Volume 16 - 2011
Editor: Giovanni Torello

Fevereiro de 2011 - Vol.16 - Nº 2

Psiquiatria na Prática Médica

A INTERFACE ENTRE A ANSIEDADE E OS SINTOMAS SOMÁTICOS ( Orgânicos)

Prof. Dra. Márcia Gonçalves

Há um longo tempo  clínicos e especialistas  admitem a correlação entre  sintomas somáticos e a ansiedade.

A ansiedade pode ser produtiva quando canalizada para realizações e impulsiona o crescimento do individuo positivamente e pode ser de valia em todas as circunstâncias da vida quando em um nível modulado pelo equilíbrio.

Em muitos casos, entretanto existe um desequilíbrio entre  a manifestação da ansiedade e  a qualidade de vida. Vamos abordar, simplificadamente, os tópicos relacionados  com os aspectos do adoecer ( sintomas somáticos) e ansiedade.

A ansiedade manifesta-se em três níveis:

1 - O NÍVEL NEUROENDÓCRINO - Efeitos da adrenalina, noradrenalina, glucagon, hormônio anti-diurético e cortizona.

2-  PLANO VISCERAL -  Sistema Nervoso Autônomo (SNA), o qual reage se excitando (sistema simpáticoto) na reação de alarme ou relaxando (sistema vagal) nas fase de esgotamento.

3 - NA CONSCIÊNCIA-  Sentimentos desagradáveis. Através da consciência das sensações fisiológicas de sudorese, palpitação, inquietação, etc.

Os padrões individuais de Ansiedade variam amplamente.

Alguns pacientes têm sintomas cardiovasculares, como:

          palpitações,

          sudorese

          opressão no peito,

          sintomas gastrointestinais

          náuseas,

          vômito,

          diarréia

          vazio no estômago,

          mal-estar respiratório

          tensão muscular exagerada,

          do tipo espasmo,

          torcicolo e lombalgia.

Psicologicamente a ansiedade pode monopolizar as atividades psíquicas e comprometer a 

          ATENÇÃO

          MEMÓRIA

          INTERPRETAÇÃO FIEL DA REALIDADE.

 Na ansiedade normal existe a necessidade fisiológica de adaptação  às diversas circunstâncias de vida do indivíduo como em uma báscula constante.

Na ansiedade patológica existe uma forma de resposta inadequada, em intensidade e duração, à solicitações de adaptação.

As reações do organismo para a adaptação são:

REAÇÂO DE ALARME:

·         aumento da pressão arterial

·         aumento da concentração dos glóbulos vermelhos

·         aumento da concentração de açucar no sangue

·         aumento da frequência respiratória

·         dilatação nos brônquios

·         dilatação da pupila

·         aumento da concentração dos glóbulos brancos

·         ansiedade.

·         aumento  a frequência cardíaca

FASE DE RESITSTÊNCIA

·         atrofia de algumas estruturas relacionadas à produção de células no sangue

·         aumento do cortéx da supra renal

·         ulcerações  no aparelho digestivo

·         irritabilidade-insônia

·         mudanças no humor

·         diminuição do desejo sexual

FASE DE EXAUSTÂO

·         retorno parcial e breve à reação de alarme

·         falha dos mecanismos de adaptação

·         esgotameno por sobrecarga fisiológica

·         morte do organismo

Um determinado estímulo (interno ou externo) funcionando como uma convocação de alarme continuamente, pode favorecer o surgimento da Ansiedade Patológica.

Segundo Kaplan  existe a ocorrência duas vezes  maior no sexo feminino  e se estima que até 5% da população geral tenha Transtorno de ansiedade.

SINTOMAS COMUNS DA ANSIEDADE

A ansiedade aparece como:

          sentimento de apreensão,

          sensação de que algo está para acontecer,

          representa um contínuo estado de alerta

          constante pressa em terminar as coisas

Biologicamente a etiologia da Ansiedade parece estar relacionada com os sistemas:

           Noradrenérgico,

          Gabaérgico e

          Serotoninérgico do Lombo Frontal e do Sistema Límbico.

Pacientes ansiosos tendem a ter:

          Tônus simpático aumentado

          Respondem emocionalmente de forma excessiva aos estímulos ambientais

          Demorando mais a adaptar-se às alterações do SN.Autônomo.

 

 

           CATEGORIAS MAIS COMUNS DE TRASNTORNOS DE ANSIEDADE QUE ENVOLVEM SINTOMAS SOMÁTICOS.

TRANSTORNO DE ANSIEDADE GENERALIZADA

 No DSM.IV ansiedade generalizada é caracterizada como  uma expectativa apreensiva ou preocupação excessiva, ocorrendo na maioria dos dias e com duração de, pelo menos, 6 meses.

A pessoa portadora considera difícil controlar essa preocupação excessiva, a qual é acompanhadas de pelo menos três dos seguintes sintomas adicionais:

          Inquietação,

           Fatigabilidade,

           Dificuldade em concentrar-se,

           Irritabilidade,

          Tensão muscular

          Perturbação do sono

          preocupações  "excessivas", dificuldade em controlá-las... 

          experimentam prejuízo social ou ocupacional por causa disso.

As pessoas com Transtorno de ansiedade generalizada normalmente tem dificuldade em parar de se preocupar.

Os adultos com TAG se preocupam com circunstâncias cotidianas e rotineiras, tais como:

·         possíveis responsabilidades no emprego

·         finanças,

·         saúde de membros da família,

·         infortúnio acometendo os filhos ou

·         tarefas domésticas,

·         consertos no automóvel

·         atrasos a compromissos.

No transtorno de ansiedade  generalizada a intensidade, duração, freqüência da ansiedade e

preocupação excessivas:

          São de difícil controle, ou seja, é difícil evitar que essas preocupações interfiram na atenção e nas tarefas que precisam ser realizadas.

          São desproporcionais ao evento estressor

As crianças com transtorno de ansiedade  generalizada tendem a exibir preocupação excessiva com sua competência ou a qualidade de seu desempenho. Durante o curso do transtorno, o foco da preocupação pode mudar de uma preocupação para outra.

Outros três tipos de Transtorno de ansiedade abarcam as fobias simples que se subdividem em fobia especifica, agorafobia e fobia social. A fobia especifica pode envolver sintomas físicos com alguma frequência.

O DSM-IV Critérios para o diagnóstico de Fobia Específica:

  1. Medo acentuado e persistente, excessivo ou irracional, revelado pela presença ou antecipação de um objeto ou situação fóbica (por ex., voar, alturas, animais, tomar uma injeção, ver sangue).
  2. A exposição ao estímulo fóbico provoca, quase que invariavelmente, uma resposta imediata de ansiedade, que pode assumir a forma de um Ataque de Pânico ligado à situação ou predisposto pela situação.

Nota: Em crianças, a ansiedade pode ser expressada por choro, ataques de raiva, imobilidade ou comportamento aderente.

C. O indivíduo reconhece que o medo é excessivo ou irracional.
Nota: Em crianças, esta característica pode estar ausente.

D. A situação fóbica (ou situações) é evitada ou suportada com intensa ansiedade ou sofrimento.

E. A esquiva, antecipação ansiosa ou sofrimento na situação temida (ou situações) interfere significativamente na rotina normal do indivíduo, em seu funcionamento ocupacional (ou acadêmico) ou em atividades ou relacionamentos sociais, ou existe acentuado sofrimento acerca de ter a fobia.

F. Em indivíduos com menos de 18 anos, a duração mínima é de 6 meses.

G. A ansiedade, os Ataques de Pânico ou a esquiva fóbica associados com o objeto ou situação específica não são melhor explicados por outro transtorno mental

Através da pesquisa científica foram encontradas várias substâncias reconhecidamente eficientes no tratamento do Pânico, da Fobia e da Depressão.

COMPREENDENDO CORRELAÇÃO ENTRE A ANSIEDADE E OS SINTOMAS FÍSICOS SOB O PONTO DE VISTA NEUROPSIQUIÁTRICO:

As amígdalas têm a função de identificar situações de perigo, enviam ao hipotálamo, local de controle global do sistema endócrino, o sinal para que certas reações sejam deflagradas, como por exemplo, a reação de estresse.

Podem ser chamadas de memória do medo pois reconhecem uma ameaça porque são alimentadas pelo Sistema Límbico, a parte do cérebro que constitui uma espécie de banco de memória das ameaças à pessoa, portanto,

 O Sistema límbico :

           Armazena as informações que remetem a temores de nossos ancestrais, como os de animais ferozes, do fogo ou escuridão.

           Registra dados que se referem a experiências em que o medo foi adquirido por aprendizado ou por trauma.

Os fóbicos  apresentariam uma hiperatividade nessa região do cérebro. Esse sistema é  regulado por serotonina e a noradrenalina.

FISIOLOGIA DA RESPOSTA AO ESTRESSE e o SISTEMA NEURO-ENDÓCRINO-IMUNOLÓGICO

Entre 1970 e 1990 – trabalhos entre Sistema Nervoso Central (SNC) e Sistema Imunológico apontaram um correlação entre o  despovoamento celular do timo em ratos, através da indução de lesões no hipotálamo;  lesões destrutivas no hipotálamo dorsal levavam à supressão da resposta de anticorpos.

 Indícios que o hipotálamo seria uma espécie de base de integração entre os sistemas nervoso e imunológico na resposta ao estresse

A partir de 1990 as alterações ocorridas na hipófise também poderiam determinar modificações imunológicas, visto que a extirpação dessa glândula ou mesmo seu bloqueio farmacológico impedia a resposta imunológico no animal de laboratório.

 A resposta imune ao estresse poderia ser entendida como uma  ação conjunta entre o sistema nervoso, sistema endócrino e sistema imunológico.

ESTRESSE E IMUNOLOGIA

Na resposta imune Inicialmente ocorre um aumento nos níveis dos hormônios corticoesteróides (cortisona) secretados pelas supra-renais.

Em estados de agressão o córtex da supra renal  secreta cortisona e a medula da glândula supra renal secreta norepinefrina (noradrenalina).

Nas situações estressoras de tensão e ansiedade a liberação medular privilegia a epinefrina (adrenalina).

Mello Filho - 1992 faz referência a um trabalho onde macacos submetidos a estresse um ocorre um aumento dos níveis de 17 hidroxicorticóides, catecolaminas (epinefrina e norepinefrina), hormônio estimulador da tireóide e hormônio do crescimento, enquanto se observava um decréscimo dos hormônios sexuais, invertendo-se essa situação à medida que o animal se recuperava (Psicossomática Hoje, Artes Médicas).

O sistema imunológico, portanto, parece explicar as interações entre os fenômenos psicossociais aos quais as pessoas estão submetidas e importantíssimas áreas de patologia humana como, por exemplo, as doenças de auto-imunes (auto-agressão), infecciosas, neoplásicas ...

Mori, Kaname e Sumida em  1999 demonstra que o cortisol do plasma aumentou durante estimulação de estresse em gatos, sugerindo que o estresse hipotalâmico induzido é um modelo útil para estudos imunológicos.

Marasanov em 1999 refere um  relacionamento entre falha imunológica e distúrbios emocionais (ansiedade, fobia e depressão), foram identificados em pacientes com câncer de pulmão.

Linn em 1984 encontra função imunológica reduzida em pessoas enlutadas e com graus importantes de depressão avaliados por uma escala.

DISTÚRBIOS SOMATIFORMES

TRANSTORNOS SOMATIFORMES

O endocrinologista canadense Hans Selye (1907-1982) foi o primeiro a pesquisar o estresse na década de 1930. Observou que organismos diferentes apresentam um mesmo padrão de resposta fisiológica para estímulos sensoriais ou psicológicos.

Selye descreveu toda ocorrência do estresse sob o nome de Síndrome Geral de Adaptação, com três fases sucessivas: alarme, resistência , esgotamento . Após a fase de esgotamento, observava o surgimento de algumas doenças, tais como a úlcera péptica, a hipertensão arterial, artrites e lesões miocárdicas.  

São um grupo de distúrbios onde um problema psicológico subjacente causa sintomas físicos angustiantes ou incapacitantes  Uma pessoa com um distúrbio somatiforme pode apresentar vários sintomas sem qualquer evidência de uma causa física (p.ex., dor, dificuldade respiratória e fraqueza).

Apresenta sintomas de uma doença observada em membros da família.

Os pacientes acometidos não tem consciência de que existe uma conexão entre os sintomas e o problema psicológico subjacente.

·         TIPOS DE DISTÚRBIOS SOMATIFORMES .

      Distúrbio de somatização a pessoa passa a apresentar muitos sintomas vagos como:

·         dores não localizadas...

·         Astenia...

·         Dores e barriga,

·         febre inespecíficas...

Os sintomas existem ... Mas não correspondem a nenhuma  síndrome ou patologia específica.

Podemos ainda  encontrar  na interface ANSIEDADE  ~ SINTOMAS SOMÁTICOS :

 Algumas patologias orgânicas guardam um estreita associação com fatores  psíquicos ( funcionais) e são indissociáveis  destes fatores.  São elas:

·         asma

·         colite mucosa

·         colite ulcerativa

·         dermatite

·         urticária

·         cefaléia tensional

Fazem parte de estudos  e pesquisas em todas as partes do mundo pela incontestável correlação.

                                                     DISTÚRBIO DE CONVERSÃO

O indivíduo converte o problema psicológico em um sintoma físico. P.ex. Paralisia de um membro superior ou inferior; surdez ; cegueira ou convulsões simuladas.

 

                                                              HIPOCONDRIA

·         Existe uma obsessão pelas funções orgânicas (p.ex., batimentos cardíacos, digestão e sudorese) e está convencida de que tem uma doença grave quando na verdade não apresenta qualquer anormalidade.

PARA A REALIZAÇÃO DO DIAGNÓSTICO PRECISAMOS:

1-      Eliminar doença física que justifique os sintomas.

2-      Evitar  a realização de exames laboratoriais exaustivos porque podem reforçar na criança a idéia da existência de um problema físico.

3-      Quando uma doença física não é detectada, o médico deve conversar com o paciente  e familiares para tentar identificar problemas psicológicos ou relações familiares anormais que estejam por trás da queixa clínica.

TRATAMENTO

O tratamento é complexo.

A psicofarmacologia (antidepressivos e ansiolíticos),  associada à psicoterapia é fundamental. Outra forma de abordagem de tratamento é a indicação e atividade física constante para melhorar a qualidade de vida do paciente.

 A eliminação total dos sintomas é rara. Alguns indivíduos apresentam uma depressão mais evidente. A somatização tende a oscilar em termos de gravidade, mas ela persiste por toda a vida.

O profissional não pode esquecer que o suicídio é um risco real em adolescentes e adultos com  uma qualidade de vida  muito comprometida. .

 Todas estas afecções guardam uma estreita correlação com  os transtornos  de ansiedade e estão sendo alvo de pesquisas em todos o mundo para uma melhor elucidação dos mecanismos envolvidos.

É sabido que este envolvimento invariavelmente  percorre todo o sistema neuroendócrino e          a complexidade de seu desencadeamento  é alvo de conjecturas e de constructos teóricos os mais variados.

Estes transtornos são notadamente transtornos que necessitam uma abordagem interdisciplinar para  que se possa obter uma melhor qualidade de vida para o paciente.

O custo destes transtornos é  alto na medida que  os pacientes percorrem  vários médicos e especialistas e profissionais de saúde na intenção de minimizar seu sofrimento , muitas vezes não diagnosticado. O custo  em termos de qualidade de vida é incalculável.

Não é incomum os pedidos de aposentadoria por invalidez  oriundos deste tipo de  transtorno e o diagnóstico preciso  muitas vezes só é obtido através após uma longa peregrinação em médicos e laboratórios.

O lucro secundário, seja manipulatório,  em pessoas com transtornos de personalidade, seja para obtenção e  afastamentos e aposentadoria por invalidez não pode ser descartado . Existe a necessidade de uma firme abordagem psicológica com o paciente e coma família para que seja  apreciada esta correlação.

kertesz & kerman apontam as seguintes categorias para serem apreciadas para um tratamento eficaz.

          alimentação

          atividade física regular

          tempo de repouso adequado

          espaço para lazer e diversão

          trabalho que contenha a possibilidade de realização

          inserção a um grupo social

 

BIBLIOGRAFIA :

          Ballone GJ – Psiqweb.med.br. Transtorno de ansiedade.

          Ballone GJ - Transtornos do Espectro Impulsivo-Compulsivo - in. PsiqWeb Internet, disponível em http://www.psiqweb.med.br/, revisto em 2005

          Referência:
Hollander E, Rosen J - Obsessive-Compulsive Spectrum Disorders: A Review Obsessive-Compulsive Disorder, in Mario Maj, Norman Sartorius, Ahmed Oka-sha, Joseph Zohar, Obsessive-Compulsive Disorder (Archive Edition) Series: WPA Series: Evidence and Experience in Psychiatry, Pg. 203-252, 2001

          Mauro Diniz Moreira – Ansiedade.

          Julio de Melo Filho, psicossomática Hoje, Artes Médicas -1992

          Khansari D N, Effects of stress on the immune system - Immunol. Today, v.11, no. 5, p.170, 1990).

          Kaplan Sadock – 6 ed.-A rtes Médicas.

          DSM-IV-R –  www.isam-instituto.com.br

          CID 10 –  www.isam-instituto. com.br


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