Volume 10 - 2005 Editor: Giovanni Torello |
Março de 2005 - Vol.10 - Nº 3 Psiquiatria, outros olhares A etnopsiquiatria - uma prática clínica do vínculo e da mediação Jean-Bernard POCREAU INTRODUÇÃO Antes de abordar a questão da importância dos vínculos no desenvolvimento humano e notadamente na manutenção ou na restauração do seu equilíbrio, permitam-me esclarecer de qual lugar e de qual função eu vou expor essas observações e estas reflexões e de qual espaço elas nascem. Esta apresentação ilustrará igualmente como um lugar terapêutico constitui uma pequena comunidade fundada sobre a expressão de produções humanas, tal o anúncio dos fatos, a evocação de lembranças, por vezes felizes, porém mais freqüentemente dolorosas, a compreensão mútua, as emoções, os afetos, e naturalmente, a disposição em circulação do senso e das significações. Uma variedade de laços e de relações, portanto, é assim trabalhada, tornando possível o projeto terapêutico. Eu faço parte, de qualquer sorte, ao mundo da Psicologia. Isto é, da Psicologia dita clínica e patológica e eu procuro exercer uma forma de psicoterapia junto aos imigrantes, sobretudo aqueles que são refugiados. Aqueles que se dizem, migrantes não voluntários. Esta forma de psicoterapia se inspira nas referências teóricas e clínicas da Etnopsiquiatria, disciplina por excelência da reparação dos vínculos quebrados, por vivências de rupturas e da restauração das funções de vínculos. Esta experiência clínica é enriquecida de uma prática regular, quase cotidiana, no contexto do Serviço de Ajuda Psicológica Especializada aos Migrantes e Refugiados (SAPSIR) que nós colocamos em funcionamento há alguns anos, no seio da Escola de Psicologia da Universidade de Laval, Quebec (Canadá). O SERVIÇO DE AJUDA PSICOLÓGICA ESPECIALIZADA AOS MIGRANTES E AOS REFUGIADOS (SAPSIR) O que é esse serviço? Brevemente, digamos que se trata de um lugar terapêutico - portanto de palavra - onde se exerce uma atividade de cuidados realizada por uma equipe de psicólogos e de estudantes graduados em psicologia, geralmente de origens culturais diferentes e falando diversas línguas. Estes profissionais exercem em grupo, ao seio de um dispositivo específico, onde se dá uma atenção particular à dimensão cultural da desordem e de sua expressão sintomatológica sem negligenciar, no entanto, a análise dos funcionamentos psíquicos. Efetivamente o SAPSIR foi criado em conseqüência das observações concernentes a importância do código cultural na colocação em forma do sofrimento psicológico de um grande número de migrantes e refugiados que chegavam ao Québec. A título indicativo, notamos que em 2001 mais de 37500 migrantes foram admitidos no Québec para uma população total em torno de 7 400 000 habitantes. Se nós não consideramos que a cidade de Québec, em 2000 e 2001, 2200 migrantes se instalaram, sendo 1079 como refugiados, ou seja, perto de 50%, vinham principalmente dos países da ex-Iugoslávia, da Colômbia, do Afagnistão, Ruanda, do Congo e do Burundi. Para completar esta apresentação, esclarecemos que, desde que seja necessário e possível, nós contamos com a colaboração de um mediador lingüístico e cultural, comumente chamado de intérprete, que normalmente assegura a tradução da língua, mas igualmente da cultura. Nos parece, com efeito, importante (como muitos outros médicos e teóricos notaram antes de nós), de facilitar a expressão do vivenciado na língua maternal e de dar um grande espaço aos aspectos culturais e às representações sociais. As pessoas são endereçadas, em geral, pelos técnicos do meio de saúde e dos serviços sociais, e, logo que a pessoa que refere o paciente migrante ao SAPSIR é disponível, sua presença quando da primeira consulta é, não somente desejada, mas de uma grande utilidade. Este acompanhamento tem geralmente por efeito de assegurar ao paciente e de validar sua confiança, numa situação onde uma vez mais ele terá que expor sua história. Eu insisto sobre estes aspectos técnicos para ilustrar de modo concreto como a Etnopsiquiatria é uma prática de vínculos, do reencontro e da mediação. Justamente para que um reencontro seja possível, entre universos de pensamentos e de lógicas culturais diferentes, para que seja realizável a colocação em andamento de uma relação operante, que ela se apóie sobre um tal dispositivo. Isto vocês podem notar, enseja a ocasião de vínculos múltiplos e de natureza diversa entre aqueles que intervém, o paciente e cada um dentre eles, bem como com o mediador cultural - intérprete - e o acompanhante. Constitui-se, igualmente, o espaço transacional de mediação a múltiplos níveis. Mediação entre duas línguas, dois universos culturais, mediação temporal entre um antes e um depois, “um de longe e um de outra parte”. Trabalho de mediação, igualmente, sobre o plano psicoterapêutico entre o de dentro e o de fora do aparelho psíquico, entre o Inconsciente e o Consciente, entre o dito e o não dito, no quadro do qual o terapeuta assume uma função de “passageiro” desses mundos. Algumas considerações terapêuticas preliminares são susceptíveis de dar um senso à nossa prática clínica. Elas concernem os laços e suas transformações ao custo do desenvolvimento e a articulação do psiquismo e da Cultura. CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS É um truísmo afirmar que por ser humano é preciso ser portador de um psiquismo e de uma cultura, e que o desenvolvimento, o equilíbrio harmonioso deste ser estão estritamente ligados às relações com o outro, aos grupos social, familiar e cultural. As primeiras ligações, a representação simbólica do mundo exterior, o universo de senso e significações se constroem no seio desse espaço/tempo afetivo depois todas as primeiras relações simbólicas, fusionais, anaclíticas até a colocação em destaque de uma verdadeira relação de objeto pré- e depois, pós-edipiano. Este processo de diferenciação de si condiciona a individuação, pelo menos na cultura ocidental, e a criação dessa fronteiras entre si e o outro, entre o mundo interior e o mundo exterior, mas não faz, no entanto, um ser isolado independente, cortado dos outros mas um ser autônomo e adulto. Sua história pessoal é uma história de laços ativos, significativos desde o nascimento até a morte, e mesmo além, pois que ele acede ao status de ancestral. Laços de interesses pelos parentes, pela família, pela cidade, pelo grupo étnico, pelo país, mas também a si mesmo. É aqui que designa na questão da identidade, da sua manutenção e do seu desenvolvimento. Laços de ligações à existência, que é o de colocar o problema da continuidade coerente desta aos seus universos de senso e significações onde a cultura constitui a matriz fundamental. Os ritos de iniciação que pontuam os grandes momentos de transformação dessa história pessoal ao curso do desenvolvimento, permitindo justamente de acompanhar a pessoa nesta metamorfose de não deixar fazer-se, conduzir-se sozinha, isolada e de também ligá-la às suas origens e seus grupos de referências. Isso feito, eles lhe asseguram um quadro protetor, seguro, então, que orienta e reforça o estabelecimento de laços, tudo em contribuindo de maneira a mais significativa ao desenvolvimento e a manutenção da identidade. Trata-se de um verdadeiro processo de inscrição numa rede de relações que fixa, sem prender, o indivíduo nessa identidade e no curso de sua vida. O processo de filiação assegura a continuidade geracional. O grupo vivendo visível, mas também existindo espiritualmente como os espíritos dos ancestrais, os djinns ou as divindades - são os complementos incontornáveis e fundadores de sua existência próxima, isto é, o ser humano é fundamentalmente religioso, no senso etimológico do termo, a saber que “se ligar à” constitui para ele uma dimensão essencial. O reencontro, isso vai por si mesmo, é um pressuposto a toda relação. Momento inicial, por vezes iniciático, ele é o requisito da criação dos laços. Mas acontece que, para alguns indivíduos a não seja “suficiente boa”. Assim, por exemplo, ela pode mal começar: para um encontro que não teve lugar entre a mãe e a criança, ou entre a criança e o grupo - um não acontecimento, de algum modo. Isto será o autismo infantil, a incapacidade e, por vezes, a recusa defensiva de comunicar, de estar em relação. Mas ela pode ser também marcada pela adversidade de traumatismos diversos; verdadeiras rupturas de um canal de senso na vida de um indivíduo - e de perdas significativas, os dois constituindo-se de experiências violentas e sempre dolorosas de “ desvinculação”. É o caso desses refugiados que nós reencontramos arrancados de sua terra natal, à sua rede de pertencimento (família, amigos, colegas) após terem sido expostos, freqüentemente, a situações extremas (guerra, genocídio e certo número de casos - em torno de 20% - de tortura). Estes refugiados, desenraizados pelos acontecimentos e as circunstâncias trágicas de suas vidas, transplantados, contra a vontade, numa terra de acolhimento de postura neutra em relação a tudo isso, trazem consigo a experiência da ruptura, da vivência traumática e do desenraizamento. E isto não acontece sem conseqüências para sua saúde mental e seu funcionamento psíquico, e isto, mais ainda que a perda do quadro cultural familiar (e fundador), provoca entre eles uma “verdadeira psíquica”. Aos traumatismos anteriores que os fragilizaram, ajunta-se um verdadeiro traumatismo do exílio. Porque emigrar, é perder: desfazer-se dos envelopes culturais, isto é, tudo que contribui a formar a contenção cultural (Ondongh-Essalt, 1998): paisagem visual, auditivos, olfativos, gustativos, hábitos securizantes que são a trama da vida cotidiana. Aqui se coloca a questão da articulação do “de dentro e do de fora”, do quadro interno e do quadro externo, o primeiro devendo se apoiar no secundo para continuar funcional. Numerosos autores ocuparam-se do papel da Cultura na estruturação psíquica. Georges Devereux, Roger Bastide, Tobie Nathan, Marie-Rose Moro, para não citar que alguns. Eles coincidem quando afirmam que a Cultura é indissociável desta estruturação e que ela preenche diversas funções, tanto sobre o plano da proteção do indivíduo contra a angústia, o medo e a confusão quanto sobre o da adaptação e da socialização. Ela constitui um verdadeiro reservatório de significação, permitindo assim constituir um senso às nossas experiências, segundo a expressão de François Laplantine. Ela joga, igualmente, um papel fundamental da construção e manutenção da identidade. Essa breve lembrança teórica visa unicamente a introduzir as três questões fundamentais que se colocam a cada migrante e mais particularmente aos refugiados: - Como preservar este equilíbrio dinâmico quando se vive em outra cultura, o que significa, perder a referência externa, pelo menos temporariamente, antes que o novo seja interiorizado? - Como continuar sua existência, tudo em mantendo a si mesmo, numa continuidade psíquica coerente, de outro lugar e de depois? - Como preservar sua identidade quando se é exposto a uma aculturação brutal, uma espécie de “morte cultural”, com todos os lutos necessários que esta realidade implica? A situação de vida do refugiado, tal como nós acabamos de descrever, é caracterizada pela ruptura de vínculos, sua distorção, mas, igualmente, pela sua manutenção em outras dimensões: as do passado, do imaginário e da idealização. Claro, estes laços - se eles continuam existindo - não são mais e não serão jamais como antes. Eles se situam mais freqüentemente no mundo das ondas telefônicas, no universo virtual dos computadores do que no tocar, no olhar ou no contato sensorial. Vínculos antigos vividos sobre um modo novo, interiorizados, confinados ao espaço mental da lembrança, da nostalgia, da falta e da ausência. E, se por chance é ainda possível de voltar ao país quando de uma viagem, será em um contexto dum super investimento emocional, afetivo e da ordem do excepcional. Estas rupturas, estas transformações forçadas e vividas pelos laços tem um impacto psicológico considerável, donde os efeitos sobre a saúde mental variam de intensidade e de severidade segundo as variáveis individuais e, por vezes, coletiva. RUPTURA DOS VÍNCULOS: OBSERVAÇÕES CLÍNICAS O que nós observamos, sobre o ponto de vista clínico, na população que buscou consulta no SAPSIR? Manifestam-se, com grande freqüência, os sintomas clássicos e identificados como angústia, depressão, expressão de agressividade (raiva), sintomas de despersonalização, distúrbios da memória, de orientação tempo-espacial, conflitos familiares, dificuldades de adaptação. A esta lista juntam-se os sintomas presentes nos estados de estresse pós-traumáticos - mas nem sempre - de queixas somáticas diversas e um quadro comportamental de desmotivação, por vezes de recusa. Uma análise mais refinada do que a preconizada pelo DSM IV, mais fenomenológica, mostra que além destes sintomas se exprimem às vezes a mal de identidade (continuidade de si) e a ruptura do sentido da vida (continuidade existencial). Sobre o plano terapêutico, o que é possível fazer para restaurar as capacidades psíquicas e relacionais, confortar e consolidar a identidade fragilizada porque desestabilizada, a fim que seja retomada a vitalidade da pessoa, este élan vital indispensável a prosseguir a existência? A experiência psicoterapêutica e mais precisamente a prática da Etnopsiquiatria aplicada a estas situações, nos conduzem a privilegiar três grandes modalidades técnicas de intervenção sem, no entanto, negligenciar os “savoir-faire”(habilidades) gerais de todas as psicoterapias: - trabalho sobre os vínculos de origem - vínculos de pertença - trabalho sobre as diferentes dimensões identificatórias, mais particularmente aquelas que concernem a identidade cultural - trabalho sobre o sentido das situações vividas, passadas e atuais. O TRABALHO SOBRE OS VÍNCULOS Trabalhar os vínculos é acompanhar o indivíduo na evocação de sua história pessoal, de sua família e de seus ancestrais. É ajudar a reinscrever-se nela, após a fratura que sofreu. Testemunha de sua história, ele deve reapropriar-se dela, fazê-la sua, assumir as zonas de sombras, tumultuosas que ela possa comportar. A este preço, ele poderá ascender ao status de indivíduo ativo e contribuir a escrevê-la e a vivê-la. Nós obtivemos excelentes resultados utilizando, de modo livre e espontâneo, o genograma, árvore genealógica subjetiva, tal como pensa o indivíduo de modo às vezes real e fantasmagórica. Trata-se de um potente ativador de vínculos, mobilizando as capacidades psíquicas de vínculos e de evocação. Permite, igualmente, ao paciente de filiar-se às suas origens e de reencontrar uma certa continuidade existencial. A utilização de fotos pessoais (fotos de família, do país, etc.) marcam os momentos significativos de sua vida, constituem também um excelente meio para realizar estas funções. Restaurar a capacidade relacional é igualmente, no presente (e no quadro de consultas no SAPSIR, do “aqui e agora”) reforçar e ajudar os novos vínculos que o indivíduo é convocado a construir na sociedade que o acolhe. TRABALHO SOBRE A IDENTIDADE Trabalhar sobre a identidade nos parece fundamental. Conceito multidimensional, a identidade é um processo dinâmico onde o olhar do Outro tem um papel central. Este movimento identificatório é colocado em brutal prova no percurso migratório onde tudo está a reconstruir nessa perspectiva. Ser refugiado não deve ser um status padrão de referência. Acolher o refugiado como uma Pessoa, com sua história e seus momentos dramáticos, sem fechá-lo e de preservar assim uma continuidade psíquica entre aquele que era entre os seus e aquele que é agora, depois e antes. A cultura de origem, fundadora é a este título, a base da humanidade da pessoa, pela língua com a qual se constrói seu pensamento e suas afinidades. Não se trata de prendê-lo em sua cultura de origem, na concepção de um tempo centrado no passado. O que importa sobre o plano psicoterápico é de partir desses dados, deste núcleo identificatório, centro da vitalidade e da segurança. O TRABALHO SOBRE O SENSO Dar um sentido a nosso meio, depois às nossas experiências e em fim à nossa vida é tão fundamental e espontânea que o princípio do prazer tal como enunciado por Freud. Viktor Frankl a perfeitamente demonstrado e isto consagrou todo um campo de suas atividades clínicas e de pesquisa. O ser humano é produtor de senso e ele não pode subtrair-se a este desafio do aparelho psíquico. Ele é estimulado pelo que Frankl chamou “a vontade do senso” que se pode compreender como uma pressão interna para dar uma significação à sua experiência. Dar um sentido é essencialmente uma experiência de coerência consigo mesmo e com o mundo exterior. É colocar-se em ligação, em relação, as diversas dimensões do seu Ser. A realização dessa necessidade de sentido se expressa por uma redução da distância entre a experiência interna e os estímulos externos ou os dados de uma situação vivenciada. Esta redução em distância se manifesta sobre os planos emocional, cognitivo e existencial e dá ao indivíduo um sentimento de harmonia interior e de coerência. A pessoa refugiada não escapa desta pressão, mas esta função semiótica se encontra, com freqüência, pesadamente hipotecada pela violência dos acontecimentos vividos. Então, é possível, em muitos casos, de falar de traumatismo do sem-sentido e de incoerência. Estes traumatismos são particularmente devastadores e os sintomas que são a eles associados traduzem rupturas do organismo interno, a perda da harmonia psíquica (apartação, desorganização, perda de referências, perturbação do mundo dos valores, etc.) Como restituir ao paciente uma possibilidade de sentido diante de situações tão incompreensíveis como a tortura, o genocídio e a depuração étnica e quando antes a vida transcorria pacificamente com todas as pessoas da Comunidade? Esta atividade reparadora do sentido de um indivíduo é um trabalho paciente, progressivo, que não pode acontecer, senão, através de uma demanda terapêutica. Essa seria a perspectiva. Mas, é bem mais fácil, porque mais acessível, de co-construir com o paciente um sentido a estas situações atuais. Assinalemos por fim, a importância da coerência do projeto de vida que a pessoa refugiada pode ser levada a elaborar. Este deve respeitar o que é a Pessoa atual, o que ela tornou-se, mas igualmente o que ela foi. É ao preço dessa coerência, interna e existencial desta unidade, que a continuidade psíquica poderá ser restabelecida. Ajuntemos, antes de concluir, dois pontos que nos parecem fundamentais - porque complementares - para atingir esses objetivos terapêuticos. Primeiramente, a clínica etnopsiquiátrica deve, para ser plenamente eficaz, se articular com o “social”. O “cultural”, se ele é incontornável, não é suficiente. A existência humana é feita de laços sociais, de participações nas diversas expressões do Coletivo, em resumo, aquilo que constitui a socialização. A integração e a adaptação da sociedade de acolhimento implica diferentes processos e comportamentos que necessitam de intervenções específicas a este nível (trabalho, alojamento, via social, etc.) Segundo assinalemos a importância da reparação, notadamente para os refugiados vítimas de guerra, tortura, e por todos aqueles traumatismos da história que forçaram ao exílio. A reparação enquanto ritual coletivo de reconhecimento da ferida, da injúria e de injustiça praticadas a um dos seus ou a um grupo, situa-se no campo social. Através de cerimônias oficiais e públicas onde as nações e os grupos sociais reconhecem suas responsabilidades e suas aberrações no curso dos acontecimentos, a dinâmica individual e coletiva das vítimas se modifica e o impacto psicológico (por vezes patogênico) da injustiça pode então evoluir. O ressentimento e a atitude reivindicatória são comumente observados como expressões do sofrimento, tendendo nessas condições, a diminuir ou a se acalmar. A reparação coletiva abrirá eventualmente a porta a uma outra disposição psicológica: aquela do perdão. CONCLUSÃO A patologia mental por nós mencionada, diversas vezes, pode ser entendida como uma perturbação do vínculo e da relação, seja por suas causas e mais certamente por seus efeitos e conseqüências. A experiência clínica das consultas realizadas no SAPSIR mostra como uma abordagem etnopsiquiátrica aplicada a situações dos refugiados, mobilizando fatores de interface do cultural, do social e do psíquico, como os vínculos com o grupo de identidade étnica, com sua história pessoal e familiar e consigo mesmo, permite de melhor compreender como os traumatismos, as rupturas e as perdas podem ser metabolizadas e superadas, atingindo objetivos terapêuticos. REFERÊNCIAS Bastide, R. (1958) Le candomblé de Bahia. Transe et possession du rite du Candomblé (Brésil). Paris: Plon; Cyrulnik, B. (1989). Sous le signe du lien. Paris: Hachette Littératures Devereux, G. (1972). Ethnopsychanalyse complémentariste. Paris: Flammarion. Frankl, V. (1970). La psychothérapie et son image de l'homme. Paris: Éditions Resma. Guilbert, L., Pocreau,J.-B, Ba,O & Laberge, M-C (1997). Soutien aux refugiés en situation de détresse psychologique - dépistage, reference et intervention. Document présenté à la Régie régionale de la Santé et au Ministère des Relations avec les citoyens et de l'Immigration. Laplantine, F. (1986). Anthropologie de la maladie. Paris: Payot. Laplantine, F. (1998). L'ethnopsychiatrie. Paris: Presse Universitaire de France. Moro, M-R. (1998). Psychothérapie transculturelle des enfants de migrants. Paris: Dunod. Nathan, T. (1994). L'influence qui guérit. Paris: Éditions Odile Jacob. Ondongh-Essalt, E. (1998). L'ethnopsychiatrie communautair. Revue Internationale d'Etudes Transculturelles et d'Ethnopsychiatrie Clinique, 1, 37-73. Vinsonneau, G. (2002). L'identité culturelle. Paris: Armand Collin. (Tradução do texto em francês - Prof. Antonio Mourão Cavalcante ) |
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