Volume 22 - Novembro de 2017 Editor: Giovanni Torello |
Fevereiro de 2012 - Vol.17 - Nº 2 Artigo do mês
EXPLOSÃO POR BOMBAS E O “PROBLEMA MENTE-CORPO”: TRAUMAS CEREBRAIS ORGÂNICOS X PSÍQUICOS
Carlos Alberto Crespo de Souza 1.
Introdução. Há muito as questões sobre o que é
orgânico e o que é psíquico, mente e corpo, razão e alma ou sentimento, têm
motivado a atenção de pensadores, filósofos e psiquiatras. Supostamente, desde
interpretações duvidosas, alguns textos de Descartes (1596-1650)
transformaram-se num paradigma adotado pela intelectualidade ocidental e
trouxeram ao entendimento comum de que o corpo e a mente eram partes separadas.
A divisão cartesiana foi simplesmente
reproduzida aos milhares, evidenciando o quanto essa interpretação tomou conta
da cultura científica e leiga. Poucos estudiosos colocaram-na em cheque ou
duvidaram de que ele realmente tivesse pensado (e escrito) tal divisão,
exatamente aqueles que se aprofundaram em suas publicações. Registre-se de que
o mais fácil é repetir o que está dito ao invés de investigar, estudar e ir
além do supostamente estabelecido. 1 Sturm e Wunderlich,
considerando as visões de Kant sobre o problema mente-corpo (1724-1804),
evidenciaram que ele nunca admitiu a redubilidade nas propriedades mentais,
porém de substâncias, e suas concepções sobre a possibilidade de uma psicologia
como uma ciência não utiliza ou requer uma explicação mecanicista, porém uma
quantificação do fenômeno. 2 De acordo com Romand,
durante o século Para Kendler,
dentre todas as profissões humanas, a psiquiatria é a mais centralmente
preocupada com a relação entre a mente e o corpo. Na maior parte das interações
clínicas os psiquiatras necessitam considerar tanto as experiências mentais subjetivas
e os aspectos objetivos da função cerebral. 4 Os estudos da
neurociência, segundo Paris, têm contribuído mais ao entendimento do cérebro do
que na determinação das causas dos transtornos mentais. Seu modelo é mais
apropriado aos transtornos mentais graves do que aos mais comuns. Os
transtornos mentais para esse psiquiatra canadense não podem ser reduzidos a
anormalidades nas atividades neuronais; os sintomas psiquiátricos necessitam
ser compreendidos em múltiplos níveis. 5 Segundo Van Oudenhove
e Cuypers, paralelamente a psiquiatria, a “filosofia
da mente” investiga a relação entre a mente (domínio mental) e o corpo/cérebro
(domínio físico). Eles comentam que a estrutura conceitual do “problema
mente-corpo”, como formulada na filosofia analítica contemporânea, contém
implicações muito amplas que alcançam a psiquiatria como uma disciplina
clínica-científica, especialmente para sua autonomia e seu relacionamento com a
neurologia/neurociência. 6 De
acordo com Tress, o debate sobre a questão em torno
se os eventos mentais são ontologicamente independentes da fisiologia cerebral
ou se eles são, de fato, inteiramente determinados por ele, está em discussão
há mais de cem anos. Após descrever alguns aspectos do chamado “problema
mente-corpo”, ele manifesta a importância de considerar duas perspectivas na
psiquiatria: a da visão (nossa) da pessoa em avaliação (perspectiva da terceira
pessoa) assim como a de utilizar nossa sensibilidade empática de maneira a
explorar a experiência fenomenológica da primeira pessoa (visão da própria
pessoa sobre sua condição ou seu problema). Com isso, ele evidencia que o
psiquiatra deve atuar na clínica tendo uma concepção holística do somático e do
psíquico. 7 Segundo Vertztman,
“a perspectiva da primeira pessoa coloca
no centro de suas preocupações a experiência da subjetividade, ou melhor, a
subjetividade como experiência humana irredutível a qualquer tentativa de
objetivação por métodos de quantificação
característicos da perspectiva da terceira pessoa”. 8 A divisão
cartesiana também foi incorporada à medicina e ali se encontra incrustada e
fortemente instalada. Freud, ao admitir transformar seu “Ich”
em “Ego” e seu “Es” em “Id”, assim como “psique” (alma, algo inefável,
borboleta) em “mente” – trocou instâncias ou construtos humanísticos, inteligíveis
e facilmente perceptíveis literalmente como “eu” e “isso” – em palavras neutras
que nada têm a ver com o ser humano. Rendeu-se, pois, à necessidade de ser
aceito pela medicina, a qual não admite a psique ou o psíquico, com o
significado de alma, até os dias de hoje. Quem atende pacientes em psicoterapia
ou em ambulatórios de saúde mental é capaz de reconhecer, facilmente, quando uma
determinada pessoa menciona que ele está sendo dominado pelo “isso”, a
linguagem do inconsciente. Jamais ouvirá que está sendo dominado pelo “id”.
Frases como “Doutor, isso está me
constrangendo”, ou “Isso está me
impedindo de fazer o que é preciso”, ou ainda “O diabo (isso) me domina, não sei como parar” são exemplares de uma
linguagem comum, perfeitamente compreensível e muito significativa da incapacidade
humana em decidir sobre sua vida e subservientes a algo que ignoram
(inconsciente). Com o desaparecimento do “eu” freudiano e
da alma, Kohut veio em auxílio da psicanálise utilizando
o construto “self”, tentando substituir, com essa denominação, o significado do
eu perdido e suas prerrogativas, fundamental ao entendimento das ações humanas.
Sobre essas traduções, Damásio expressou: “a
tradução de termos científicos da língua inglesa para as línguas latinas é um
reconhecido problema. A correspondência da palavra “self” não existe nessas línguas” e, por isso, em
seu novo livro, em edição portuguesa, aceitou que seu editor empregasse a
palavra “eu” quando ele havia escrito “self” nos seus manuscritos Santoro e cols., num excelente artigo,
realizaram um estudo histórico abrangente sobre a localização anatômica da alma
desde o coração, através do cérebro e no corpo inteiro segundo representações
filosóficas, teológicas e científicas desde os egípcios até o período
contemporâneo. Na história, segundo eles, existiram dois conceitos
predominantes e incompatíveis sobre a alma: num, em que o entendimento sobre a
alma era espiritual e imortal e, no outro, entendendo a alma como sendo material
e mortal. Concluíram que seus estudos
foram enriquecedores e que os capacitaram a avaliar o significativo papel que o
conceito de alma desempenhou no desenvolvimento da vida científica, médica e
espiritual ocidental. Mostraram, também, que embora as ideias ou concepções
sobre a alma tenham se alterado bastante através da história, a ideia de uma
alma como sendo algo real e essencial para que uma personalidade possua uma
existência ou identidade permanece infiltrada através de cada período histórico
ocidental. 10 Quando António Damásio publicou seu livro
“O erro de Descartes”, em 1994, descrevendo um caso de traumatismo
craniencefálico grave com repercussões psicológicas e comportamentais
posteriores, a partir daí houve uma abertura de olhos a esse tipo de fenômeno, tanto
é que seu livro foi editado em 38 países.11 Sua repercussão foi
muito grande tanto no meio acadêmico médico quanto na literatura leiga, como se
tais casos nunca tivessem sido percebidos pela medicina anteriormente
(demonstrando o quanto os efeitos psicológicos e comportamentais derivados de
traumas cerebrais não fossem detectados por negação ou absoluta ignorância). Mesmo com o impacto dessa publicação de
Damásio, as estruturas médicas – embora abaladas - não se alteraram. Tal
constatação permitiu questionar por quais razões a medicina levou tanto tempo
em descrever tal fenômeno clínico quando o cérebro sofre algum tipo de trauma cerebral.
Por qual motivo ignorar o déficit de
percepção emotiva – descrito pelo neurocientista português? Ele mostrou que a razão, quando isolada das emoções, torna-se
estéril, sem graça e inconsequente. Ninguém percebeu isso antes, com
inúmeros acidentados por traumas cerebrais durante anos a fio em numerosos
países? E o que dizer das concussões e do silêncio sobre elas e o fato de que
apenas em 2010 nasceu o conceito do que seja um traumatismo craniencefálico? 1,12
Que resistências são essas que têm impedido a compreensão dos traumas
craniencefálicos em suas consequências, mormente as psíquicas ou
comportamentais? Será que a resposta está centrada na impossibilidade de
aceitação pura e simples de que não possuímos sentimentos e que esses não têm
lugar em nosso cérebro? 2.
Breve histórico sobre a
evolução da íntima relação entre os traumas cerebrais orgânicos e psíquicos. Até 1993, de acordo com Bryant e Harvey, apud Crespo de
Souza, os poucos estudos que relacionaram os traumatismos craniencefálicos aos
do estresse pós-traumático não evidenciaram qualquer associação entre ambos. 13
De um lado estavam os traumatismos craniencefálicos de qualquer grau e, de
outro lado, as alterações decorrentes do estresse pós-traumático. Naturalmente,
os pontos de vista antagônicos expressavam uma dicotomia muito clara, bastante
favorecida pelo fato de que a neurologia e a psiquiatria atuavam em campos
distintos, pouco se comunicando entre si, o que, infelizmente, ainda ocorre em
nossos dias no mundo ocidental. De maneira especial as questões
intrigantes mais chamativas diziam respeito aos traumas cerebrais leves ou por
concussão e os quadros agudos ou mais duradouros do estresse pós-traumático. A
sintomatologia em ambas as situações é muito semelhante e, às vezes, de difícil
diferenciação, pois grande parte de seus sintomas são superponíveis 14.
Com a progressão do conhecimento, muitas
das questões foram esclarecidas. A
síndrome pós-concussional decorrente dos traumas leves ou por concussão
- com seus sintomas físicos, sensoperceptivos, cognitivos e emocionais ou
psíquicos que podem perdurar por dias, semanas, meses ou pelo resto da vida -
foi reconhecida. Por sua vez, houve a identificação de que traumas psíquicos de
menor expressão também são capazes de provocar reações estressantes,
diferentemente do que se pensava antes, de que somente as grandes catástrofes
seriam capazes de promovê-las. Outro ponto a merecer correções no entendimento
foi o da concomitância desses diagnósticos. Pensava-se que a amnésia
pós-traumática determinada por traumas encefálicos moderados e graves
“protegeriam” as pessoas atingidas contra as ansiedades específicas
relacionadas com o estresse pós-traumático, fato contestado por estudos posteriores
que identificaram essas reações estressantes mesmo na vigência de perda de
consciência, denominando-as de “resposta estressante atípica”, como se a
pessoa, ao apresentar respostas estressantes, estaria tendo manifestações não
compreensíveis ao entendimento clínico e, por isso, denominadas de “atípicas”. 15 Num caso clínico estudado por Crespo de
Souza e mencionado por ele em Avanços Sua recuperação foi lenta, de anos. Bem
melhor de um modo geral, num determinado momento o pai revelou uma situação que
passou a acontecer com ele: “Uma coisa
notável, do ponto de vista psíquico, é um medo que o leva a travar os músculos
do corpo inteiro, ficar pálido e com suores frios quando em lugares com janelas
de vidro, que reconhece perfeitamente como sendo um medo de cair, embora tenha
capacidade de subir em aviões ou nesses brinquedos de carrossel, com aviões que
sobem e descem, sem problema algum...”. Na interpretação desse caso clínico ficou
evidenciado que, antes da perda da consciência, houve tempo suficiente,
muito rápido, para que o cérebro percebesse as ameaças à integridade pessoal de
Mateus. A representação dessas imagens ameaçadoras (vidros), gravadas em
segundos ou em milésimos de segundo, foi suficiente para promover as
manifestações posteriores de ansiedade autonômicas no seu reencontro com vidros,
caracterizando um transtorno de estresse pós-traumático mesmo que, logo depois,
tenha sofrido um traumatismo craniencefálico grave. Em seus estudos sobre esses
traumas compartilhados, que não foram poucos, Crespo mencionou que nunca foi
constatado tal registro ou observação, fato inquietador sobremaneira. O caso
relatado teria sido único no universo científico médico? Ou existem outros
tantos não mencionados? Se existirem
outros, por quais razões não foram publicados e inseridos nos sistemas de
busca? Bryant, em
recente artigo e já incorporando os últimos conhecimentos, observa que os transtornos do estresse
pós-traumático (TEPT) e os traumatismos
craniencefálicos (TCE) muitas vezes coexistem em virtude de que em grande parte
das vezes ocorrem em experiências traumáticas. Além do mais, ele registra evidências
a sugerir que os TCE leves podem aumentar o risco para o surgimento dos TEPT, e
que os prejuízos secundários aos TCE leves são amplamente atribuídos às reações
estressantes depois do trauma. Outra importante ilação mostrada por ele é o
desafio representado pela possibilidade de que os sintomas pós-concussivos não
ocorram em função dos insultos neurológicos. Desta forma, as evidências estariam
a indicar novas direções no tratamento dos sintomas pós-concussivos,
privilegiando o tratamento dos fatores estressantes, os quais podem otimizar os
efeitos negativos dos TCE leves. 16
Outros
autores, em artigos também recentes, descrevem e reforçam o entendimento já
existente de que os traumatismos craniencefálicos leves e sua síndrome
pós-concussional consequente, as quais, de maneira típica, se resolvem entre
dias ou semanas, podem prolongar-se por semanas, meses ou anos depois da lesão
encefálica. Seus sintomas, além de resultarem das alterações neurológicas,
estão associados com fatores psicológicos. Chegam a questionar se esses
traumatismos craniencefálicos leves são realmente leves como nós pensamos, e se
inclinam em admitir as dificuldades diagnósticas e de tratamento dessas
situações. 17,18,19 3.
Lesões cerebrais
primárias por explosões. Lesões derivadas de
combates e explosões estão aumentando ao redor do mundo. Como tal, os médicos
podem esperar em tratar cada vez mais pacientes com padrões complexos e únicos
de lesões produzidas não apenas por fragmentos e traumas abruptos, mas, também,
pela alta pressão de expansão do ar derivada do centro detonador de uma bomba. 20
De maneira a entender os efeitos
das explosões indutoras de lesões traumáticas cerebrais, o Instituto Nacional
de Saúde dos Estados Unidos realizou um encontro do qual participaram
neurocientistas, engenheiros e clínicos em abril de 2008. 21 As lesões tissulares provocadas pela onda explosiva ou
lesões primárias por explosões podem ser uma importante causa de trauma oculto
ocular, auricular, pulmonar, cardiovascular, musculoesquelético e do sistema
neurológico 20,22. Quanto aos traumas do sistema neurológico, vários
autores apontam que os traumatismos craniencefálicos (TCE) consequentes de
explosões ocorrem através de múltiplos mecanismos. Eles têm sido a maior causa
de mortalidade e morbidade nas invasões do Iraque e Afeganistão, chegando ao
ponto de que sejam reconhecidos como a maior implicação médica. Porém, o que
não está claro é se as lesões primárias pela onda explosiva causam alterações
cerebrais através de mecanismos distintos daqueles que usualmente acometem
civis com TCE e se múltiplas exposições de baixo nível explosivo possam conduzir
a sequelas de tempo mais prolongado. Ao lado dessas constatações, os autores
referem que um dos complicadores nos soldados que sofreram TCE é o fato de que há
elevada prevalência do TEPT. Referem, ainda, que até o presente essa relação
não está esclarecida, o que afeta as estratégias de tratamento e de prevenção. 23,24,25
Otis e cols., ao analisarem as consequências das alterações
encontradas em soldados oriundos do Iraque e do Afeganistão, mostram que, ao
lado dos TCE e do TEPT, eles apresentam ainda outro importante sintoma
complicador: a dor crônica. Os
traumatismos craniencefálicos leves ou por concussão são os mais prevalentes e
têm comorbidade com os transtornos do estresse pós-traumático e da dor crônica.
26 Rosenfeld e Ford acrescentam ainda que outro sintoma comum é a depressão que acompanha esses quadros
determinados pelas explosões, o que se traduz por uma significativa
sobreposição para o diagnóstico ou o entendimento do que está promovendo tal
sintomatologia. 27 McAllister e Stein
mostram que o Departamento de Defesa dos Estados Unidos promoveu um programa
agressivo de investigação para identificar essas questões, com ênfase na
necessidade de distinguir os efeitos dos traumas biomecânicos dos psicológicos.
28 Rona e cols., verificando a
existência de discrepâncias entre os registros de traumatismos craniencefálicos
leves entre as forças militares dos Estados Unidos e do Reino Unidos - expostos
aos mesmos riscos e considerados segundo o mesmo método – com número bem
superior de soldados americanos atingidos, questionaram essas discrepâncias. No
artigo, publicado em 2012, inferiram que, possivelmente, os números de
comprometidos a maior dos soldados americanos foi decorrente de diferentes
métodos na consideração dos desdobramentos dos casos, com avaliações de
mensuração entre incidência ou prevalência. Mesmo assim, deixaram claro que
essa ilação não elimina as diferenças encontradas entre os soldados americanos
e ingleses com o diagnóstico de TCE leves no Iraque e Afeganistão. 29 4.
Comentários. Os
traumatismos craniencefálicos são considerados hoje como a principal causa de
morbidade e mortalidade tanto em países industrializados como Embora essa constatação – reconhecida e
mais do que documentada pelos registros médicos, policiais e da mídia – pouca
atenção tem sido dada aos prejuízos consequentes, de forma especial aos que
atingem ou comprometem o psiquismo ou o comportamento das vítimas. Ou seja,
aqueles relacionados às deficiências inerentes da existência da alma, agora
retratada como mente. A
vida, com suas turbulências usuais e o reconhecimento de circunstâncias nunca
antes devidamente avaliadas ou investigadas, está a trazer novas fontes
(explosões de bombas) capazes de confrontar mais precisamente o que seja um
trauma neurológico e o que seja um trauma psíquico, possivelmente abrindo
portas mais claras ao entendimento desses processos aparentemente distintos. Novamente,
os conflitos armados ao redor do mundo, infelizmente, talvez possam identificar
- como já ocorreu em guerras anteriores - a causalidade de algumas perturbações
mentais, notadamente a difícil diferenciação entre os traumas considerados como
biomecânicos dos psicológicos. Merece registro que essa diferenciação é um
desafio permanente na história da humanidade desde antes de Descartes, e
mencionar que esse desafio está a representar um enfrentamento às resistências
da medicina enquanto se afirma como ciência concebendo o ser humano sem uma
alma e, no contraponto, o reconhecimento da existência da psiquiatria também
como ciência. Dentro do contexto, vale a pena sumarizar
o que pensa Damásio sobre a hipótese da equivalência mente-cérebro. Segundo
esse neurocientista, a ideia de que os estados mentais e os estados cerebrais
são, no seu essencial, equivalentes não é universalmente aceita. De acordo seu
pensamento, os motivos para a relutância em apoiar tal hipótese merecem
análise. Diz ele: “No mundo físico, do
qual o cérebro faz parte inequivocamente, a equivalência e a identidade são
definidas por atributos físicos como massa, dimensões, movimento, carga, etc.
Aqueles que rejeitam a identidade entre os estados físicos e mentais sugerem
que enquanto um mapa cerebral que corresponda a um objeto físico específico
pode ser discutido em termos físicos, seria absurdo discutir o respectivo
padrão mental em termos físicos”. Segue dizendo: “A razão apontada é que até a presente data, a ciência não foi capaz de
determinar os atributos físicos dos padrões mentais, e se a ciência é incapaz
de fazê-lo, então o mental não pode ser identificado
como físico”. Contrapondo-se a esse ideário, eis que diz Damásio em seu
novo livro: “Receio que esse raciocínio
não seja acertado (...). Com efeito,
os estados mentais apenas podem ser apreendidos através do mesmo processo que
os engloba – ou seja, a mente. É uma situação infeliz, mas não revela nada
quanto à condição física da mente, ou à falta dela. Todavia, a situação impõe
grandes qualificações às intuições que podem surgir dela, sendo assim prudente
duvidar da visão tradicional que assume que os estados mentais não podem ser equivalentes aos estados físicos”.
9 5.
Conclusão. Kendler e Campbell propõem um modelo intervencionista (MI)
de maneira a evitar a diversidade de métodos de pesquisa aplicados aos
transtornos mentais que resultam numa confusa pletora de reivindicações de
causalidades. Esse método teria vantagens ao definir o que aconteceria sobre uma intervenção na prática psiquiátrica,
considerando tanto a prevenção e o tratamento das doenças. Nele, além de outras
vantagens apregoadas pelos autores, isso libertaria a psiquiatria de amarras
teóricas evitando os argumentos
metafísicos estéreis sobre a mente e cérebro que têm preocupado o campo de
atuação dos psiquiatras sem nenhum benefício prático.31 Os argumentos desses estudiosos mostram e
procuram qualificar uma visão empírica da psiquiatria, evitando teorizações. Porém,
fica muito difícil escapar do problema mente-corpo tal qual ele se apresenta
nos dias atuais, com novos desafios agora representados pelas explosões,
capazes de afetar tanto a mente quanto o cérebro. Recorrendo a Damásio sobre essa questão
ainda em aberto, ficam consignadas suas palavras: “Por enquanto, a equivalência estado mental/estado cerebral deve ser
encarada como uma hipótese útil e não como uma certeza. Será necessário
continuar a reunir dados que a apoiem e para isso precisamos de uma perspectiva
adicional, que se baseie em indícios da neurobiologia evolutiva secundados por
vários dados da neurociência (a
quarta perspectiva)”. 9 6. Referências. 1. Crespo de Souza CA.
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