Volume 15 - 2010
Editor: Giovanni Torello

 

Março 2010 - Vol.15 - Nº 3

Artigo do mês

ALZHEIMER: STRESS E QUALIDADE DE VIDA DE CUIDADORES INFORMAIS

Adriana Satomi Horiguchi
Marilda Emmanuel Novaes Lipp

RESUMO

Este estudo teve como objetivo comparar os níveis de stress emocional, sobrecarga e qualidade de vida de cuidadores informais brasileiros de pacientes com a Doença de Alzheimerntre com cuidadores de origem nipo-brasileira. Para a coleta de dados utilizou-se um formulário destinado à identificação do paciente (respondido pela cuidadora), um formulário de Identificação destinado às cuidadoras, o Inventário de Sintomas de Stress para Adultos, o Inventário de Qualidade de Vida e o Burden Interview. Os resultados gerais revelaram que 75% das cuidadoras informais apresentavam stress, das quais 70% encontravam-se na fase de resistência. Foi constatado um alto nível de fracasso em qualidade de vida na área da saúde, revelando que esta se encontra afetada. Analisando stress e sobrecarga, verificou-se diferença significativa entre as cuidadoras com e sem stress emocional quanto a saúde, privacidade e sentimento de sobrecarga, sendo que as participantes com stress tinham maiores níveis de sobrecarga. Comparando-se os dois grupos, houve diferença significativa entre as cuidadoras informais brasileiras e nipo-brasileiras no que se refere ao  nível de stress, o grupo das cuidadoras brasileiras revelou maior intensidade do stress em relação ao grupo de cuidadoras nipo-brasileiras.

Palavras- Chave: Doença de Alzheimer, cuidador informal, stress, sobrecarga, qualidade de vida, cultura.

 

ABSTRACT

This study compared the levels of emotional stress, work overload and quality of life of two groups of informal caregivers of patients with Alzheimer’s disease: a Brazilian and a Nippon-Brazilian group.  Data was collected by using a  questionnaire about the patient  ( to be answered by the caregiver), another questionnaire about the caregivers, the Stress Symptoms Inventory for Adults, the Life Quality  Inventory and the Burden Interview. The general results point out that 75% of informal caregivers had symptoms of stress, among those, 70% were in the resistance phase. Quality of life was deficient in the health area, which seemed to be deeply affected. A significant difference was found between caregivers with and without emotional stress for privacy and burden feelings, with the stressed participants claiming higher amounts of burden. Comparing the two groups there was a significant difference between the informal Brazilian and Nippon-Brazilians caregivers in that the Brazilian caregivers showed higher levels of stress intensity in relation to  the Nippon-Brazilian caregivers.

Key Words: Alzheimer’s disease, informal caregiver, stress, burden, life quality, culture.

 

INTRODUÇÃO

A Doença de Alzheimer (DA) é uma doença cerebral degenerativa primária, ou seja, há a evidência de um declínio tanto na memória quanto no pensamento, suficiente para comprometer atividades pessoais da vida diária. A doença tem etiologia desconhecida, apresentando aspectos neuropatológicos e neuroquímicos característicos, já que o transtorno é usualmente insidioso no início e se desenvolve lentamente, porém de forma contínua, durante um período de vários anos (CID 10, 1993).  É nesse cenário que se encontra o cuidador, o qual recebe o papel de servir, dar suporte e apoio ao paciente com a DA. Na literatura gerontológica, o cuidador formal é um tipo de apoio que atua com base em relações profissionais, e o cuidador informal atua a partir de relações de parentesco, amizade e coletivismo (Neri & Sommerhalder, 2006). Na maioria dos casos esse papel cabe a uma mulher casada, que, ou é cônjuge do idoso que recebe os cuidados, ou é a filha. Raramente o cuidador é uma nora ou outro parente e, mais raramente ainda, um homem (Neri, 2007). Independente de quem é o cuidador informal , o ato de cuidar exige  dedicação e esforço,  o que pode gerar stress.

O stress é um desgaste geral do organismo, causado pelas alterações psicofisiológicas que ocorrem quando o indivíduo se encontra forçado a enfrentar uma situação que desperte uma emoção forte, boa ou má, e que exija mudanças. É importante considerar que o stress pode ocorrer com qualquer indivíduo, inclusive com os cuidadores, os quais estão constantemente em contato com diversos estressores do dia a dia (Lipp, 1998). O declínio dos pacientes e o incremento de suas demandas representam importantes estressores para os cuidadores. A carga gerada pela administração de cuidados se expressa de maneira tanto emocional quanto social, econômica e física, gerando nos cuidadores altos níveis de problemas de saúde psicológica e física (Engelhardt et al, 2005).

O burden ou a sobrecarga é um sentimento experimentado, principalmente pelo cuidador, ao realizar uma gama de atividades potencialmente geradoras de stress e efeitos negativos (Luzardo et al, 2006). A dificuldade do cuidar não está somente na realização das tarefas em si, mas também na dedicação necessária para satisfazer as necessidades do outro, em detrimento das suas próprias necessidades (Simonetti & Ferreira, 2008). Por essa razão, tanto a sobrecarga como também o stress são fatores que provavelmente influenciam na qualidade de vida do cuidador de paciente com Alzheimer que, de acordo com a World Health Organization (WHO, 1997) é um estado de completo bem-estar físico, mental e social. 

Outro aspecto importante a ser considerado neste trabalho são os valores culturais. Nas sociedades, principalmente as orientais, um fator a se destacar é a piedade filial (afeto filial). Dessa forma, não somente no Japão, mas nos demais países do leste asiático, o respeito público pelos idosos e o cuidado filial são fortemente enfatizados (Pinto & Neri, 2006). Na tradição japonesa que vigora ainda hoje em alguns grupos de antigos imigrantes no Brasil, cabe ao filho amparar os pais idosos, o que faz da nora uma figura central em relações que se definem mais como dever do que como reciprocidade ou escolha (Neri, 2007).

 

MÉTODOS

Participaram do estudo 20 mulheres que cuidavam de pessoas com o diagnóstico de Doença de Alzheimer (DA). Na entrevista, as participantes foram informadas sobre a pesquisa e solicitadas a assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, explicado pela pesquisadora. A seguir, responderam ao Formulário de Identificação, composto por Ficha de Identificação do Paciente Cuidado e Ficha de Identificação do Cuidador.

Em seguida, aplicou-se o Inventário de Sintomas de Stress para adultos (ISSL), validado por Lipp e Guevara em 1994, e publicado pela Casa do Psicólogo (Lipp, 2000); o Inventário de Qualidade de Vida (IQV), desenvolvido por Lipp e Rocha (1996); e o Burden Interview que é um instrumento padronizado e validado por Scazufca (2002), baseado na versão original de Zarit, Orr e ZaritThe Zarit Burden Interview (1985, citado por Taub et al., 2004).

 Em relação ao IQV, este tem por objetivo avaliar o nível de qualidade de vida dos participantes, considerando o sucesso alcançado pelo indivíduo em quatro áreas denominadas “quadrantes da vida”: social, afetiva, profissional e saúde. O sucesso e fracasso são determinados pela contagem dos itens assinalados em cada quadro de acordo com as normas do inventário. É considerada qualidade total quando existe sucesso nas quatro áreas pesquisadas (Lipp & Rocha, 1996).

Para descrever o perfil das participantes segundo as variáveis em estudo, foi feita uma tabela de frequência das variáveis categóricas (escolaridade, estado civil etc.), com valores de frequência absoluta (n) e percentual (%), e estatísticas descritivas das variáveis contínuas (idade, tempo de cuidado etc.), com valores de média, mediana e desvio-padrão. Para comparar as variáveis numéricas entre dois grupos foi utilizado o teste de Mann-Whitney, devido à ausência de distribuição normal das variáveis. O nível de significância adotado para os testes estatísticos foi de 5%, ou seja, p<0.05. Para análise estatística foi utilizado o programa computacional SAS System for Windows (Statistical Analysis System), versão 8.02.

esultados

A amostra estudada apresentou 20 participantes, sendo 50% (n=10) de nacionalidade brasileira e 50% (n=10) de nacionalidade nipo-brasileira. A idade média foi de 55,2 anos, com desvio-padrão de 8,50, sendo 45 a menor idade e 73 a maior. No contexto profissional, verificou-se que 45% (n=9) eram do lar.  Em relação ao tempo que as participantes cuidaram dos pacientes DA, a média foi de 5,85 anos, com desvio-padrão de 4,12, sendo o tempo mínimo de um ano e o tempo máximo de 15 anos. 

A Tabela 1 apresenta de forma sucinta os dados sócio-demográficos das cuidadoras informais e a Tabela 2 mostra o estágio da DA dos pacientes brasileiros e nipo-brasileiros.

 

Tabela 1. Características sócio-demográfico das cuidadoras brasileiras e nipo-brasileiras

Características Sócio- Demográficas

Brasileira

 

Nipo-Brasileira

 

Total

n

%

 

n

%

 

n

%

Escolaridade

 

 

 

 

 

 

 

 

Ens. Fundam.

4

40

 

5

50

 

9

45

Ens. Médio

1

10

 

1

10

 

2

10

Ens. Superior

5

50

 

4

40

 

9

45

Estado Civil

 

 

 

 

 

 

 

 

Solteira

4

40

 

2

20

 

6

30

Casada

5

50

 

8

80

 

13

65

Divorc/ Separada

1

10

 

0

0

 

1

5

Parentesco

 

 

 

 

 

 

 

 

Esposa

1

10

 

1

10

 

2

10

Filha

8

80

 

6

60

 

14

70

Nora

1

10

 

3

30

 

4

20

Reside com paciente?

 

 

 

 

 

 

 

 

Sim

10

100

 

7

70

 

17

85

Não

0

0

 

3

30

 

3

15

 

Tabela 2. Estágio da Doença de Alzheimer dos pacientes brasileiros e nipo-brasileiros

Estágio DA

Brasileira

 

Nipo-Brasileira

 

Total

 

n

%

 

n

%

 

n

%

Leve

1

10

 

4

40

 

5

25

Moderado

6

60

 

3

30

 

9

45

Grave

3

30

 

3

30

 

6

30

 

Os resultados do ISSL mostram que 75% (n=15) das cuidadoras apresentaram stress. Dentre as participantes, a maioria encontrava-se na fase de resistência com 70% (n=14) e apenas uma pessoa na fase de quase-exaustão. O ISSL total da amostra revela que a média de sintomas foi de 16,30, com desvio-padrão igual a 8,29. Verificou--se também que entre as cuidadoras que apresentaram stress, 40% (n=8) tinham sintomas psicológicos; 30% (n=6) os sintomas físicos e apenas 5% (n=1) apresentaram sintomas físicos e psicológicos ao mesmo tempo. Os sintomas físicos e psicológicos de stress mais frequentes nesta amostra foram: sensação de desgaste físico constante (n=16; 80%); tensão muscular (n=15; 75%); problemas com a memória (n= 14; 70%); cansaço excessivo (n= 12; 60%); pensar constantemente em um só assunto (n=11; 55%); e sensibilidade emotiva excessiva (n=10; 50%).

Os resultados do IQV revelam que a área avaliada com maior sucesso foi a social, com 65% (n= 13), seguida pela área afetiva, com 60% (n=12). Porém, na área profissional, foi observado que o número de participantes com sucesso foi menor, com 40% (n=8). Já na área da saúde a maioria das participantes obteve fracasso (95%). É possível observar que, na comparação dos valores da qualidade de vida, a área da saúde encontra-se profundamente afetada. Com relação aos itens de qualidade de vida mais comprometidos da amostra, destacam-se: não utiliza técnica de relaxamento (n=16; 80%); ter dor de cabeça, não raramente (n=14; 70%); e não faz exercício físico pelo menos três vezes por semana (n=14; 70%).

As análises estatísticas mostraram associação entre qualidade de vida na área social e número de sintomas de stress. O número total de sintomas de stress está relacionado ao fracasso na qualidade de vida social (p= 0,026). Verifica-se que a média das pessoas com sucesso na área social foi de 13,00, com desvio-padrão de 6,47 e mediana de 13,00. Já a média do número de sintomas de stress nas pessoas com fracasso na área social foi de 22,43, com desvio-padrão de 8,16 e mediana igual a 21,00. Esse dado revela que a maioria das participantes com fracasso na área social tinha um maior número de sintomas de stress em relação às participantes que tiveram sucesso nessa área.

Com relação a sobrecarga das cuidadoras, a média do Burden Interview nesta amostra foi de 39,00. Para avaliar a sobrecarga considerou-se a soma dos itens de respostas “frequentemente” e “sempre” no instrumento, dessa foram destacaram os itens: BI 8- “O Sr/sra sente que ele/ela depende do Sr/sra?” (n=17; 85%); BI 9- “O Sr/sra se sente tenso(a) quando ele/ela está por perto?” (n=13; 65%); e BI 14- “O Sr/sra sente que ele/ela espera que o Sr/sra cuide dele/dela como se o Sr/sra fosse a única pessoa de quem ele/ela pode depender?” (n=13;65%).

Na associação entre stress e sobrecarga verificou-se diferença significativa entre os com e sem stress emocional para o item 10: “O Sr/ Sra sente que a sua saúde foi afetada por causa do seu envolvimento com ele/ela?” (média do grupo com stress= 2,87, com DP= 1,41 e mediana= 3,00; média do grupo sem stress= 1,00, DP= 0,00 e mediana= 1,00; sendo p=0,011); item 11: “O Sr/ Sra sente que o Sr/ Sra não tem tanta privacidade como gostaria, por causa dele/dela?”, (média do grupo com stress= 3,80, com DP= 1,42 e mediana= 4,00; média do grupo sem stress= 1,40, DP= 0,55 e mediana= 1,00; p=0,008); e o item 22 do Burden Interview: “De uma maneira geral, quanto o Sr/ Sra se sente sobrecarregado (a) por cuidar dele/dela?”, (média do grupo com stress= 3,13, com DP= 0.92 e mediana= 3,00; e a média do grupo sem stress= 2,00, DP= 1,00 e mediana= 2,00;  sendo p=0,049).

Neste estudo também foi realizada a comparação entre as cuidadoras de origem brasileira e nipo-brasileira. A análise estatística revelou que existe diferença estatística significativa no que se refere à porcentagem de stress do ISSL (p=0,012). O grupo das cuidadoras brasileiras obteve maiores resultados de intensidade do stress em relação ao grupo de cuidadoras nipo-brasileiras. Verificou-se que, no percentual de sintomas de stress no ISSL das cuidadoras brasileiras, a média foi 47,22, com desvio padrão de 13,61 e mediana de 50,00. Já a média de sintomas das cuidadoras nipo-brasileiras foi de 26,85, com desvio-padrão de 11,62 e mediana igual a 25,00.

Os resultados do IQV entre os grupos de cuidadoras revelam que a área avaliada como a de maior sucesso foi a social, tanto no grupo das brasileiras (n=6) como no das nipo-brasileiras (n=7). Na área afetiva, sete nipo-brasileiras e cinco brasileiras obtiveram sucesso. Porém, no âmbito profissional, observou-se que seis cuidadoras, de ambos os grupos, obtiveram fracasso e na área da saúde, o número de participantes com fracasso foi de dez brasileiras e nove nipo-brasileiras.

 

Discussão

Em relação aos dados sociodemográficos as cuidadoras informais desta amostra tiveram resultados semelhantes aos encontrados em literaturas específicas da área. Somente quanto ao nível de escolaridade das cuidadoras chamou atenção o fato de a amostra ter revelado uma divisão entre o ensino fundamental e o ensino superior, o que diferenciou esta pesquisa de outros estudos, em que a escolaridade da maioria concentrava-se no ensino fundamental (Lemos et al, 2006; Luzardo et al, 2006; Scazufca, 2002).  Em relação às cuidadoras que possuíam nível superior, Arruda et al,(2008) observam que essa situação pode favorecer o cuidado prestado, pelo acesso às informações. No entanto, tem-se observado que o stress do cuidar acabou atingindo a todas indistintamente. Verificou-se também que a média de tempo cuidado da amostra foi de 5,85 anos, resultado superior ao obtido no estudo de Lemos et al, (2006), de 4 anos. Nesse sentido, Garrido e Menezes (2004) apontam que quanto maior o tempo de cuidado, maior será também o impacto do cuidador.

O presente estudo também analisou o fator de stress nas cuidadoras e revelou que a média de sintomas foi igual a 16,30, dado semelhante ao estudo de Bandeira, et al, (2000), no qual a média de sintomas de stress foi de 15,24 entre os cuidadores.  Em relação aos sintomas de desgaste físico, problemas com a memória, pensar em um só assunto e sensibilidade excessiva estão diretamente relacionados à fase resistência. Isso mostra que, diante dos estressores ligados ao ato de cuidar, as cuidadoras estudadas estão tentando manter a sua homeostase, para impedir o desgaste total de energia. No que se refere ao item “pensar em um só assunto”, muitas cuidadoras relataram pensar frequentemente na doença do paciente, nas suas consequências e na melhor forma de amenizar-lhe o desconforto.

Os níveis de qualidade de vida dos participantes também foram analisados e, embora a área social tenha obtido um maior número de sucesso em comparação com as demais áreas da qualidade de vida, a maioria das cuidadoras que teve fracasso nessa área apresentou um maior número de sintomas de stress do que as participantes que tiveram sucesso. Isso sugere que a atividade social age como um fator protetor  do stress. É possível  que o contexto social das cuidadoras com stress e sem atividades, sociais esteja prejudicado devido à própria limitação que a tarefa de cuidar gera, o que acaba desenvolvendo maior nível de stress. Segundo Luzardo et al, (2006), cuidar exige do cuidador uma dedicação praticamente exclusiva, o que o faz deixar suas próprias atividades, gerando seu isolamento social. Dados apontaram que a área profissional também estava afetada, pois muitas cuidadoras tiveram que deixar seus empregos com o intuito de cuidar melhor do paciente, embora não o desejassem faze-lo , o que se pode apontar como um prejuízo na qualidade de vida nesta amostra na área profissional. Esse aspecto é apontado também por Luzardo et al, (2006) que comentam que muitas cuidadoras deixam o trabalho ou reduzem a sua jornada para cuidar do doente, que, em geral, exige dedicação permanente. Na esfera da saúde, as cuidadoras mostraram grande dificuldade, e somente uma participante obteve sucesso nessa área. Além disso, a prevalência em não utilizar técnica de relaxamento e não fazer exercício físico regularmente é preocupante, pois as cuidadoras não utilizam meios para poder controlar o seu stress, o que pode acarretar prejuízo na sua qualidade de vida.

   Quanto a sobrecarga das cuidadoras, a média do Burden Interview total foi de 39,00. Este valor mostra que o nível de sobrecarga das mulheres avaliadas é relativamente alto em comparação aos dados de Garrido e Menezes (2004), em que a média foi de 32,4, e de Scazufca (2002) em que média total foi de 31,1. Com relação à frequência com que as cuidadoras se sentiam sobrecarregadas por cuidar do paciente com a Doença de Alzheimer, de uma maneira geral, elas responderam que se sentiam moderadamente sobrecarregadas (40%).

Comparando o stress dos demais aspectos estudados, verificaram-se diferenças nos valores entre as participantes, divididos em grupos de sem e com stress no que diz respeito aos itens do Burden Interview relacionados a saúde (BI 10), privacidade (BI 11) e sobrecarga (BI 22), tendo maiores valores de sobrecarga nas participantes com stress.  O dado entre saúde e sobrecarga também foi observado no estudo de Garrido e Menezes (2004), em que os cuidadores apresentaram uma piora na saúde física. Isso mostra a associação sobrecarga/stress, pela qual cuidadoras com maior nível de sobrecarga possuem maior vulnerabilidade a desenvolver o stress.

Também foram observadas diferenças estatisticamente significativas nos valores entre as participantes divididas em grupos de brasileiras e nipo- brasileiras no que diz respeito ao total de sintomas de stress, com o primeiro grupo apresentando maior intensidade de stress em relação ao segundo. Embora o número de cuidadoras nipo-brasileiras que apresentavam stress tenha sido maior, o nível de stress das brasileiras foi mais alto, indicando uma maior seriedade das manifestações do stress. Esse resultado pode ser atribuído ao fato de que uma cuidadora brasileira estava na fase de quase-exaustão – embora o grupo das cuidadoras nipo-brasileiras tivesse mais participantes com stress e na fase de resistência.

O resultado pode também estar relacionado ao estágio da Doença de Alzheimer dos familiares. Enquanto a maior parte dos pacientes brasileiros encontrava-se no estágio moderado, alguns pacientes nipo-brasileiros estavam na fase leve da doença, o que pode influenciar na intensidade do stress experimentado pelas cuidadoras. Outro fator a ser considerado é o local de residência da cuidadora. Enquanto todas as cuidadoras brasileiras moravam no mesmo domicílio do paciente, o mesmo não ocorria entre as nipo-brasileiras.

 Outra hipótese que pode ser destacada diz respeito ao parentesco entre a cuidadora e o paciente. Embora em ambos os grupos prevaleçam as filhas como as cuidadoras mais frequentes, observou-se que, entre as nipo-brasileiras, o segundo grupo de parentesco é o das noras. Esse dado, hipoteticamente, também pode ser considerado como um fator que possa explicar a menor intensidade de stress entre as cuidadoras nipo-brasileiras.

 

CONCLUSÃO

Apesar das limitações quanto ao tamanho da amostra, o presente estudo tentou trazer alguma contribuição para a área, ao estudar a possível influência do stress e da sobrecarga de trabalho na qualidade de vida das cuidadoras informais.

Alguns resultados obtidos demonstraram uma relação significativa em que foi possível verificar a relação entre stress e sobrecarga, principalmente no aspecto da saúde. Esse item também foi apontado na avaliação da qualidade de vida das cuidadoras. Também foi possível comparar os dois grupos de cuidadoras de duas culturas quanto ao índice de stress, verificando-se que as cuidadoras brasileiras tiverammaior intensidade de stress do que as cuidadoras nipo-brasileiras.

Assim sendo, conclui-se que há uma associação entre stress e sobrecarga nesta amostra, indicando que a cuidadora acaba assumindo responsabilidades além do seu limite físico e emocional. Tal dedicação resulta em maiores níveis de stress e sobrecarga, afetando diretamente a sua qualidade de vida.  Outros estudos, com um maior número de participantes, são necessários para se obter dados mais elucidativos sobre o ato de cuidar informalmente.

 

REFERÊNCIAS

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  Bandeira, D.R., Pawloswski, J. & Ribeiro, T. - Stress em uma amostra de cuidadores de pacientes com Alzheimer e outra de não cuidadores da cidade de Porto Alegre. In: M.E.N.Lipp. Manual do Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de Lipp (ISSL). (2000).

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