABP


A síndrome de Burnout tem merecido pouca atenção por parte dos gestores da saúde e dos próprios psiquiatras. Como não é letal, não é prioritária, entretanto, é causa de grande sofrimento, desajustes, absenteísmo e afastamento do serviço, afetando especialmente médicos, professores e policiais. Segundo o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o afastamento de trabalhadores por transtornos mentais aumentou 2% em 2011, um total de 12.337 casos, sendo os transtornos mais frequentes a depressão, transtornos de ansiedade, reações ao estresse grave e transtornos de adaptação. No conjunto dos transtornos, a visibilidade da síndrome de Burnout já é notável. Um estudo conduzido na Universidade de Brasília em uma amostra de oito mil professores, em 2010, estimou uma prevalência de 25% dessa síndrome, entretanto, o estudo não apontou um elemento de corte relativo ao tempo de serviço na profissão.

A síndrome de Burnout é uma espécie de exaustão anímica que não pode ser confundida como depressão ou transtornos de personalidade. Ela foi definida há cerca de 40 anos em uma amostra de profissionais de saúde estudada por Herbert Freudenberger, que observou uma significativa taxa de queixas de esgotamento físico e mental entre esses profissionais, e notou que a causa estava relacionada ao tempo de ocupação profissional.

Após mais de uma década na profissão, o médico ou o professor, sempre sobrecarregado e tão pouco valorizado após tantos anos de dedicação ao serviço, começa a mostrar-se desanimado, desmotivado, queixando-se de fatiga, insônia e sonolência diurna. O quadro evolui com descaso pela rotina profissional e com as necessidades pessoais, distanciamento das questões do trabalho e dos colegas, distimia, e por fim comprometimento do rendimento profissional. Essa anedonia é invasiva, e aos poucos também começa a dominar toda a vida do indivíduo, afetando seu lazer e vida familiar e social.

Começam então os sintomas somáticos como dores de cabeça, enxaquecas, palpitações, hipertensão arterial, fadiga, sudorese, mialgias, crises asmatiformes e queixas digestivas, mostrando que o sistema neurovegetativo já está cronicamente afetado. O diagnóstico da síndrome de Burnout não é, contudo, tão simples, sendo necessárias uma boa escuta do paciente, diagnóstico diferencial com depressão e ansiedade, e avaliar com neutralidade e cuidado a história do paciente em seu trabalho, seus sentimentos e perspectivas em relação ao mesmo. Ajuda ainda ao diagnóstico o uso de métodos como a Escala Likert.

Como dissemos, os grupos mais afetado pela síndrome pertencem às áreas da saúde (médicos, enfermeiros, cuidadores), da educação (professores), da segurança (policiais, seguranças, agentes penitenciários), do transporte (motorista de ônibus urbanos), e financeira (bancários). Como apenas uma parte desses profissionais é afetada, existe uma vulnerabilidade na personalidade e fatores de risco associados, mas ainda não temos dados suficientes que esclareçam esses elementos. Em razão disto, fica difícil estabelecer políticas de higiene mental e de ambiente de trabalho que minimizem os riscos.

A vulnerabilidade da personalidade ante ao ambiente competitivo, sobrecargas eventuais de trabalho, metas com prazos a cumprir, etc., é um fator de difícil controle uma vez que não se pode esperar de uma empresa, pública ou privada, um tratamento idealmente humanitário. O indivíduo que teria melhor desempenho em sua linha de vida nesses ambientes seriam aqueles com melhor capacidade de enfrentamento. Tais indivíduos seriam resistentes à essas demandas laborativas em que o elemento emocional está sempre mobilizado, exceto em caso flagrantemente desumanos e com comprovado assédio moral ou sexual. Entretanto, mesmo tais pessoas, submetidas a pressão constante podem sucumbir à exaustão, a menos que tenham ciclos de lazer e descanso em sua atividade. Desse modo, acredito que exigir “tratamentos humanos” por parte das empresas é irrealístico, quando dever-se-ia proporcionar ao indivíduo treinamento de suas defesas psíquicas necessárias, reforço do ego, maior participação na avaliação dos dirigentes, e tempo para uma vida privada prazeirosa.


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